Conversa ao
pé do fogo.
Enzo, o
Monitor da Tropa Caapora.
Enzo estava pensativo. Já
duravam duas semanas e na patrulha não se falava outra coisa. O Arthur ia
passar para os sêniores no mês que vem. Até aí tudo bem, mas o Arthur era Monitor.
Mesmo com o Murilo seu sub. há muito tempo todos sabiam que haveria eleição.
Era uma tradição desde que a tropa fora fundada. O sonho de Enzo sempre foi ser
um Monitor. Desde que passou dos lobos para a tropa. Sabia que tinha de esperar
sua vez e para isto sempre foi participativo no trabalho e nas ideias da
patrulha. Havia uma amizade enorme entre eles, mas havia Julia ela também
sonhava. Um dia ela disse para ele. – Enzo, eu também sonho em ser uma
monitora. Os demais não tinham essa preocupação. Para eles tanto fazia ser como
não ser. Enzo não entendia porque, afinal seu pai um dia disse para ele que
quem fica parado é poste. – Siga seu próprio nariz se quer ser alguma coisa na
vida, dizia o Chefe Tomaz. Era seu direito em sonhar e a Julia era páreo duro.
Primeiro que ela sorria de uma maneira tal que ninguém dizia não. Sabia
conquistar e fazer amizades.
Arthur o Monitor achou por bem
fazer um Conselho de Patrulha. Explicar a sua ida para os seniores e combinar a
data da eleição do novo Monitor. Arthur não foi um excelente Monitor, todos o
achavam muito mandão. Sim ele trabalhava e muito, mas exigia demais. Quando na
inspeção a patrulha falhava todos sabiam que ia haver sermão. Arthur não era
participativo. O que se falava na Corte de Honra ninguém sabia nada. Nas outras
patrulhas havia comentários, mas a Tamanduá não se falava outra coisa.
Robertinho da Patrulha Arara morava na sua rua e lá eles eram grandes amigos.
Eles tinham liberdade de conversar tudo que achavam da Tropa Caapora. Enzo
nunca escondeu de sua decepção com a patrulha no último acampamento. Não se
classificaram tudo porque o Arthur dormiu mais do que devia e era sempre ele
que acordava a patrulha. Resultado não deu tempo para preparar o campo e na
hora da inspeção a tampa da fossa de líquidos estava quebrada, no fogão
suspenso havia muita cinza, uma das barracas tinha a forquilha solta e só isto
jogou a patrulha lá embaixo. Enzo quase chorou e ainda bem que o Robertinho era
bom amigo e o consolava sempre.
- Sabe Robertinho, dizia Enzo – Eu queria
ser Monitor, queria mostrar a todos o que deveria ser um Monitor. Iria seguir a
risca o que Baden-Powell disse - ‘Quero
que vocês, monitores, entrem em ação e adestrem suas patrulhas inteiramente
sozinhos e à sua moda, porque para vocês é perfeitamente possível pegar cada
rapaz da Patrulha e fazer dele um bom camarada, um verdadeiro homem”. De nada
vale ter um ou dois rapazes admiráveis e o resto não prestando nada. Vocês
devem procurar fazê-lo todos positivamente bons. – Robertinho retrucou que não
é fácil conduzir uma patrulha. Cada Monitor tem um estilo. Veja o Joel nosso
Monitor. Todos o acham paradão, se não fosse o Cassio o Sub a patrulha já tinha
ido para o brejo há muito tempo. Enzo lembrou quando entrou para a tropa e o
Chefe Josias com sua barriga e suas pernas curtas nunca acompanhou como devia a
tropa. Só sabia gritar e quando ia fazer algum comentário deixava todos de pé
por vinte ou trinta minutos. – Sabe Robertinho, naquela época quase saí.
- Ainda bem que ele foi embora e entrou
o Chefe Marcelo. Ele é bom demais. Amigo, compreensivo, educado e só chama a
atenção de alguém em particular. Na semana seguinte o Conselho de Patrulha
votou que a eleição seria na próxima semana. Qualquer um poderia ser candidato.
Arthur fez questão de perguntar a um por e um e só Enzo e Julia seriam
candidatos. Claro que ele aproveitou para fazer uma preleção sobre como devia
ser o Monitor, mas não disse que deviam ser diferente dele. Ninguém reconhece
seus erros só os acertos. Tudo ia bem quando na quinta o mundo de Enzo
explodiu. – Não era possivel! Ele pediu tanto a Deus e agora? Seu pai naquele
dia entrou em casa sério, chamou Enzo, Norma sua irmã e sua mãe dizendo que
tinha um importante comunicado da fazer – Entrou logo no assunto: - Fui
transferido para Monte Azul. Meu salário terá um aumento considerável e lá
serei o Diretor da Secretaria Fazendária. Enzo foi para seu quarto e chorou
mesmo com sua irmã e mãe tentando ajudá-lo a compreender as responsabilidades
na família.
Nunca na vida Enzo chorou tanto.
Queria tentar entender, mas sua mente só tinha uma preocupação o seu amor pelo
escotismo e o sonho de ser Monitor. Sonho que estava tão perto! Naquele sábado
as suas pernas não ajudavam. Enzo foi para a reunião com o peito queimando.
Sabia que a mudança da família seria feita só em janeiro a espera do termino do
semestre para eles não ficarem prejudicados na escola. Seu pai iria antes.
Quando chegou a sede viu a alegria tão conhecida, as patrulhas reunidas, muitos
de pé lhe dando o Sempre Alerta, os lobinhos em uma correria sem fim. – Será
que vou aguentar? Ainda faltam oito meses para a mudança, mas eu conseguirei
continuar aqui? Meu coração pesa, minha mente está em pedaços, meu Deus não sei
o que fazer! A reunião começou, só ao termino dela a Patrulha faria seu
Conselho. Conselho tão esperado por Enzo. Quando o Arthur chamou a patrulha
para se reunirem na sede, na sala onde se fazia A Corte de Honra e outras
reuniões importantes, Enzo fechou os olhos e rezou pedido a Jesus que lhe desse
força.
Aberta a reunião do Conselho Enzo
pediu a palavra. Contou tudo. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Não
haveria volta ele ia partir. Durante segundos e minutos ninguém disse nada.
Todos sabiam que Julia agora seria a nova monitora. Ela pediu a palavra –
Patrulheiros, pela primeira vez eu senti que não seria digna de ser monitora,
não neste momento. Se todos concordarem Enzo será nosso Monitor até janeiro
quando vai embora. Acho que ele merece isto. Uma tremenda de uma salva de
palmas. Até Arthur no alto de sua pose de Monitor, levantou da cadeira e deu um
grande abraço em Enzo. Este não sabia o que dizer. Não sabia se chorava ou se
ria. Monitor por um dia? Por meses? Porque não? Todos correram a abraçá-lo e
jogá-lo para o ar. Se em todos os monitores do mundo existe uma força que o
faria ser por tão pouco tempo um grande Monitor, Enzo não decepcionou.
No dia da partida foi uma festa. Uma
festa que ficou marcada na vida de Enzo para sempre. Partiu sorrindo e
chorando. Deixar para trás a tantos que sempre amou não era fácil, mas eles
foram dignos com ele. Mereciam que ficassem gravados em sua mente para sempre.
Se lá em Monte Azul não houvesse um Grupo de Escoteiros, Enzo faria tudo para
que exista um. Coração de Escoteiro é assim, não desiste nunca. Não importa
onde, não importa o lugar, Escoteiro é Sempre Escoteiro. Enzo foi um dos
maiores monitores da história do escotismo. Onde estivesse eu sei que
Baden-Powell estaria orgulhoso dele!
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