Lendas
Escoteiras
O lindo
Balão Azul do Escoteiro Zezé dos Pinhais.
Levei o
dia todo, a minha tarde inteira,
Não joguei
futebol e até nem quis brincar
De soldado
e ladrão...
Ajoelhado
na sala, a minha brincadeira,
Foi cortar
os papeis de cores, e os juntar.
Fazendo o
meu balão...
J.G.
Araújo Jorge.
Eu estava ali
com todo aquele populacho. Espremia-me para ficar a frente. Meus olhos
brilhavam e meus lábios sorriam levemente mostrando o êxtase que sentia, me
arrebatava como se fosse ele levado pelo ar. Quantas vezes sonhei em voar pelos
céus em um balão. Meu arroubo de criança só via o encanto. Meu entusiasmo
cobria o perigo e a alegria de estar ali não me deixava triste em desobedecer
meu pai e minha mãe. Eu tinha duas forças que me faziam sentir bem. Balões no
céu e ser Escoteiro. Todas as vezes que Seu Nonô Baloeiro soltava seu enorme
balão eu corria para lá. Meu pai descobriu algumas vezes. Meu pai! Nunca me
encostou um dedo. Chegava a casa e ele pacientemente dizia - Zezé balão mata.
Muitos morreram assim queimados. Uma dor horrível. Quando não morrem ficam
marcados para sempre!
Mas eu, nos
meus treze anos sabia que o perigo era grande. Mas fazer o que? Eu amava os
balões. Quando ele se elevava ao céu, quando os foguetes estouravam, quando se
lia a placa que os baloeiros colocavam, eu pulava de contente. Minha alegria
era contagiante. Se pudesse eu ficava ali por toda a noite a ver os balões
subirem aos céus. Um espetáculo que a criança que era se arrebatava e nos meus
sonhos eu estava lá, junto ao lindo balão colorido que subia sôfrego aos céus
até que um vento sul ou vento norte o levasse para longe. Muitas vezes sugeri
em Reunião de Patrulha que fizéssemos um dia uma competição de patrulhas para
ver quem soltava o mais lindo balão. Nunca aprovaram. O Chefe Valdez muito
educado dizia – Balão só trás a infelicidade. Alegrias de uns tristeza de
outros.
Nas reuniões de
Tropa, nas excursões, nos acampamentos eu vibrava como se estivesse soltando
balões. Para dizer a verdade eu não sabia daquela minha sina. Nos meus sonhos
de adultos eu estaria lá com seu Nonô Baloeiro, a fazer e a soltar os balões.
Invejava toda sua equipe. Trabalhadores, sem nada a receber. Tentava explicar
isto ao Chefe Valdez, mas ele sorria de leve e dizia – Zezé, eles sabem
trabalhar em equipe, mas muitos deles gastam o que não tem para que o balão
suba aos céus. Eles deixam suas famílias, sacrificam o pequeno salário que
recebem e nem pensam o que suas escolhas podem fazer aos outros. Fecham os
olhos para as desgraças, as desventuras e a infelicidade dos queimados, a
miséria por ter perdido seu ganha pão, sua casa.
Zezé dos
Pinhais sentia pena, mas ele não sabia quem um dia disse para ele – O que os
olhos não veem o coração não sente. Verdade ou não os balões e o escotismo eram
os sonhos de Zezé. O acampamento anual se aproximava. Iam acampar no Rancho da
Lagoa Dourada. Ele nunca tinha ido lá. Mas não importava. Fosse onde fosse Zezé
vibrava. Amava sua Patrulha Morcego. Sentia uma enorme alegria em estar junto
aos seus amigos da patrulha. Vibrava com os jogos, já estava ficando bom em
pioneiras e quando do fogo de conselho Zezé olhava para o céu estrelado e
pensava – Não poderia ter um enorme balão passando?
Zezé não contou
a ninguém. Em casa escondido construiu um lindo balão azul. Ele sonhava em
fazer um. Sonhava em ver o balão coriscando nos céus em uma linda noite de
inverno. Não haveria foguetes. Ele não podia comprar. Sabia que todos seus
amigos na patrulha nunca iriam “vaquear” para comprar. Custou para comprar o
papel, construiu devagar à cangalha e depois a tocha. Levaria para o
acampamento escondido. Não mostraria para ninguém. Ele sabia que na segunda
noite haveria um jogo noturno. Iria fingir ter dor de cabeça e zarparia para
uma área descampada e então soltaria seu balão. Sabia como fazer. Seus olhos
cintilavam quando pensava no seu plano.
O grande dia
chegou. A sede escoteira lotada de gente. Pais e mães preocupados pedindo aos
chefes para tomarem conta. Dois ônibus e uma longa viagem. Chegaram à tarde. Um
lanche já havia sido preparado. A patrulha sabia como fazer. Barracas armadas
rapidamente. Cozinha, mesas, toldos e em pouco tempo o campo de patrulha já
podia dar todo o conforto de uma casa na selva. Houve até momentos que Zezé se
esqueceu do seu balão. Mas ele não saia de sua cabeça. Dito e feito. No segundo
dia o grande jogo. Zezé falou ao Monitor que falou ao Chefe. - Está dispensado,
disse o Monitor. Logo que o Jogo começou “Guerra” Zezé saiu de mansinho nos
fundos de seu campo de patrulha. Nas mãos o bornal com seu lindo balão azul.
Sonhava! Sorria! Cantava canções de louvores. Avistou um belo campo e um rio
que corria com suas águas tranquilas em direção ao mar.
Zezé tirou o
balão. Desdobrou. Pegou a cangalha e a tocha. Quando ia acender a tocha para
que o gás espalhasse pelo balão ele ouviu um choro de criança. Não viu ninguém.
Onde seria? Largou seu balão e foi até a barranca do rio. Sentado em um tronco
uma menina de cinco anos chorava em prantos. Ela estava toda queimada. Zezé
sentiu o cheiro de carne viva queimando. Zezé não sabia o que fazer – Venha
comigo, vou levar você até o acampamento. O Chefe vai lhe ajudar – Ela não
respondia, mostrava sua casa toda queimada. Zezé viu saindo da casa um Velho e
uma velhinha também queimados. Saíram gritando. Uma dor terrível. – Meu Deus!
Pensou Zezé. O que foi? O que foi? – Corra menino ele o Velho dizia. Corra! É
um balão nos céus. Matou minha família. Destruiu minha casa, queimou minha
plantação de milho!
Zezé acordou
dentro da barraca. Ainda bem que foi um sonho. Sonho terrível. Eu poderia
destruir uma família com meu balão? No ultimo dia Seu Pataxó, um índio que
morava próximo ao rio contou a história do Velho Manequinho, Dona Valquíria e
sua filha Martinha a quem chamavam de Por do Sol e que morreram no ano passado.
Um balão caiu na plantação de milho, que atingiu sua casinha de sapé e não deu
tempo para fugir. Morreram todos. Os olhos de Zezé se encheram de lágrimas.
Poderia ter sido o meu balão pensou. Eu poderia ter matado todos eles! Juro meu
Deus! Nunca mais, mas nunca mais mesmo vou tocar em um balão. Direi a todos
meus amigos o mal que ele faz!
Assim como Zezé
tem muitos jovens que sonham com balões. Que está historia sirva de lição. Não
é uma lenda. Todos os anos centenas de casos como este acontecem. Morrem
adultos e crianças, perdem-se plantações que foram plantadas com o suor de quem
precisa viver. "Balão no céu, perigo na
terra". Todo mundo já deve ter ouvido essa frase em algum lugar, mas as
pessoas não costumam dar muita atenção a ela. Os incêndios causados por balões
podem ser bastante graves e podem destruir as casas, indústrias, plantações e
até mesmo causar mortes. Seja um bom Escoteiro. Nunca solte balões!
Nenhum comentário:
Postar um comentário