Conversa a pé do fogo.
O escoteirinho sabido.
Os pais
me pareceram snobes quando vieram fazer sua inscrição. Quando disse que eles
teriam que fazer um pequeno curso de quatro horas para o filho ser aceito foi
um Deus nos acuda. A mãe levantou e pegou o filho pela mão dizendo que não ia
se submeter aquilo tudo. Ela tinha mais o que fazer. Ele gritou com a mãe e o
pai. – Não sou idiota disse. Não queria vir aqui foi vocês que insistiram. -
Agora aguentem e aceitem as normas! Nossa! Eu pensei. Ele teria quanto anos?
Oito? Nove? O pai ficou parado. Vamos reunir em família. Foram lá fora e
voltaram. – Tudo bem Chefe, que assim seja. No dia marcado eles apareceram.
Fizeram o curso e foram apresentados ao grupo escoteiro no cerimonial. O filho recebido
pela Aquelá. Todos os lobos apertaram sua mão. Ele parecia alegre. Ou pelo
menos parecia.
Três
reuniões depois Martinha a Chefe veio reclamar comigo. – Olhe Chefe, o sabe
tudo está acabando com a Alcateia. Quer dirigir mandar decidir. Já reuniu duas
vezes os lobos e disse que eles têm direitos. Não são obrigados a obedecerem
tudo do Chefe. Que eles devem ler os Estatutos do menor e do adolescente. É
difícil dialogar com um jovem como ele. Pela arrogância dos pais sabia que
teria dificuldade. Soube que ele era superdotado. Estava liderando a Alcateia
com nove anos. Conversei com o Chefe da tropa. Vamos fazer uma experiência? O
Chefe ficou assim e assim. Nove anos? Tudo bem, vamos tentar. Vai para a
Coruja, o Monitor é mais velho e durão. No programa a tropa ia acampar três
semanas depois. O Monitor disse ao Chefe que ele não devia ir. Estava muito
verde ainda.
Ele me
procurou. Precisavam ver sua pose ao falar comigo. Exigia seus direitos. Nove
anos o danado e pensei que quando crescesse seria um barril de democracia. –
Tudo bem, você vai. Mas se chorar lá não vai voltar. Só no final do
acampamento. Ele riu – Chefe sou homem e sou macho. Sem decidir minha vida.
Chegou com uma mochila e apetrechos que tomavam todo seu corpo. Ele sumiu atrás
da tralha que escolheu. Disse a ele que o ônibus nos deixaria quatro
quilômetros do local do campo. Ele riu. Chefe precisa me conhecer melhor. Não
sou de desistir nunca. Nunca pedi ajuda e nunca irei pedir. Sei o que faço.
Dito e feito, dois quilômetros e ele para trás, três e ele sumiu de vista na
curva da estrada. O Monitor voltou para ajudar.
No
primeiro dia ele corria para todo lado. Parecia mesmo ser um jovem esperto com
seus nove anos. Tudo aconteceu à noite após o jantar. Não gostou da janta.
Procurou-me para levá-lo até um restaurante a beira da estrada. Eu estava com
meu automóvel. – Nem pensar meu jovem. O que você comeu todos comeram. Chefe eu
não comi nada! Porque não quis. Quem sabe o cozinheiro deixou uma porção para
você na panela? Dito e feito, ele começou a gritar, a chorar e deitou no chão
pegando a maior manha. Passou a noite toda chorando. Não o levei e nem mandei
recado aos seus pais. Boi bravo é assim que aprende pensei. Certo ou errado ele
ficou lá os quatro dias. Parou de gritar e chorar. No retorno vi que sua
mochila diminuiu. Falei para o Monitor. Ele jogou fora boa parte de tudo em um
barranco para diminuir o peso.
Na
chegada seus pais estavam lá esperando. Ele desceu do ônibus e calado foi com a
patrulha para guardar a tralha da patrulha. Estava uma luva agora. Obediente e
disciplinado. Na semana seguinte seu pai me procurou - Chefe, meu filho mudou e
para melhor. Parece outro menino. O que houve? Não entrei em detalhes. Disse
que o escotismo é trabalho em equipe. Aprender a fazer fazendo. Ele aprendeu. –
Seu pai agradeceu. Depois fiquei sabendo que era um alto executivo na Ford. Sua
mãe advogada em um dos melhores escritórios de advocacia da capital. Os anos passaram
e o escoteirinho lá conosco.
Três anos depois fui morar em outro bairro. Um grupo próximo a minha
casa balançando para não fechar. Precisava de ajuda. Mudei de grupo. O
escoteirinho eu o vi nove anos depois em uma atividade regional. Era outro,
precisavam ver. O Que o escotismo pode fazer não? A vida é assim mesmo.
Acampamento é para os jovens aprenderem a lutar pela vida. Dar cobertura,
passar a mão na cabeça, chamar papai e mamãe para leva-lo não é o certo. Bem
casos são casos. Cada um tem seu estilo. Este deu certo graças a Deus!
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