Conversa ao
pé do fogo.
Apenas uma
reunião de tropa...
Gedeão sabia que o sábado
estava chegando. Como tudo mudou para ele. Antes uma motivação enorme quando ia
para as reuniões de tropa. Uma alegria uma vontade de continuar ali além do horário,
mas agora... Agora não. Ele notou que as últimas reuniões foram fracas, sem
graça, e Marcondes tinha faltado mais de duas reuniões. Ele se lembrava de
Ethan e Galileu. Nenhum deles o procurou para dizer que estava saindo. Ele foi à
casa dos três e olhe que não era fácil. Trabalhava do outro lado da cidade e só
aos sábados após as reuniões tinha um pequeno tempo, é claro que isto
interferia e muito com sua família que o cobrava sempre. Chefe Gedeão havia
meses que pensava onde estava errando. Ele sempre rebuscava no passado as
atividades os acampamentos e as reuniões de tropa que participava. Era outra
época. Quatro patrulhas completas. Dificilmente alguém saia, mas hoje? Hoje era
tudo diferente. Ele ainda tinha três patrulhas porque Jerusa, Jesabel, Germine
e Isabel passaram da Alcateia para a tropa.
Ele sentia que as meninas
ficavam mais tempo, eram mais interessadas e queriam a todo custo chegar ao Lis
de Ouro. Os meninos nem todos. Agora a tropa tinha dezenove participantes, mas dez
eram meninas. Ele sabia que isto não podia continuar, ele não podia perder
meninos assim. Tinha que haver um motivo. Ficou feliz quando Ester saiu dos
lobos e veio ajudar na chefia. Mas ela tinha muito boa vontade e pouco conhecia
dos Escoteiros. A consultou muitas vezes, mas sua experiência era mínima. Um
dos maiores problemas ele conseguiu resolver: - O enorme tempo que ficavam no
hasteamento e arreamento da bandeira. Sempre escolhiam esta cerimônia para
promessa, para entrega de distintivos e especialidades e certificados o que
atrasava muito o programa da tropa. Como todas as sessões faziam a reunião em
conjunto era natural que todos estivessem presentes, afinal eram ou não uma
grande família? No Conselho de Chefes que faziam uma vez por mes mês ele levantou
o assunto. Sorriu quando viu que outros pensavam como ele.
Chegaram a um acordo. Cada
sessão iria tirar um tempo durante as reuniões para fazer a promessa, entregar
distintivos dentre outros. No Cerimonial só as grandes conquistas: - Lobo
Cruzeiro do Sul, cordões de eficiência, Lis de Ouro e Escoteiro da Pátria. Não
iriam demorar mais que quinze minutos no inicio e dez no fim. Mesmo assim ele
não estava satisfeito. As reuniões estavam mornas, os jogos sem graça e as
atividades técnicas desinteressantes. Notou também que as patrulhas nos tempos
livres quase não se reunião, o adestramento do Monitor com seus patrulheiros só
era feito quando ele exigia. Sabia que
adoravam acampamentos e excursões, mas e a ultima excursão? Faltaram cinco. Uma
lástima. Conversou com os monitores na Corte de Honra e em particular. – O que
está havendo? Alguns nada diziam e outros davam desculpas que não condizia com
a verdade. Ele tinha um enorme arquivo de jogos. Agora com a Internet ficou
mais fácil ainda. Adiantava? Não.
Chefe Gedeão precisa
descobrir o motivo. O motivo real e ele sabia que não era só ele. Conhecia
muitos amigos chefes que se ressentiam da mesma maneira. Nunca se descuidou de
sua biblioteca Escoteira. Gastou uma nota para ter todos os livros que
precisava. E os cursos? Pagou do seu próprio bolso a maioria deles. Mesmo
depois quando recebeu a Insígnia de Madeira ele notou que nada mudou a não ser
o lenço. Cantava sempre baixinho o Volta a Giwell. Mas voltar para onde? Outros
cursos? Quais? Não sabia se existiam cursos de pós-graduação o conhecido MBA no
escotismo. Será que existia? Ele precisava mais, precisava de um curso onde se
poderia discutir programas de reuniões, jogos, técnicas novas de motivação e
tantos mais. É não adianta dizer que em meus sonhos sempre volto a Giwell. Nem
sei se eles tem cursos para aprimorar meus conhecimentos ele dizia.
Ele tentou de tudo. Fez
jogos que ninguém esperava, montou diversas bases técnicas, deu dica para cada
patrulha onde conseguir conhecimentos, levou um amigo violonista para ensinar a
cantar melhor as musicas Escoteiras, tentou ao seu modo ensinar e mostrar a
cada Escoteiro e Escoteira o verdadeiro sentido da lei e promessa. Em nenhuma
reunião ele deixava de comentar ou fazer um jogo sobre a lei escoteira. Como
religioso que era Deus estava presente em tudo que fazia e ele fazia questão de
dizer aos seus jovens. Chegou a comprar um caminhão de eucaliptos e bambus para
uma disputa de pioneirias na sede. No inicio supimpa, mas depois... É voltar a
Giwell todos diziam, mas ele não sabia onde ficava Giwell a não ser na
Inglaterra. Passou domingos e domingos montando programas, discutiu com
monitores e pediu ajuda as patrulhas para dizerem se aprovavam ou não. Claro
ninguém dizia não só sim.
Chefe Gedeão viu que
nada deu certo. No último sábado Jerusha
não veio. Quase ao encerrar foi procurado por Joviel que disse não iria vir
mais. Ele iria fazer um curso à tarde. E agora meu amigo? Ele disse para si
mesmo. Tentou uma última cartada, ligou para muitos chefes que conhecia. Todos
ou a maioria sempre lhe dando uma força, dizendo o que fazer como fazer e ele
sabia que tudo aquilo ele já tinha feito. A tropa ele sabia ia de mal a pior e
detestava quando via patrulhas incompletas, com três ou quatro ou mesmo quando
via algum Chefe tirando Escoteiro de uma patrulha para colocar em outra.
Naquele sábado foi para casa amargurado. Tinha de haver uma solução. – Fazer
fazendo? Deixar que eles decidam? Querem fechar a tropa? Melhor acabar com
tudo? – Gedeão já tinha decidido. Iria insistir para que cada um desse sua
opinião, ele sabia que no inicio todos sempre abaixavam a cabeça e não diziam
nada. Os mais afoitos comentavam, mas nada de importante.
- Tropa! Ele disse com todos em linha. A partir de hoje vamos ficar
quinze minutos depois do horário. Avisem aos seus pais. Não disse mais nada. –
Naquele sábado eram doze. Muitos já tinham desistido. – O motivo é para saber
qual a atividade que devemos fazer quais os jogos que devemos fazer como
motivar nosso amigo na patrulha, quais as sugestões podemos dar. Agora é com
vocês. Gedeão se calou. Não falou mais nada. Pegou todo mundo de surpresa.
Naquele sábado o tempo acabou sem ninguém falar nada. No segundo sábado todos
sentados em circulo e ele nada disse. Ninguém falava. Deu o tempo e todos foram
embora. Assim foi no terceiro e quarto sábado. Gedeão soube que eles se reuniam
fora da sede. E no quinto e sexto sábado começou a ouvir. Ele só ouvia. Em
todas as reuniões nunca disse nada. Nunca deu palpite. Afinal por anos ele
fazia tudo e achava que tinha a solução na mão.
Três meses depois ele viu
alguém levantando a mão. – Sabe Chefe, eu acho... – Outro também disse: - Sabe
Chefe... E assim Gedeão venceu a batalha. Agora todos faziam questão de opinar.
A tropa se motivou de tal jeito que vinte minutos não dava. Precisavam de mais.
As discussões eram acaloradas. Gideão nunca falou. Nunca disse nada. Sempre
ouvindo seus Escoteiros e Escoteiras. Mas o que diziam ele sabia que devia por
em prática. Só sei que em menos de oito meses a tropa de Gedeão tinha três
patrulhas completas a caminho para a quarta. Chefe Gedeão ainda lembrava quando
leu em um livro um comentário de saber ouvir: - Perceber,
reconhecer, entender, compreender, valorizar, dar atenção, respeitar… São
vários nomes diferentes para um processo tão simples, mas ao mesmo tempo tão
difícil de ser praticado: ouvir, de fato, o outro.
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