Crônicas
de um Chefe Escoteiro.
Leis,
regras, normas, artigos, parágrafos e outros “escambal”!
"Tenho seis regras que me ensinaram tudo o que sei: O quê, Por que,
Quando, Como, Onde, e Quem?" (Rudyard Kipling).
O mundo é feito de regras,
normas, artigos, leis, decretos, parágrafos e até me assusto com tudo isso.
Nada podemos fazer nada sem pensar que podemos infligir alguma delas. Claro.
São necessárias. Assim dizem. E no escotismo então? Uma parafernália. Cada dia
que passa mais normas, mais regras, mas artigos dizendo o que podemos e não
podemos fazer. Não satisfeitos os nossos dirigentes criaram uma tal de Comissão
de Ética. Li e não gostei. Achei meio ameaçador. Ela põe por terra nossa
fraternidade. No final da década de cinquenta, uns sábios de nossa liderança
criaram o nosso POR. Princípios, Organizações e Regras da União dos Escoteiros
do Brasil. Lindo! Um grande livro. Muitas páginas, completo. Diz tudo que você
podia ou não fazer. Foi mudando, mudando e a direção nacional não satisfeita de
novo adaptou novas regras as suas páginas. Se que muitas coisas estão evoluindo
e a adaptação é necessária. Acho que pouca gente leu tudo!
Tem hora que me sinto cerceado. Se hoje estivesse à frente de uma sessão
escoteira não sei se me desincumbiria bem das minhas responsabilidades. Aquele
escotismo alegre e solto onde o jovem corria pelos campos hoje está todo
mudado. Nada se faz sem pensar nas leis, regras, artigos, parágrafos ou o
escambal. Certo? Sei não! Têm tantos por aí exigindo direitos que podem
aparecer no escotismo alguém a exigir os seus. “Quero meus honorários”! Quero
meus direitos! Quero minha Insígnia! Quero meu Tapir de Prata! Quero meus
tacos! Que se faça justiça! Vou processar quem for contra mim! Saudades dos
velhos tempos. Oi Romildo! E aí? Vamos acampar sábado? Era assim. Colocava
minha mochila, ração A ou B, uma meia lona da barraca e lá íamos nós cantando pelos
campos o Rataplã! Hoje? Adeus liberdade juvenil.
Pense comigo se você quiser ser voluntário no escotismo, vai ter de
enfrentar mil normas, mil regras, mil leis. E ainda pagar por isto. Voluntário
que paga? Isto mesmo. Paga taxas, paga mensalidades e ainda tira do bolso para
o seu menino pobre que precisa! Isto é um escambal. Antes não. Os chefes vinham
dos pioneiros, que vinham dos seniores, que vinham dos escoteiros, que vinham
dos lobinhos... Um escambal de “beleza” mesmo. Difícil isso hoje. Prefiro nem
comentar. Mas se queres mesmo ser um voluntário “pagante”, preencha a ficha,
leia as normas, as leis e observe bem se não tem letrinhas miúdas (ou
tem?). Se tiver nem pense em se socorrer no PROCON. Será malhado, esculhambado,
julgado e expulso. Mas se topou e aceitou “beleza”. Vais receber um “Tutor ou
assessor pessoal” Será o responsável pelo seu desenvolvimento. (que luxo! não
tínhamos isto no passado). Ele vai lhe orientar, pois aprendeu em um curso como
agir e sabe tim tim por tim tim. Cuidado com ele. Pode querer vir a ser seu
dono e dirigir seu destino Escoteiro. Brincando. Nada disto. Todos eles são
gente boa.
De muitos tutores e assessores
que vejo atuando a maioria ou são os Presidentes ou Diretores Técnicos do
próprio grupo. Para mim nada mudou nada de novo no Front. Sempre os Chefes de Grupo
ficavam de olho! Afinal não temos tanta gente por aí “dando sopa” para tomar
conta de “marmanjos” escoteiros. Um belo dia você vão lhe ensinar a amarrar a
ponta do lenço, colocar um chapéu esquisito e já está promessado. Irão lhe
dizer que se quiseres reclamar procure o local certo. Uma tal de Assembleia.
Brincadeira. Sei que não é assim em muitos grupos. Mas têm tantos amarrando o
lenço, sem uniforme, um belo chapéu australiano, um lindo tênis branco, uma
bermuda amarela que parodiando um comediante eu digo - Será que vale a pena, meu?
Escoteiros avante! O amanhã será nosso! Rataplã!
Acampar virou um nome
proibido. Acampar? Deus me livre. Não tem o pedido de autorização para o
Comissário do distrito? E se for sair do seu Estado de origem, já pediu
autorização dos estados onde vai passar? E fora do Brasil? Isto deve ser feito
em quatro vias. Uma para o grupo, uma para o distrito uma para a região e uma
para a direção nacional. Se possível com firma reconhecida! E depois? Uma
autorização por escrito dos pais. Também com firma reconhecida e é melhor não
esquecer. Fora do Brasil só com a tal nova vestimenta. E tome cuidado. Se
houver um gritinho mais alto do chefe, os pais podem processá-lo. Se um pai for
advogado é melhor não acampar mesmo. Fique em casa que vai ganhar muito mais.
Risos.
Depois, depois, é fazer centenas de cursos de aperfeiçoamento burocrático,
como manusear o SIGUE, como agir com o tal voluntário que apareceu no seu grupo,
como entender os estatutos da juventude, o papel dos nossos lideres (eles gostam!).
Haja papel e tempo para Liz de Ouro, para Escoteiro da Pátria, para Insígnia de
BP, para Condecorações, Para os cordões de eficiência, para, para, para...
Melhor contratar um contador para isso e que seja bom e entendido em internet.
Nunca vi tantos processos e ainda dizem que o escoteiro tem uma só palavra. Mas
enfim, isso é a modernidade. Cada dia recebendo novas normas, novos programas.
– “A partir desta data, fica determinado que a determinação anterior não vai
determinar mais nada!”.
Prefiro ficar em casa. Minha
saúde não é a mais mesma. Meu escotismo era outro. Um escotismo alegre e solto,
feito por uma juventude que sabia dos seus sonhos e ideais, onde todos falavam
o mesmo idioma, onde nos encontrávamos para contar histórias, onde os fins de
semana eram nos campos e campinas, a subir montanhas e dormir sobre as
estrelas. Hoje não se pode mais. É papel que não acaba mais, ou melhor, é SIGUE
que não acaba mais. Temos que ficar de olho para não infligir alguma norma. Meus
olhos se confundem quando leio tanto as tais normas, leis, decretos, regras,
artigos, parágrafos... Isso é um escambal. No bom sentido. Mas enfim,
sempre me lembram de que o mundo é outro. Tudo é mais moderno. Deve ser. Mas
quer saber? As estrelas que via quando menino ainda estão no mesmo lugar. As
terras com boa aguada são as mesmas, a nascente ainda mostra um filete de água cristalina
e brilhante. E os sonhos dos jovens ainda têm muito de uma “pitada” de
aventura. O que mudou? Deus meu! Tudo! Agora temos leis, regras, normas,
artigos, parágrafos e outros “escambal”!
"A verdade é que muita gente cria regras para não ter de tomar
decisões."
(Mike Krzyzewski).
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