Lendas
escoteiras.
A Árvore
dos sonhos impossíveis.
Ela sempre existiu na Rua da Felicidade, lá no final do bairro dos
Grandes Amores. Ficava bem em frente à igrejinha dos Noivos felizes. Era um
belo Jequitibá, enorme, frondoso e interessante, embaixo de sua sombra sempre
existiu uma camada de grama verde macia e que nunca crescia. Ideal para deitar
e sonhar. Até mesmo em sua volta flores silvestres nasciam em qualquer época do
ano. A que mais se sobressaia eram as bromélias. Sempre floridas e perfumadas,
um perfume que embalava os sonhos dos amantes que ali passavam. Minha Avó disse
que quando nasceu ela já estava lá. Se for verdade ela teria mais de cem anos.
Eu a descobri por acaso. Um dia andando sem rumo topei com ela. Encantei-me. A
sombra convidativa me fez sentar e logo estava encostado ao seu tronco macio eu
dormitava. Foi minha primeira vez. Voltei lá muitas outras vezes. Fiquei amigo
do Jequitibá. Um dia me passou a narrar os sonhos e desejos dos que a
procuravam. A princípio me assustei depois embalado pela brisa suave que ela
fazia questão de soprar de leve em meu rosto passei a absorver através da mente
o que ela insistia em me contar.
Tininho, um Escoteirinho feliz foi o meu primeiro. Um dia descobriu o
Jequitibá. Como eu ele também se encantou. Voltava do seu primeiro dia de
Escoteiro. Fechou os olhos, deitou na grama macia convidativa e sem perceber
passou a contar cm sua mente para a Árvore dos Sonhos um pouco de sua vida.
Sempre quis participar. Seus pais contra. Fez tudo e nada. Era seu sonho ser
Escoteiro. Não sabia a quem apelar. Um dia ouviu uma música, decorou e passou a
cantar todas as tardes na varanda de sua casa. A música era uma velha conhecida
do velho oeste americano. “Suzana”. Dizia - ¶Minha mãe vou lhe pedir, e não a
quero aborrecer, para ser um homem forte, um Escoteiro eu quero ser! – Vou para
o campo, aprender a trabalhar, não serei um peso morto e não darei o que falar!
O meu Chefe, saberá me ensinar, andar pela floresta sem espinhos atrapalhar!¶ -
E assim Tininho cantou por semanas e meses. Um dia seu pai se apiedou dele. Viu
que ele cantava plangente, queixoso e triste. Afinal era seu sonho de menino. O
levou ao Grupo Escoteiro. A maior alegria de um menino sonhador aconteceu. Tininho
voltou lá muitas vezes, muitas vezes contou seu sonho à árvore dos sonhos
dourados sempre com um grande sorriso nos lábios.
Foi
em uma tarde quente de agosto que a Árvore dos sonhos recebeu Nalvinha. Ela
deitava em sua sombra sonhava. Nalvinha sonhava em ser Escoteira. Com quinze
anos procurou o grupo Escoteiro próximo a sua casa. Foi aceita e entrou na
Patrulha Flor de Lis. Nalvinha vibrava com tudo. Ia para a casa, para a escola
e sempre sua mente voltada para os escoteiros. Nalvinha não se achava bonita.
Nunca achou, mas Totonho se apaixonou por ela. Ela não pensava em amores, pois
o escotismo era sua vida. O pior aconteceu em um acampamento. Ela procurava
lenha seca próximo ao seu campo de Patrulha. Totonho a segurou pelo ombro e a
jogou ao chão. Nalvinha assustada gritou com ele e ele não parava, queria
beijá-la a todo custo. Balbuciava que ela era sua vida, que a amava que viver
sem ela era melhor morrer. O Chefe Lourenço ouviu seus gritos. O caso foi
levado a Corte de Honra. A decisão foi unânime. Totonho seria expulso tão logo
voltassem do acampamento. Nalvinha perdoou Totonho. Pediu ao Chefe que não o
mandasse embora. Foi perdoado com uma suspensão de dois meses. – O tempo
passou. Hoje Nalvinha é casada com Totonho. Vivem felizes como dois grandes
amantes. Walace e Rosália são seus filhos. Nalvinha sorria de olhos fechados.
Ela era a mais feliz do mundo. Um grande amor, dois lindos filhos e o Escotismo
que vivia em seu coração.
Era
bom deitar sobre a relva verde da Árvore dos sonhos. Quanta coisa ela me
contou. Ah! Joel Simon. Um dia passou por ali viu a árvore e resolveu tirou uma
soneca. Joel Simon era Chefe. Oito anos se passou e naquele dia recebeu sua
Insígnia de Madeira. Joel Simon reviveu tudo que aconteceu com ele no grupo.
Como se fosse um telão enorme sua vida era passava rapidamente. Quando resolveu
entrar foi por causa de Carlinho, seu filho de sete anos. Queria ser lobinho.
Porque não? Lá foi com ele. Nunca viu tanta alegria em uma criança. Resolveu
entrar, pois tudo o atraía ali. Marly foi contra. Sua esposa estava ficando
amarga. Ele tentava manter seu casamento, mas estava difícil. Insistia para
Marly ir com ele. Um dia ele se acidentou em um acampamento. Acidente simples.
Tentava descer por uma corda no alto de uma árvore. Perdeu o equilíbrio e caiu.
Fraturou um braço e uma perna. Os escoteiros valentes o levaram até a estrada.
Chamaram a ambulância. Marly quando soube ficou possessa. – Queria por que
queria vê-lo fora do Grupo Escoteiro. Um dia ela resolveu se divorciar. Ele fez
tudo para que não acontecesse. Não houve jeito. Ela foi embora. Não foi com
ninguém. Voltou para a casa de seus pais. Deixou Carlinho com ele. Hoje ela
voltou. Passado dois anos ela se arrependeu. Ele a abraçou e a beijou
apaixonadamente. Ela pediu para ir ao Grupo Escoteiro com ele. Gostou. Disse
que ia ser Chefe. Ah! Joel Simon, o Chefe Escoteiro mais feliz do mundo!
Mas nem
todos os sonhos são felizes. Noêmia era professora do Grupo Escolar Padre
Eustáquio. Um dia viu uma Alcatéia de lobinhos passando em frente à escola. Era
sábado. Ela fora lá porque precisava colocar em dia as provas que os alunos
fizeram na semana. Noêmia tinha vinte e cinco anos e solteira. Não era bonita.
Nunca foi. Ao nascer tiveram que operar sua boca. Um rasgo enorme. Uma parte
dos lábios finos e outro grosso demais. Seus alunos olhavam para ela com medo. Fazia
tudo para conquistá-los. Mas era difícil. Pensou em procurar o grupo. Não sabia
o que a esperava. Um Chefe prepotente, rancoroso, a recebeu mal. Ela não sabia
o que fazer. Ele dizendo a ela que não precisavam de ninguém. Que ela primeiro
devia operar os lábios. Nenhum Escoteiro ou lobinho iria gostar dela. Que ela
se tocasse. Noêmia saiu dali chorando. Ao atravessar a rua um ônibus a
atropelou. Ficou tetraplégica. Sua mãe a levava sempre a Arvore dos sonhos. O
Jequitibá chorava com ela. A embalou muitas vezes tentando com seu néctar
retirado de sua folhas verdes como a servir de bálsamo para sua tristeza.
Ah! Como era gostoso deitar debaixo
do Jequitibá frondoso. Ele e eu nos tornamos grandes amigos. Um dia vi dois
homens da prefeitura dizendo que iam cortá-lo. Impossível! Não podiam. Alegaram
que ela ia cair. Cupins em seu tronco o demonstravam. Chorei muito. Ela não
chorou. Disse-me que já era hora de partir. Ela estava cansada, precisava de
uma nova morada para descansar dos trezentos anos que viveu na terra. Pediu-me
para tirar uma muda. Tão logo ela se fosse que eu devia plantar um filho seu
ali. Uma tarde vi que ele tinha sido levado. Meu amado Jequitibá partira para
outra vida. Plantei a muda. Com um ano ele já dava sombra. Aos seis anos era um
belo Jequitibá frondoso. Nunca esqueci o velho jequitibá. Quantos sonhos ele me
contou. Durante anos ia lá sempre. Deitava na sombra gostosa e na grama
verdinha macia. Meu Deus! O novo Jequitibá passou a dividir comigo os sonhos de
quem o procuravam! Sou um homem de sorte. Valha-me Deus! Quantos amigos eu fiz,
quantos inimigos não tive. Viver uma vida de felicidade e ser amigo de uma
Árvore dos sonhos me fez renascer por muitos e muitos anos!
O JEQUITIBÁ DE BOCA DO MATO
Imponente veia verde no seio da Guanabara,
ponto magnético na partilha das montanhas,
anúncio imediato das serras fluminenses...
Abraçada à Mãe Terra por tentáculos centenários,
esta árvore de porte inimaginável não é árvore.
Traduziu-se a si mesma de árvore,
com o intuito de melhor ser entendida.
Mais que árvore,
este ser encantado,
encouraçado de uma madeira grossa e bruta,
cuja copa alcança e toca singelamente o céu...
é uma entidade.
Uma manifestação encantada,
viva, múltipla.
Ela é, em si, uma força religiosa.
De uma religião traduzida em madeira,
seiva, raiz, folhagem.
Cuja doutrina despenca do alto
em sementes voadoras,
levando para outras terras
a essência divina que lhe dá forma.
Wellington Lyra