O
Pernilongo, a Muriçoca, o carrapato e outros bichos.
Isto é coisa do
demônio, dizia a Chefe Mercedes. Chefe “gente boa” a Chefe Mercedes. Entrou com
idade avançada e logo conseguiu sua Insígnia de Madeira. No entanto ela
detestava estes insetos que ela chamava coisas do Demônio. No primeiro
acampamento os pernilongos se deliciaram. Em outro uma “tropa de carrapatos fez
dela seu ninho”! Risos. Eu dizia a ela que pernilongos muriçocas e muruins
parecem ser da mesma família, mas não são. Risos. São escolados e cada um tem
sua maneira própria de morder e chupar o sangue dos pobres dos escoteiros,
escoteiras e lobinhos. Coitada da Chefe Mercedes. Seu braço ficou todo mordido
e suas pernas também, pois achou que podia usar calças curtas. Risos. Danado de
insetos chupa sangue. Adoram escoteiros e escoteiras quando vão acampar. Dizem
que os jovens ficam tão encantados com o campo que se esquecem de tudo e os
pernilongos e carrapatos se deliciam.
Acampei muito em
minha vida. Sem falsa modéstia quase 800 noites de acampamento. Nunca gostei
muito destes “bichos”. Insetos chupa sangue não é o meu forte. Hoje a
modernidade trouxe o repelente, na minha época não tinha. Dava cinco e meia da
tarde lá íamos nós ver onde soprava o vento e com ele a favor no campo de
Patrulha colhíamos folhas verdes, e fazíamos um fogo com uma fumaceira infernal.
Enquanto durava a fumaça os demoniozinhos fugiam a espera quando pudessem voltar.
Uma vez descobri que existem diferença do pernilongo da cidade e o do
acampamento. O do acampamento ataca, morde e você sente logo. Nós os antigos os
chamamos de muruins. Com um raminho na mão a gente os espanta. Os da cidade
não. São covardões. Vivem escondido em baixo da cama, de um móvel qualquer. Primeiro zumbem no seu ouvido e somem. Você
acorda com uma coceira danada. Pronto, ele já encheu a pança de sangue e se
foi.
Uma vez acampei
próximo as barrancas do Rio das Velhas, bem perto da Barra do Guaiçuí onde se
podia avistar o São Francisco. Era uma fazenda de um membro da diretoria do
grupo onde tinha uma bela floresta nas suas margens. O local era de tirar o
queixo. Lindo mesmo. Perfeito para um grande acampamento. O capataz da fazenda nos preveniu. Olhe
Chefe, lá a noite é um inferno. De cinco e meia as sete ninguém aguenta, as
muriçocas são sedentas de sangue. Rimos dele. Não sabia que éramos da tropa dos
valentes e intrépidos seniores escoteiros. Primeiro dia, barraca, algumas
pioneirias, uma mesa e deixamos do lado centenas de boas folhas verdes. Que venham
estes malditos demônios, dissemos. Vão enfrentar uma tropa que não tem medo de
nada!
Seis horas o
inferno desceu entre nós. Não era um, não eram dois e sim mais de cem mil. Milhões
quem sabe. Você olhava e via aquela nuvem cinzenta e não havia onde correr. Mas
nós corremos. Até a sede da fazenda, mais de quatro quilômetros. O capataz riu
a valer. Voltamos ao campo lá pelas nove da noite. A paz desceu a terra! Mas
desistimos de dormir ali. Procuramos uma área próxima à fazenda e lá ficamos. Mas
querem saber de uma coisa? Pernilongo e muriçocas avisam quando vão atacar e
quando não avisam pelo menos só coça. Risos. Mas e o danado do carrapato? Este
sim é o satã em pessoa. Não grita, não canta, não fala e procura um lugar para
se esconder no seu corpo ficando lá dias e dias. A principio uma coceira
gostosa. Você coça e para. Até o dia que descobre o bicho gordo, cheio de
sangue como a dizer a você – Seu idiota enchi de sangue seu. Agora posso
morrer! Risos. E morre mesmo. Você não perdoa.
Para dizer a verdade nunca levei
repelente. Achava que se os heróis da floresta, os bravos sertanejos ou os
mateiros não usavam isto eu também não o faria. Mas dizem e não sei quem disse
que isto não é coisa de escoteiros. Quem ainda não enfrentou saudáveis
pernilongos, alegres muriçocas, carrapatinhos gentis, e aranhas lindas nas suas
teias nas florestas à noite no rosto, dançando ou rindo de você, então você
ainda não foi batizado Escoteiro. Meus amigos, quantas coisas contamos para
nossos escoteiros para reafirmar aquilo que ele é. – Escoteiro não anda voa!
Escoteiro não ri, dá gargalhadas! Escoteiro não chora, dá pernadas na
dificuldade! Escoteiro não tem medo, luta até a morte! Escoteiro não corre dos
insetos ou animais peçonhentos, enfrenta por toda a vida!
Não sei não.
Coitado do Escoteiro quando dizem isto para ele. Ele vai ficar assustado. Sabe
que nem seus super heróis são assim. Sabe que ele é humano como os outros. Eu
prefiro dizer calmamente que ele não se preocupe com as dificuldades, elas
passam e reafirmo a eles – Se você tem amor no coração, sabe ser fraterno, se
você sabe sorrir com o zumbido da noite, sabe apreciar o orvalho de madrugada,
você é um Escoteiro.
Até outro dia meus amigos e minhas amigas. Tantas coisas a dizer
o que seria um bom Escoteiro que prefiro um dia fazer outro artigo. E viva os
pernilongos! Viva as muriçocas! Bem vindos os carrapatinhos espertos! No fundo
no fundo sou Escoteiro e adoro eles! Até
breve, portanto!
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