Os meus doces sonhos da primavera
Foi
meu primeiro acampamento. Jurei que seria o último. Uma experiência que nunca
esqueci. Raios, trovões caindo perto, arvores caindo, uma chuva torrencial
achei que o mundo ia acabar. Gritava de medo. E não foi só isto. Pensei que era
diferente. Um passeio gostoso no bosque? Bah! Armar a barraca tudo bem. Foi
divertido mas depois cortar bambu, furar buraco no chão e a comida? Horrível!
Não teve graça. Minhas mãos estavam cheias de calos se tivessem deixado levar o
celular tinha ligado para minha mãe ir me buscar. Pedi a Chefe mas ela nem aí.
Bem eu sabia que nunca mais voltaria em um. Um verdadeiro desastre.
Prometeram-me tanto e quase morri de trabalhar, de correr e porque não dizer de
medo. Nunca pensei em ser Escoteira. Nunca mesmo. Marlene minha amiga de
colégio foi quem deu a ideia. Uma amiga sua era escoteiras desde lobinha e
adorava. O uniforme era lindo. Tinha meninos lindos. – Vai ser sopa, falou. Vamos
lá escolheremos um belo namorado e damos o fora. E riu com gosto.
Minha
mãe foi comigo. Meu pai é falecido. Ficaram um tempão falando e falando.
Perguntei se não poderia ir para o pátio e brincar com todo mundo. Never,
never. Disse o Chefe. Você deve assistir e ouvir o que estamos conversando. Eu
e sua mãe. Vai te interessar. Bobão. Ele não sabia do meu interesse. Depois
disse que minha mãe tinha de fazer um curso. Blá, blá, blá. Quanta besteira! Um
dia foi aceita. Esqueci, me chamo Isabelle. Sou bonita, assim dizem os rapazes,
mas até hoje não arrumei nenhum namorado. Minha mãe dá risada. Isa, você só tem
12 anos! É, ele não sabe que já conheço a vida como ninguém. Não sou mais uma
menininha que ele colocava no colo. Bem voltamos aos escoteiros. Colocaram-me
numa tal de Patrulha Pantera. Só meninas. E os meninos perguntei? Eles tem a
patrulha deles. Bem tinha de experimentar.
Estava
marcado um acampamento de quatro dias. Um feriado prolongado. Até que gostei da
ideia. Ceceia me contou uma vez que fez um acampamento. Só que daqueles em
fazenda, onde se paga e tem tudo. Almoço café, jantar e monitores lindos. Tipo
os dos filmes que assistir varias vezes. Minha mãe comprou tudo que pedi.
Coitada, passávamos por uma dificuldade financeira muito grande. Éramos só ela
e eu. Fazia tudo por mim. Gostei da mochila, do cantil, do canivete e os
danados dos chefes não deixaram ir de uniforme. Disseram que tinha de fazer
promessa. Promessa! Que diabos é isso? Comprei uma camiseta vermelha escrita o
nome do grupo. Comprei logo duas, pois sabia que uma ia sujar e não gosto de
roupa suja e nem de lavar.
No dia
do acampamento mamãe me levou até a sede. Lotada. Pais tios, avós todo mundo
abraçando e chorando pensando que todos os meninos e meninas iam morrer e não
voltar mais. Quando entramos no ônibus foi àquela festa. Cantorias sem fins e
os pais lá fora dando adeusinho. Quanta cafonice. Mas me diverti muito na
viagem. Havia escoteiros lindos no ônibus. Namorei com o olhar muitos deles mas
nenhum me olhou assim, como devia. Chegamos descarregar e aí começou meu
inferno astral pessoal. Era um tal de armar barraca, cortar bambu, buscar água,
cortar lenha seca, correr daqui e dali. Estava “pregada” e a monitora me
chamando de “folgada”. Ajudei o mais que pude. Minhas mãos em frangalhos. Calos
e calos um até sangrava. E o almoço? Aquilo era almoço? Uma Escoteira que dizia
cozinheira fez um arroz grudendo e enfumaçado. Quando fui comer estava doce.
Não colocou sal. O bife? Um horror! Não passou direito. Estava sangrando de um
lado. Fizeram ainda uma salada de tomate esta pelo menos eu coloquei o sal que
queria.
E a noite,
cansada “prá dedeu” ainda inventaram um jogo noturno para se esconder no meio
do mato. Eu e Verinha juntos e nós morrendo de medo. Uma cobra! Um escorpião?
Um jacaré? Meu Deus! Quem sabe aparece uma onça? E se viesse uma manada de
elefantes correndo o que fazer? E o pior, cansada e toda dolorida fui dormir.
Raios, trovões, uma tempestade desabou sobre nós. A barraca começou a encher-se
de água. Comecei a chorar e pedir mamãe! Uma ventania derrubou a barraca.
Corremos para debaixo de uma árvore. Um raio a cortou no meio. Meus olhos
estavam esbugalhados. Minha voz não saia. Nem rezar eu lembrei. Maldito
Escoteiro, nunca mais. Quando chegar em casa quero distância. Nunca me verão
nas reuniões. Acampamentos? Deus me livre. Aqui nunca mais!
Passaram muitos anos depois disto. Hoje sou a
Chefe das Escoteiras. Tenho minha Insígnia de Madeira, muitos amigos
escoteiros, casei com um que não é Escoteiro e quando minha filha tiver idade
acho que vai ser uma. Sempre dei muitas risadas quando lembrava do meu primeiro
acampamento. Olhe quantas saudades! Hoje tenho mais de 150 noites de
acampamento. Fui em muitos lugares. Tenho orgulho da minha vida Escoteira e amo
o escotismo. Mas o primeiro acampamento dizem que ninguém esquece, e eu não
esqueci mesmo! Risos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário