Quem vem lá?
Sou eu amigo. Um Velho
Escoteiro que saiu da gaiola e aprendeu a voar.
Não acreditava, mas minhas asas ainda bateram incessante no céu
azul e mais uma vez neste ano com a ajuda do vento lá fui eu novamente em
plagas nunca antes conhecidas. Duas vezes? Isto mesmo, duas vezes. A primeira
eu fui respirar um ar perfeito no campo escola. Na segunda comecei a ter medo.
Medo? Um Velho Escoteiro como eu que voou em plagas distantes neste Brasil
Gigante, enfrentou tempestades, vendavais e rajadas de ventos incríveis em
altas montanhas e ter medo? Tinha de pensar. Não tinha mais aquela vivacidade
de outrora, agora teria de ser precavido. Afinal apesar de Dédalo ter orientado
seu filho que não voasse tão alto eu não iria seguir os mesmos passos. Segui o
conselho dele a risca. Se voasse muito alto os raios solares poderiam
facilmente derreter a cera que segurava as penas presas em minhas asas e eu
poderia despencar no mar violento. Meu nobre piloto Geraldo me mostrou como
sobrevoar a seara do Falcão Pelegrino. Fácil Chefe. Mesmo com este sol
escaldante ele me levou no céu de brigadeiro até lá.
Valeu outra vez. Valeu a minha coragem de deixar minha gaiola
onde tenho tudo as mãos e voltar de novo a cumprimentar mãos de autênticos
Escoteiros, sorrir de novo junto a lobinhos e lobinhas. São coisas estranhas
para quem hoje não vive mais no ninho. Só a gente que viveu sabe como é bom um
sorriso sincero, uma alegria autêntica, uma recepção fantástica que me levou
sem pensar ao meu passado de regional. Cada cidade das minhas Minas Gerais
agora vinha na lembrança novamente. Desta vez autenticada por perfeitos
cavalheiros Escoteiros. Fiquei ali pensando o quanto eu escrevi, quanto falei
em meus contos impossíveis, em meus artigos ferinos e eis que do nada surge
assim como a estalar dos dedos tudo que pensava não mais encontrar. Um sorriso
franco um escotismo autêntico de valentes chefes, pais, colaboradores que lutam
para manter mais de cento e quarenta jovens no mais alto padrão Escoteiro.
Um Velho Escoteiro como eu sabe como é. Num piscar é como se
fosse um filme deste a fundação de um Grupo Escoteiro. Um olhar, um aperto de
mão um sorriso um líder que sabe ser liderado não anda por aí facilmente. Eu
sabia que estava em casa. Via com meus próprios olhos a simplicidade em pessoa
na figura de um Chefe simples, amigo, cavalheiro que não dirigia com mão de
ferro, mas com um sorriso simples um piscar de olhos ou até um elogio gostoso.
Um irmão mais Velho e nunca um ditador de ordens. Uma sincronização perfeita.
Todos colaborando. Do menor lobinho ou lobinha aos velhos Escoteiros que lá
viveram nas asas do falcão do passado. Lembrei-me de um comentário de um
dirigente que os jovens de hoje querem coisas novas. Não gostam do nosso
uniforme. Um dos motivos por eles não se aproximarem do escotismo. E aí meu
Chefe! Isto acontece aqui? – Resposta adorável - Nunca, temos uma lista enorme
de interessados e o caqui ainda vai morar aqui muito tempo. Ninguém comenta e
nem vamos discutir se devemos ou não mudar. Nesta hora senti que uma enorme
palma escoteira surgiu estrondosamente em meu coração.
Coisa bonita de se ver. Falcões indo e vindo. Todos bem
uniformizados. Afinal não era fácil manter duas alcateias. Uma tropa masculina
e outra feminina. Uma sênior e uma de guias e mais não sei quantos pioneiros.
São quarenta chefes! Quarenta? E a diretoria já pensa em aumentar as sessões e
adultos na liderança. Não quis bater tanta palma assim. Afinal só estava lá há
uma hora. Olhando tudo aquilo junto a uma simpática Chefe de outro Grupo
Escoteiro e o meu piloto de Boeing que não se negou a me ensinar a voar com
asas de cera. Um dos responsáveis de tudo aquilo. Fiquei meditando. Para que
mudar tanto como nossos dirigentes fazem? Ali estava à prova viva que quando se
quer se faz. Aquele escotismo autêntico. – Todos registrados chefe! Nunca
deixamos de participar de um Jamboree desde que começamos, os interessados
quatro anos antes já estão em campanha. E olhe que cada sessão pelo menos
acampa ou acantona quatro ou cinco vezes por ano. Os Escoteiros e seniores
muito mais. Fechei os olhos e abri olhando diretamente no céu azul e tentei
avistar tudo isto do Oiapoque ao Chuí. Ainda bem que não me decepcionei. Lá
estavam ainda dezenas de grupos assim, mas não era a maioria. Lembrei-me de um
artigo que fiz dizendo sobre formadores: Quem sabe fazer a massa sabe fazer o
pão. Ali estavam chefes competentes que sabiam como fazer e não eram formadores.
Não havia como duvidar. A festividade era perfeita. Uma
sincronização perfeita. Ninguém gritando faça isto ou faça aquilo. Grandes sim
em número e muito maior em percorrer com maestria o Caminho para o Sucesso.
Escotismo perfeito, remadas bem dadas no mar azul do atlântico e uma formação
que sabia por experiência própria e sem sombra de duvida daria como está dando
frutos. Será que os dirigentes (conheço alguns que sim) sabem fazer a massa e o
pão? Ou só ouviram falar? Lá vou eu esta simpatia de Velho Escoteiro a cozinhar
meus velhos amigos da corte. Não aprendi outra coisa? Risos. - Geraldo! Hora de
voar. Rosangela prazer em conhecê-la. George Hirata orgulhoso em ter conhecido
você pessoalmente e seu maravilhoso Grupo Escoteiro Falcão Peregrino. Parti com
um simples aceno. Não houve adeus, nem um até logo. Ouve sim um olhar de amigos
que se diziam sem falar que seriam amigos para sempre. Uma amizade que iria
existir no coração de cada um.
E lá fui eu com minhas asas de cera, magnificamente pilotado por
Geraldo de volta a minha gaiola. Quando irei voar novamente? Não sei. Não posso
facilitar. As coisas não são tão simples para este Velho Escoteiro. Se
facilitar minha asas de cera podem derreter. Um último olhar na sede do Grupo,
fincada no coração de um bairro nobre, mas cuja nobreza fica do lado de fora. Quando
se adentra naquele maravilhoso mundo dos Escoteiros só existe fraternidade. Até
breve! E meu Anrê a todos que ali conheci. Guardei minhas asas de cera. Esperar
uma nova oportunidade. Dosando o bater de asas poderei ir longe. Ate quando? Não
sei. Só Ele lá no alto pode saber.
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