Boas lambanças de um passado distante.
Meu Amigo Fantasma, sua corneta, Zé Botina e muitas outras
lambanças.
Eu já
disse e repito lambanças todo mundo tem. Alguns guardam para si, outros
comentam em uma rodada de shope e eu gosto de contar aqui. Afinal hoje só posso
fazer isto. Foram-se os dias de aventuras por este mundo afora. Agora vivo de
lembranças e das lambanças que escrevo. Sei que tem muitos que não gostam e não
acreditam. Paciência. Tem hora que eu mesmo tenho dúvidas. Risos. Já contei
aqui várias. Algumas engraçadas outras não. Se não querem contar as suas me
deixe com as minhas. Mais duas em duas épocas diferentes. Vamos a elas:
Primeira – 1961 – Mello Viana município de Coronel Fabriciano –
MG – Eu o Chefe Carlos fundamos um Grupo Escoteiro. O Tapajós. Existente até
hoje em Fabriciano. Carlos era da minha idade, dezenove anos. Conhecemo-nos na
Usiminas onde trabalhávamos. Ele de Juiz de Fora, escola de Darcy Malta, um dos
melhores escotistas que conheci. Resolvemos alugar uma casinha em Mello Viana.
Uma república, (ainda solteiro na época) com mais dois ex-escoteiros. O Arlindo
e o Mauro. O padre da paróquia se entusiasmou. O grupo começou com grande
participação da comunidade. Conseguimos quatro barracões da prefeitura sem utilização
próxima ao cemitério. Um dos lobinhos, um dos escoteiros, um dos sêniores e um
da diretoria e almoxarifado geral. Em frente um campo de futebol. Melhor não
acharíamos. Uma tarde jogávamos futebol só os chefes. Arlindo levou uma bolada
no estomago e levado ao hospital morreu no dia seguinte vitima de hemorragia
interna. Tinha tuberculose avançada. Não sabíamos.
Foi uma verdadeira epopeia levar o corpo na cidade de Manhumirim
onde sua família residia. História que contarei proximamente. Uma semana depois
começaram a nos dizer que uma noite sim e outras não, muitos instrumentos da
fanfarra tocavam altas horas da noite na sede. Uma semana duas e na quarta
depois de tantas reclamações, resolvi passar uma noite lá. Olhe, não sou
corajoso, nada disto. Sou medroso sim. Mas mesmo molhando as calças não deixava
um desafio para trás. Carlos se recusou a ir. Se fosse o Arlindo ele queria
distância. Acho que foi a dentadura dele em cima do guarda roupa. Outra
história. Onze da noite lá fui eu. Sozinho. Passei pelo cemitério e comecei a
tremer. Abri a porta e entrei tremendo. Senti escorrer um liquido em minhas
pernas. As luzes não acendiam. Tudo escuro. Um barulho tremendo de uma corneta
no meu ouvido. Saí pela porta em disparada. Nem olhei para trás. Só parei na
igreja. Calças totalmente molhada. O padre ainda acordado me perguntou – O Que
houve Chefe Osvaldo? O Arlindo! – Mas ele morreu! – Pode ser que sim, mas o
danado está na sede tocando corneta! O padre riu. Impossível! Só se for alma do
outro mundo. Fomos para o interior da igreja. Rezamos juntos. Nunca mais fiquei
sozinho na sede do grupo. Sempre de olho se ele não aparecia. Um ano para
pararem de tocar a fanfarra na sede. Eu? À noite nunca mais!
Segunda – 1954 – Zé Botina tinha minha idade, treze anos. Não
sei quantas brigas ouve entre nós dois. Pelo menos duas por semana. Não era
Escoteiro. Tinha sua turma e quando me via sozinho eu virava um saco de
pancadas. Eu revidava com duas ou três patrulhas quando o via só. Um dia vinha
da sede quando vi uma grande confusão na Rua Peçanha. Encostei-me ao passeio
junto a minha bicicleta. A polícia descia o sarrafo em uma turma e não sabia o
motivo. Cassetete para todo lado. Zé Botina me viu e gritou! – Ele é da turma!
– Maldito. Mesmo com treze anos virei um saco de pancadas dos policiais. Jurei
vingança. Contei para os Lobos o que aconteceu. Uma noite Chiquinho chegou
correndo. – “Bitelô” (meu apelido na época) Zé Botina vai para a sua casa
sozinho. Seis valentes patrulheiros da Lobo lá foram correndo de bicicleta. Na
descida do bairro Santa Terezinha o encurralamos. Tiramos sua roupa. Umas
varadas no trazeiro que marcou. Pelado. Amarramos no poste da rua. O deixamos lá
gritando. Cheguei em casa. Crise de consciência. Uma da manhã. Voltei lá. Tinha
de ajudar. Não estava mais no poste. Voltei. Descendo a Rua Francisco de Assis,
totalmente deserta lá estava Zé Botina com mais oito. Outra surra. Deixaram-me
pelado na rua. Não me amarraram. Mas revidaram com as varadas. Escondendo aqui
e ali cheguei em casa.
Os tempos passaram. Crescemos. As brigas nunca pararam. Mudei de
cidade. Um dia no Porto de Tubarão em Vitória onde trabalhava, o Diretor me
chamou. – Disse que precisava de um escriturário? Veja se este serve – A vida
dá muitas voltas. Zé Botina em carne e osso. Ficamos amigos, acabou as brigas.
Fui padrinho dele de casamento. O tempo passou. Nunca mais o vi. Soube que se
alistou na Legião Estrangeira. Era seu sonho ser um legionário. Risos. Não sei
se era verdade. Mas gostaria de vê-lo novamente. Saudades do Zé Botina!
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