Conversa ao pé do fogo.
Não deixe os sonhos deles
morrerem!
Quanto tempo um adolescente presta atenção a você? Alguns entendidos
dizem que cinco minutos eles absorvem suas palavras depois de dez eles deixam a
mente viajar para outros lugares que não ali a ouvir seu Chefe ou um adulto. Ao
começar a escrever este artigo me lembrei de alguns chefes quando acampei em
Monte Carmelo e em volta de uma fogueira fizeram uma gostosa exposição dos seus
pensamentos. – Disse um deles: – Acho que preciso me atualizar mais. Tem horas
que não consigo acompanhar meus escoteiros! – Outro respondeu: - Concordo com você.
Está difícil atingir o ponto certo para que eles possam entender e ouvir o que
digo. – Um terceiro Chefe calado e depois de algum tempo comentou: - Conhecer
não só na sede, como ele se comporta em sua casa com seus pais e na escola teríamos
outra visão. Sabiam que um dia de acampamento vale mais que vinte reuniões de
sede para entender melhor como ele é?
Queria entrar na conversa deles. Achei melhor ouvir. Quem sabe eu
tiraria subsídios para entender melhor o que se passa na mente do jovem ou da
jovem escoteira. Um deles perguntou aos demais: - Vocês já perguntaram o que
ele pretendia ao entrar nos escoteiros? Quais os seus sonhos? O que ele
esperava da nova turma, da Patrulha, do Monitor e do Chefe? – Todos olharam
para ele espantados. – Um disse: Bem pensando amigo. Eu mesmo me pergunto se o
que eles nos dizem quando aparecem sorridentes para nós quando querem ser mais
um da fraternidade. – Fraternidade? Disse o outro! – Pois é eu digo para eles o
que ele vai encontrar aqui. Dou testemunho do que ele vai ser e do aventureiro
que irá aprender a acampar e viver na natureza como um herói da selva!
Por algum tempo todos se calaram. Pensei comigo. – Será que ele entrou
no escotismo pensando encontrar aventuras, grandes excursões acampamentos
daqueles que ele viu em filmes dos pioneiros, dos bandeirantes e de tantos heróis
que ele um dia pensou que podia ser um? Olhei para um dos chefes que com os
olhos semicerrados deixava transparecer seu pensamento se eles estavam dando
tudo que ele sonhou quando entrou para os escoteiros. O mais novo sorriu e
disse que nunca faltou diálogo. Seus monitores sabiam disto. Olhei para ele e
seu olhar de vitória me preocupou. Queria perguntar quanto tempo seus jovens
ficam em sua tropa. Não perguntei. Não valia a pena entrar neste caminho
tortuoso.
O mais velho se levantou, espreguiçou-se como se sentar em volta do fogo
fosse dar a ele mais lucidez na condição de dirigente de tropa. – Eu ele disse,
tenho “minha” tropa na mão. Ninguém discute minhas ordens. Não aceito indisciplina.
Sou exigente, comigo eles não facilitam. Afinal o Chefe sou eu e como Chefe tenho
responsabilidades na formação de todos. – Pensei comigo: - Este é o verdadeiro Chefe
Escoteiro? O diálogo é com todos? Responsabilidades somente? Qual delas? Não
disse nada. O que iniciou a discussão tentou argumentar: - Olhem, eu vejo que
cada um quer ser independente e se sente bloqueado. Tem outros que não se
enturmam e tem outros tantos que não respeitam os monitores!
Hã! O primeiro dia. Dizem que dele ninguém esquece. Hora da conversa
franca, de ouvir o jovem e não interromper. Será que o Chefe ouviria seus
dilemas, seus sonhos e porque ele estava ali dizendo que queria ser mais um de
nós? De supetão um deles reclamou dos pais: - Não participam, ficam a parte,
quando o chamamos não aparecem. – Outro perguntou? Quantas vezes por ano você
visita os pais? – Ninguém respondeu. Pensei novamente, ele deve ser bom de
palestra, adora falar aos escoteiros. Será que eles ouvem e entendem o que ele
quer dizer? Um deles teve a coragem de contradizer: - Converso com eles, vou em
suas casas, os pais são meus amigos, mas não duram como escoteiros. Saem logo.
Continuei calado. Minha mente era um redemoinho de perguntas sem
respostas. Um deles com uma flanela pegou a chaleira de café fervendo. Serviu a
cada um uma golada quente que fez bem naquela noite fria de inverno. O mais
novo sorriu e disse: Acho que tem muito de nós que esquecem que não somos
lideres de robôs. Um deles olhou para ele raivoso. – Eu sei disso, disse. Uma
vez perguntei a um deles que me veio dizer que ia sair do escotismo. Não
perguntei por que. Devia ter perguntado, mas eu sabia o que ele ia dizer. –
Sabia mesmo? Perguntou outro. Ninguém disse nada.
As horas passaram, o sono chegou, o papo encerrou. Todos foram dormir.
Fiquei ali a meditar nas palavras de cada um. Perguntei a mim mesmo se eles não
diriam que iam sair porque gostava mais de sua turma do bairro. Um deles disse
que sentia sua falta, que naquela turma ele podia sugerir e que a amizade ali era
ponto de honra para cada um. Os sonhos, a vontade de realizá-los e não poder.
Ouvir e entender. Um poeta que devia ter sido Chefe escoteiro escreveu: - Eu
sou um
pescador de sonhos como muitos, mas diferente destes, não tenho isca e nem
sequer anzol, apenas utilizo as minhas mãos; e o único que pesquei, vai, porém,
escorregando por entre os meus dedos.
Fui dormir recordando o que
disse Kipling cujas palavras deviam ser decoradas e relidas sempre pelos chefes
que se consideram educadores: - “Quem ao crepúsculo já sentiu o cheiro da fumaça de
lenha, quem já ouviu o crepitar do lenho ardendo, quem é rápido em entender os
ruídos da noite;... Deixai-o seguir com os outros, pois os passos dos jovens se
volvem aos campos do desejo provado e do encanto reconhecido...”.
Nota de rodapé: - Um dia uma criança
chegou diante de um pensador e perguntou-lhe: - “Que tamanho tem o universo?” –
Acariciando a cabeça da criança, ele olhou para o infinito e respondeu: - “O
universo tem o tamanho do seu mundo”. Perturbada, ela novamente indagou: “Que
tamanho tem meu mundo?” – O pensador respondeu: “Tem o tamanho dos seus sonhos”.
Pois é, nós chefes escoteiros não
devemos nos achar maior que todos. O “maior exemplo é o sol se escondendo no
horizonte para a lua brilhar”. Sempre Alerta!
Nenhum comentário:
Postar um comentário