O papel do Chefe Escoteiro.
Por Lord Baden-Powell.
Quando vejo um Grupo
desfilar bem, mas não ser capaz de seguir uma pista ou de cozinhar as suas
próprias refeições, vejo logo que o Chefe não é um bom Chefe Escoteiro. O Chefe
indiferente ou com falta de imaginação acaba sempre por cair nas formaturas, paradas
e desfiles como único recurso.
A atitude do Chefe é da
maior importância, já que os rapazes moldam os seus caracteres em grande parte
a partir do dele; o Chefe tem, pois, a obrigação de ter uma visão do seu cargo
mais ampla do que se baseada em critérios meramente pessoais, e de estar
disposto a sacrificar os seus próprios sentimentos para o bem do conjunto. É
isto a verdadeira disciplina.
O segredo do sistema
Montessori é que o professor apenas organiza o trabalho, sugere a ambição, e a
criança dispõe de inteira liberdade na realização do objetivo visado. Liberdade
sem objetivo organizado seria o caos. É sem dúvida por isto que o Escotismo tem
sido definido como a continuação do sistema Montessori com rapazes.
O papel do Chefe de Escoteiros
é orientar para o bem o entusiasmo do rapaz. Só pode esperar ter verdadeiro
êxito como Chefe de Escoteiros aquele que souber ser o seu “irmão mais velho”.
O “comandante” não vale nada, e o “mestre-escola” está condenado ao fracasso. Por
“irmão mais velho” entendo alguém que sabe viver com os seus rapazes como
camarada, participar nos seus jogos e rir com eles, e conquistar-lhes assim a
confiança; alguém que consegue assim colocar-se na posição - indispensável para
quem pretende ensinar - de guia, daquele que através do seu próprio exemplo os
conduz pelo bom caminho, em vez de ser uma simples tabuleta de sinalização, com
frequência demasiado acima das suas cabeças, e que se limita a apontar uma direção.
Mas que as minhas palavras não
sejam mal interpretadas: não se suponha que eu quero que o Chefe seja um «mole
e um sentimental»; bem ao contrário, a camaradagem exige firmeza e retidão,
para que o seu valor seja duradouro. Não quero que os Chefes de tropas se
sintam de modo algum manietados por tradições, regulamentos e programas.
A sua experiência e imaginação
pessoais, o seu ardor juvenil e a sua compreensão das almas infantis serão os
seus melhores guias. A Chefe de Guias bem sucedida nunca empurra - toma à dianteira.
Para
ser um Chefe Escoteiro eficaz, um homem tem de ser apenas um homem-rapaz, isto
é:
1)
precisa de estar animado do espírito do rapaz, e de ser capaz de se colocar ao
nível dos rapazes, em primeiro lugar;
2)
precisa de compreender as necessidades, modos de ver e aspirações das
diferentes idades da vida do rapaz;
3)
precisa de tratar mais com o rapaz individualmente do que com a massa;
4)
precisa depois de promover o espírito de corpo entre os seus rapazes, para
alcançar os melhores resultados.
O Chefe Escoteiro precisa
de não ser nem mestre-escola, nem oficial comandante, nem cura, nem instrutor. Precisa
de se colocar no lugar de irmão mais velho, isto é, ver as coisas do ponto de
vista do rapaz e orientá-lo, guiá-lo e entusiasmá-lo na direção correta. Como o
verdadeiro irmão mais velho, precisa de compreender as tradições da família e
procurar que estas se mantenham, ainda que seja necessária grande firmeza.
O Chefe Escoteiro que é
o herói dos seus rapazes possui uma poderosa alavanca para o desenvolvimento
destes, mas ao mesmo tempo assume uma grande responsabilidade. A tarefa do Chefe
Escoteiro é como o golfe, ou a ceifa, ou a pesca à mosca. Quem se apressa não
chega ao fim, pelo menos não chega com o resultado que se obtém com um
andamento alegre e calmo.
Os princípios do Escotismo
estão todos certos. O êxito da sua aplicação depende do Chefe e do modo como
ele os aplica. É claro que o Chefe Escoteiro se encontra em desvantagem se
comparado com o oficial que tem o seu manual de instruções, ou como o
mestre-escola que possui o seu livro de texto para seguir.
O Chefe Escoteiro
não dispõe de nenhum auxiliar externo; tem de extrair o que pode do “Escotismo
para Rapazes” e do “Auxiliar do Chefe Escoteiro”, mas na realidade é na sua
própria imaginação que ele tem de confiar, combinada com o seu conhecimento do
rapaz. Ele tem, no entanto, um auxiliar valiosíssimo, que é o desejo que o
rapaz tem de ser Escoteiro.
O espírito do
rapaz está sempre presente, e vem ao nosso encontro a três quartos do caminho;
não o esmaguemos, saibamos desenvolvê-lo e dar-lhe os 25% que faltam para refazer
Espírito Escoteiro na sua plenitude - e aí temos!
Do Livro Rastros do
Fundador de Baden-Powell of Gilwell.
Nota: - Serás mais feliz se
procurares deixar o mundo um pouco melhor com a tua passagem por ele. Um passo
a dar nesta direção, como pai, consiste em fazeres do teu filho um homem melhor
do que você. O velho Sócrates dizia a verdade ao afirmar: “Homem algum pode ter
propósito mais nobre do que aquele que se preocupa com a educação correta não
só dos seus, mas também dos filhos dos outros homens”.
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