Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

sábado, 23 de março de 2013

A promessa escoteira.



Conversa ao pé do fogo.
A promessa escoteira.
                           
                   Vários fatores são importantes para evitar a rotatividade (entrada e saída de jovens). Um deles acredito ser a Promessa Escoteira, feita talvez sem conhecimento e que muitas vezes não marcam o dia para sempre. Sem tentar modificar ou mesmo influir nos Grupos Escoteiros que realizam a Promessa de forma diferente, ela é ponto preponderante para que o dia seja muito especial para o noviço e que sua permanência seja frutífera por muitos e muitos anos. Seja ele lobinho (a), escoteiro (a) sênior, guia ou pioneiro (a) ou escotista.

                   Deve ser um dia esperado, contado, sonhado, marcado por ele (o (a) noviço (a)). É uma cerimônia individual e não coletiva. Ele é a pessoa mais importante naquele dia. Para isto os escotistas responsáveis devem seguir algumas pequenas regras e não tentar modificá-las sem conhecimento de causa, só porque a situação momentânea assim o exigiu. Acredito e não tenho nenhuma sombra de dúvida que é uma cerimônia da sessão, privada, sem a presença de outras pessoas. A participação é exclusiva para o Chefe do Grupo (Diretor Técnico – não me acostumo com a mudança) e os escotistas da seção. Se houver mais de um pronto para a promessa, esta deve ser realizada em dias diferentes.

                     Entendo que em ocasiões especiais, até dois noviços possam fazer a promessa no mesmo dia, mas um de cada vez. Nunca para economizar tempo fazer simultaneamente. No entanto quando é a entrega de algum certificado, seja de especialidades, de classe ou de tempo no movimento estes sim devem ser realizados com a presença se possível de todo o Grupo Escoteiro. É dia de festa, marcado por alegria e visto por todos para que a motivação seja constante.

                    Aproveito o adendo para afirmar que inclusive a entrega da Insígnia da Madeira deve ser feita com todo o Grupo Escoteiro presente e não em atividades nacionais, distritais e regionais. Está ortoga é importante demais para ser celebrada somente por aqueles que não participaram da vida e do crescimento do interessado em seu habitat natural. Voltando pra a Promessa, pode-se até convidar os pais ou responsáveis e isto é interessante, pois, reforça o orgulho do (a) noviço (a) e claro dos pais, pois vão se orgulhar e muito daquele dia. Não convide autoridades, políticos, a não ser se estão de uma maneira ou de outra ligada na cerimônia. Repito, não é uma cerimônia pública.

                    Não se faz uma promessa sem uma preparação com antecedência. Não importa quem seja. Do Lobinho ao Escotista. Surpresas devem ser para certificados, agradecimentos, elogios, condecorações entre outros. Nunca para uma cerimônia de promessa. Acreditamos que as etapas solicitadas por cada sessão, foram cumpridas. Acreditamos também que no caso dos lobinhos, o responsável já conversou com ele, mostrou sua responsabilidade (lembrar sempre do melhor possível), o que se espera dele, o significado da Promessa e da Lei do Lobinho. O orgulho do uniforme (só veste neste dia), sua manutenção, apresentação, do garbo e finalmente se ele ou ela estão prontos para a Promessa.

                         Tanto nas seções escoteiras, seniores e guias, o caminho é o mesmo, alterando somente a responsabilidade do monitor e da Corte de Honra. Cabe ao monitor preparar o noviço (a), cabe a ele também comunicar ao chefe responsável que está preparado e na reunião da Corte de Honra é apresentado o noviço. Esta aprova colocando no livro de ata o dia e a hora da Cerimônia da Promessa. O Chefe da Seção deve ter uma conversa com o noviço (a), saber se ele entende a Promessa que vai realizar, dos artigos da Lei, que agora passarão a ter outro significado e após aconselhamentos a cerimônia é então realizada. Esta conversa é muito importante e é feita a sós, mostrando que o chefe confia que o jovem ou a jovem esta em perfeita condições para assumir mais esta responsabilidade em sua vida.

                           Lembramos que no caso de adultos as direções nacionais tem norma específica e esta deve ser do conhecimento não só do Chefe do Grupo (o tal de Diretor Técnico - desculpe) como do postulante a escotista. BP era enfático ao dizer que qualquer um pode ingressar em um Grupo Escoteiro, mas ser escoteiro não é para qualquer um (disse em outras palavras). O Espírito Escoteiro, tão delineado e comentado faz parte da iniciação quando da promessa em toda a vida escoteira. A apresentação do (a) noviço (a) no dia da cerimônia é feita pelo primo ou monitor. Apresentado ao chefe da seção dá-se o seu inicio. Forma-se em ferradura e no caso de alcateia pode se escolher em circulo ou não (a critério da sessão.).

                           Muitos escotistas acham que a promessa deve ser repetida pelo jovem e não dita diretamente. Eu fico com a segunda parte. Acho que o jovem deve saber bem a promessa e dizê-la com toda clareza. Isto vai fazer com que o significado seja bem maior. Nesta parte, acho que cada um deve analisar qual é a melhor para a cerimônia. Acredito que o que se diz e como é feito é do conhecimento geral. O responsável pela cerimônia é o chefe da seção. Compete ao chefe do Grupo colocar o lenço, ao chefe da seção o distintivo de promessa um assistente o certificado e ao primo ou monitor o de matilha ou patrulha.

                          O responsável dirigirá breves palavras aos presentes, uma palma escoteira, ou Grito da Tropa ou Grande Uivo. Nunca mais de que 10 ou 15 minutos. Será recebido pela matilha que vai abraçá-lo ou pela patrulha onde será cumprimentado e dado o Grito da Patrulha. Tenho visto promessas de escotistas, que muitas vezes são pegos de surpresa e nem uniforme possuem. Agora com o tal traje fica até difícil motivar um voluntário a ter todos os uniformes principalmente usar o que sua sessão usa. Isto acontece porque o Grupo Escoteiro acredita que nesta cerimônia eles ficarão mais interessados na participação com as seções do grupo. Não acredito nisto.

                        Existem diversos fatores para o abandono do jovem do escotismo. A promessa para mim é como se fosse o aniversário tão esperado. Se este for uma decepção não marca e consequentemente o desanimo vai aparecer aos poucos. Mas se o jovem ou a jovem sabem que aquele dia será só dele ou dela, que ele ou ela se preparou para isto, então a promessa terá um valor enorme na sua vida escoteira. Lembro sempre. Promessas coletivas são para militares ou organizações onde ainda não viram o valor que ela tem por toda a vida de um Escoteiro. Conheço alguns antigos que sempre me dizem – Chefe, aquele dia foi o maior da minha vida. Nunca esqueci e nunca vou esquecer!

sexta-feira, 22 de março de 2013

O dia que perdemos Dona Lurdinha.



Conversa ao pé do fogo.
O dia que perdemos Dona Lurdinha.
(Uma historia baseada em fatos reais)

Eu nunca esqueci a Dona Lurdinha. Baixinha, cabelos pretos curtos, um sorriso encantador, fazia às vezes de uma bibliotecária da biblioteca da prefeitura da nossa cidade. Aprendeu ali. Não tinha feito nenhum curso. Biblioteca pequena, não mais que uns cinco mil livros, mas era onde podíamos fazer nossas pesquisas. Muitos de nós íamos sempre lá; Não só para ler os livros, mas para “paquerar” as meninas do Colégio das Irmãs.  Pessoas próximas a nós muitas vezes não vemos o que ela é, seus sentimentos e se chora e se ri. Ali naqueles quatros paredes Dona Lurdinha só servia para nos entregar os livros. Se depois que saíssemos ela fosse à mesa onde estivemos para limpar e guardar os livros era como se fosse uma obrigação. Aprendemos muito com as pessoas a nos servirem, mas esquecemos de que servir primeiro e ser servido depois faz parte de um bom Escoteiro.

Aluno do Ginásio e Escoteiro eu ia sempre a Biblioteca. Muitas vezes toda a Patrulha. Na Enciclopédia Britânica ou a Barsa devorávamos tudo que se dizia sobre os escoteiros. Dona Lurdinha sempre prestativa com um sorriso. Ela sabia o nome de quase todos nós. Um dia discutimos em Patrulha se BP falecera foi em Nairóbi ou no Quênia. Não sabíamos que um era a capital do outro.  Uma gostosa discussão em Patrulha. Lá fomos nós a biblioteca. Ela veio prontamente a ler para nós tudo sobre o Quênia e sobre Nairóbi. Ouvíamos com atenção. Afinal achávamos que ela tinha todos os livros na mente.

Um dia ao passarmos a porta da biblioteca vimos que ela estava fechada. Escrito em uma folha de papel dizia que Dona Lurdinha falecera. Assustei-me com a noticia. Fomos a casa dela. Uma multidão. Não sabia que era tão querida assim. Disseram que morreu de câncer. Que sofrera muito. Nunca vimos nada. Ela nunca demonstrou para nós sentir dor só nos tratava com bondade e um sorriso. Todos o Grupo Escoteiro foi em peso ao seu funeral. Nunca vi tanta gente no Cemitério como naquele dia. Cantamos para ela a canção da despedida. Como sempre todos chorando. Mas no final uma palma escoteira, um bravo e um arrê com todos os chapéus sendo arremessados para o alto.

Uma semana depois colocaram lá o Senhor Carlito. Não era a mesma coisa. Apesar de educado perdia a calma com qualquer um dos jovens que frequentava a biblioteca. Agora ela andava quase sempre vazia. Entrei lá um dia. Estava uniformizado. A missa que frequentávamos tinha terminado. Olhei para todos os lados, as prateleiras, num canto o Senhor Carlito dormitava. Faltaram as moscas para acompanhá-lo. Deu-me uma enorme saudade de Dona Lurdinha. Lembrei-me de Clarice Lispector que dizia: Atitude é uma pequena coisa que faz a diferença. É isto mesmo. Tem pessoas que fazem a diferença, veja o que o Escritor Manoelzinho da pequena Contagem em Minas escreveu:

“Para se fazer uma obra de arte, não basta apenas ter talento, não basta ter força, não basta ser inteligente, tudo o que fazermos na vida e uma obra de arte, mas para que uma obra de arte por mais simples que seja se torne uma marco para posteridade em nossas vidas devemos executá-la com todo o amor existente em nossos corações porque a nossa vida em si será uma obra de arte que completara e embelezará a vida de quem estiver próximo da gente”.

Era verdade. Dona Lurdinha fazia a diferença. Sem ela a Biblioteca perdeu a graça. Pensavamos diferente. Paquerar as meninas, “mandar” ela pegar um livro tal. Para nós sem saber ela era uma serviçal ali para nos servir. Nunca notamos nada, seu sorriso agora fazia falta, sua maneira leve de andar pela Biblioteca sem fazer barulho como se estivesse andando em um gramado nunca foi observado por nós. Incorporou-se a biblioteca. Dona Lurdinha nunca foi escoteira. Nunca vestiu um uniforme, mas hoje eu a tenho como uma das maiores escoteiras que conheci. Nada melhor para explicar lendo o que disse Claudiana Lerbarch:

“Existem pessoas que de um jeito ou de outro mudam de alguma forma a nossa vida ou até mesmo a nós mesmos. Para isso, não é necessário que elas estejam ao nosso lado sempre, ou convivam conosco, não importa se a vemos todos os dias, ou se praticamente não as vemos, não importa o tempo ou à distância. O que importa é que estas pessoas existem e fazem parte da nossa história.
Essas pessoas geralmente entram na nossa vida por acaso, e com o passar do tempo, aos poucos, dia após dia, elas nos conquistam nos mínimos detalhes, nas coisas mais pequenas”.
Claudiana Lerbarch: 

quinta-feira, 21 de março de 2013

O assombroso Fantasma da sede do Grupo Escoteiro Tapajós. (baseado em um fato real)



Histórias escoteiras.
O assombroso Fantasma da sede do Grupo Escoteiro Tapajós.
(baseado em um fato real)

           Esta historia aconteceu há muito tempo. Lá pelos idos de 1961. Recém-admitido como funcionário da Usiminas conheci mais dois amigos que eram escoteiros em sua cidade de Origem. Carlos e Odair. O primeiro foi Escoteiro da Pátria em Juiz de Fora do Grupo Escoteiro Aimorés do meu grande amigo e falecido Chefe Darcy Malta. O segundo Escoteiro em Muriaé. Tornamo-nos amigos inseparáveis. O escotismo fazia falta. Porque não organizar um grupo? – Surgiu de surpresa. Um amigo de nome Raimundo morava em Senador Melo Viana, na época um distrito de Coronel Fabriciano e acho que ainda é até hoje nos convidou para almoçar em sua casa. Para surpresa o Pároco da Matriz também estava presente. Durante o almoço surgiu à ideia de montar um grupo ali. O Pároco se dispôs a ver as necessidades e providenciar.

             Seis meses depois o Grupo Escoteiro ia de vento em popa. Infelizmente um contratempo aconteceu. O Chefe Odair veio a óbito. Morávamos todos em uma casinha espécie de republica. Uma epopeia levar o falecido em sua cidade. Mas esta é outra historia. Perdemos alem de um grande amigo um excelente corneteiro. Ainda bem que o Grupo Escoteiro cresceu. Tínhamos mais de doze escotistas atuantes e a maiorias já DCBs.  Nossa sede era atrás do cemitério do distrito. Eram três barracões enormes, cujas janelas de fundo davam para toda a área do cemitério. Os três barrocões eram divididos entre as sessões. Um para os lobinhos, um para a tropa e outro para a diretoria e almoxarifado.

             Uma semana após o passamento do Odair o Zé Pontes da diretoria me procurou para avisar que reclamaram com ele da algazarra tremenda que faziam a noite e sempre após a meia noite na sede escoteira. Tocam corneta, bumbos, tambores e taróis Pensei comigo. Só quatro de nós tinham as chaves. Quem seria? – Melhor ir lá para ver. Ir sozinho? Sei que era um homem, durão, Chefe Escoteiro, mas nunca me dei bem com fantasma. Ir lá à meia noite, atravessar uma lateral do cemitério, abrir a porta e entrar e esperar até meia noite para ver a banda tocar estava fora de cogitação. – Carlos vamos nós dois. – Nem pensar, Chame o Zé Pontes, o Nonô ou então o Pároco. Ninguém quis ir. Cada um deu uma desculpa.

            A banda uma ou duas vezes por semana continuava tocando. Escoteiros e lobinhos evitando entrar na sede mesmo durante o dia. A “coisa” estava tomando proporções que poderia prejudicar mesmo a frequência dos meninos. Tinha que ir lá e desmascarar o tal fantasma. Quinta feira, armado de uma boa lanterna esperei dar onze e meia e lá fui. Confesso que tremia um pouco. Ao passar pelo cemitério criei na minha imaginação centenas de fantasmas a me observarem. Onze e cinquenta lá estava eu na porta do almoxarifado. Um silêncio de morte. Juntei todas as minhas formas e entrei. Um “besta” que sou fechei a porta comigo dentro. Porque fiz isto? Não sei. Sentei em uma cadeira em volta de uma escrivania. O silencio era total. Já estava respirando melhor. Acho que não tinha nada. O povo inventa!

               Levantei, acendi a lanterna e passeei com o facho de luz por toda a sala. Maldita sala! Uma corneta estava suspensa no ar. Outra tocou a toda no meu ouvido. Um berro da corneta e um meu. Larguei a lanterna e corri para a porta. Um custo para abrir. Bombo, tambor e corneta tocavam no meu ouvido. Gritava e berrava como um louco. A porta abriu. Sai correndo em desabalada carreira. As calças toda molhada. Senti algum mais que não vou dizer aqui. Fui direto ao Pároco. Ele dormia. O acordei. – O Senhor vai comigo – Chefe Osvaldo é impressão sua. – Vamos lá, não é o homem de Deus? – Lá fomos eu e ele. Vi que ele sorria, queria mostrar uma força que não tinha. Entramos, silencio. Ele me olhou – Tá vendo? Não tem nada. Uma corneta berrou alto no seu ouvido. – Ele gritou – Louvado meu Senhor Jesus Cristo. Me socorre.  Nem me olhou sumiu na porta na minha frente.

                No dia seguinte ele e mais diversos coroinhas e todas as Filhas de Maria, sem contar os Vicentinos lá estavam na sede para exorcizar ou sei lá o que ele fazia. Rezaram, cantaram e foram embora. Acho que deu certo. Os barulhos sumiram. Joguei a calça que usei naquele dia fora. Não dava nem para lavar. Até hoje não sei se foi o espírito do Odair. Ele nunca me disse nada. Uma semana depois fui pegar um guarda chuva em cima do guarda roupa na república que morávamos. Chovia a cântaros. Trovejava. Relâmpagos no céu. Carlos trabalhando de zero hora. (turnos alternados). Estava sozinho em casa. Subi em uma cadeira. Meu Deus! A dentadura do Odair aberta como se estivesse rindo para mim! (ele tinha dentadura). Cai da cadeira estatelado no chão. De novo correndo até o bar do Zaqueu. Melhor ficar ali até as madrugadas tomando umas e outra. Voltar para a casa? Vai ser difícil.

Final: - Um ano depois a convite montamos uma Tropa Escoteira na Paróquia de Coronel Fabriciano a convite do padre local. Hoje Bispo. Don Lara. Grade Chefe! – Sai da Usiminas, passei anos sem voltar lá. Hoje o Tapajós existe em Coronel Fabriciano. Um grande grupo. Orgulho da cidade.
Afinal são histórias. Acreditem se quiserem. Ainda guardo lembranças do Carlos do Odair e de tantos outros. Valeu uma época. Valeu uma vida!

quarta-feira, 20 de março de 2013

A verdade de todos nós – O Uniforme Escoteiro.



Conversa ao pé do fogo.
A verdade de todos nós – O Uniforme Escoteiro.

                 Como lobinho, Escoteiro, Sênior e Chefe no passado eu fui de outra escola. Uma escola de disciplina impecável em tudo que fazíamos. Na apresentação, no modo de proceder em público, no modo de falar e vestir. Nosso uniforme era motivo de orgulho. Nenhum Chefe abria exceção ou dava folga. Afinal diziam eles - Cada um de vocês está representando o movimento Escoteiro e os que nos veem não querem saber se somos novos ou antigos. Basta um para que toda a organização tenha a pecha de desorganizada. Alguns com apenas um olhar pode nos achar um movimento desleixado, sem orgulho, e nunca irão falar bem de nós. Costumo dizer que deveríamos dizer aos nossos amigos e professores o que acham de nós. Sabe o que dirão? Sabem sim. Não preciso repetir.

                  Lembro com saudades que havia uma norma para todo o uniforme. Chapéu de abas largas com as abas retas, bem retas. Para isto quando não fossemos usar ele ficaria em casa preso em uma armação de madeira. O lenço? Muito bem dobrado e só a moda escoteira. Preso a boca e as duas pontas mais largas seguras pelos dedos de cada mão. Os dedos é que enrolavam lenço. A parte de trás com o tamanho do polegar e o indicador esticado.  Difícil? Não. Era só treinar. A postura do lenço era perfeita. Em cima do colarinho com as laterais se encontrando junto ao anel. A camisa bem passada e por DENTRO DA CALÇA! Esta era no Maximo cinco dedos acima do joelho. O meião? Perfeito listas perfeitas sem ficarem tortas. Calçado? Preto! Tente usar outro para ver. Na época sapatos e depois tênis. Obrigatório todos terem um pequeno pente e um lenço de bolso. Ah! Um Chefe sempre quando nos encontrava ou um Escoteiro mais antigo sempre perguntava: - Em qual bolso está sua moeda da boa ação?
Esquerdo parabéns. Direito? Só bronca.

                     As inspeções eram rigorosas. Tinha aquelas que já sabíamos a hora e lugar, mas havia outras de surpresa. Poderão dizer – Militarismo? Nunca pensei assim. Acredito que era uma forma de disciplina para uma boa apresentação. Ainda fazíamos um sinal de cabeça para as mulheres e os mais velhos. Sempre tinham a preferência de lugares e até em filas. Portas? Fazíamos questão de abri-las para elas e os mais velhos. Hoje? Dão risada quando comentamos, mas o respeito, o garbo e a boa ordem era o orgulho de qualquer Escoteiro. Uma época onde se dizia Senhor, pois não, muito obrigado, bom dia e boa tarde.

                    Estamos fazendo marketing para atrair mais jovens e adultos nas fileiras escoteiras. Vejam aqui no Facebook. Fotos de jovens e adultos com todos os tipos de uniforme. Cada um se apresentando de uma maneira totalmente descabida. Claro na visão de um adulto como eu e muitos outros. Sei que eles não pensam assim. Ainda bem que tem uma maioria que dão exemplo. Seu garbo e apresentação nos dá orgulho de ser Escoteiro. Eu nunca abri mão da boa uniformização. Como lutei com todas as minhas forças para fazer o meu, dei enorme valor. Nada de graça. Nada de presente. E hoje? Os jovens vão à luta para conseguir o seu uniforme e apetrechos ou ficam reclamando que tudo é caro? Minha cidade ficava a mais de mil quilômetros da sede nacional único lugar de conseguir um chapéu e um cinto. Meu pai era sapateiro. Juntei tostão por tostão e consegui.

                   Na década de oitenta participei como Diretor Técnico (Chefe de Grupo) de um grupo em São Paulo. A maioria dos participantes jovens humildes de famílias pobres. Facilitei o uniforme? Reclamei ou induzi para o tal traje que fizeram para aqueles que não podem comprar, mas é usado pelos mais abastados? Nunca faria isto. Todos lutaram e conseguiram o seu. Nosso caqui era uma tradição. Assim éramos conhecidos. Tornou-se um hábito de comportamento que agora está sendo levado como poeira para o mar com tantas mudanças. Lembro que diversas vezes antes do cerimonial chamava um ou dois em particular – Veio sem o meião? Chefe, não achei ou estava lavando! – Certo, vá para casa, tire as peças, pois você sem o meião não está uniformizado e dá mau exemplo. Volte com roupa civil. Assim todos não irão criticar você e achar que todo o movimento é assim, sem garbo e boa ordem!

                  Errado? Errado são os chefes que dão mau exemplo, portando de maneira inconveniente, falando palavrões sem necessidade, vestido peças que não existem, colocando coberturas que foram tiradas de sua imaginação. Não sou a favor do que o POR descreve hoje pela uniformização, mas se pelo menos todos seguissem suas normas seriamos vistos como um movimento responsável, sério, e que aos olhares do publico seriamos vistos como um movimento sério e nos veriam com bons olhos e claro acreditando que o escotismo é um exemplo para a sociedade. Podem até dizer que vem aí mais um uniforme. Que é bonito bem feito e que dura mais. E daí? Dezenas de anos de um que já era conhecido, um hábito de comportamento para o público e agora começar tudo de novo? Quantos irão gastar para comprá-lo? Ver alguém da tropa usando e o outro não? Um pode comprar o outro não? Escotismo é só para ricos? – Uma má hora para lançar um novo uniforme. Nada do que dirão irá me convencer.

                  Melhor parar por aqui. Muitos não concordam. Da ultima vez que comentei dezenas de bons samaritanos escoteiros fizeram questão de me contradizer. Paciência. Não me venham dizer que hoje tudo é moderno. Se ser desleixado, mal uniformizado, exemplos de falta de garbo e orgulho do que se veste é ser moderno, pobre do escotismo. Péssimo exemplo para a sociedade. Não é o que eu desejaria para meus netos!

terça-feira, 19 de março de 2013

Cursos Técnicos. Vale a pena?



Conversa ao pé do fogo.
Cursos Técnicos. Vale a pena?

“A maior ameaça a uma democracia é o homem que não quer pensar pôr si mesmo e não quer aprender a pensar logicamente em linha reta, tal como aprendeu a andar em linha reta”. A democracia pode salvar o mundo, porém jamais será salva enquanto os preguiçosos mentais não forem salvos de si mesmos. Eles não querem pensar, desejam apenas ir para frente, seguindo a ponta do nariz através da vida. E geralmente, estes, alguém os guia puxando-os pelo nariz!
- Saia da sua estreita rotina se quer alargar sua mente.
Baden Powell.

    Outro dia vi um comentário de uma Chefe sobre um curso técnico de Arte Mateira que fez e mostrando as fotos. Senti sem estar junto a ela o seu sorriso estampado no rosto. Pensei comigo, que falta fazem estes cursos hoje em dia. Deviam ter uma procura imensa por parte dos nossos Escotistas. Quando vemos tropas em atividade ao livre fazendo tais atividades sinto que ali está a verdadeira essência do escotismo. Infelizmente não é isto que vemos sempre. Fico triste quando vejo uma tropa tentando passar em uma Falsa Baiana feita pelo Chefe, ali junto ao jovem como a pensar que ele pode cair. Um por um. Os demais fazem o que? Sistema de Patrulhas? Não seria melhor dar uma corda para cada Patrulha e dizer – Façam vocês mesmo. Depois um jogo com todas tentando atravessar?  Que façam mal feito. Não é isto que diz nosso método? Por isto acho válido os cursos técnicos.

Sempre ouço dizer que nosso movimento pretende a formação e o adestramento de lideres. Não só dos chefes como dos jovens. Fazendo isto iremos fornecer não só a boa cidadania, iniciativa e desenvolvimento de suas potencialidades físicas mentais e espirituais. Se as atividades ao ar livre fosse como pensou BP a procura seria grande e a evasão iria diminuir. Infelizmente sem querer ofender a quem quer que seja, temos uma grande maioria de Escotistas-não-formados atuando como amadores. Esquecem que nosso Movimento é uma fraternidade livremente aceita, não tem caráter de obrigação e aí vem à parte mais importante. – O adulto só atua com supervisão. Se Isto é feito, se o jovem participa de uma sequencia de atividades adaptadas a sua idade, exercitadas é claro ao ar livre, e assim ajudando uns aos outros, não se esquecendo de confiar-lhes responsabilidades temos certeza que seu caráter será modificado. Bons programas para o jovem faz com que ele aprenda a cooperar e liderar.

Chamam-nos de saudosistas, mas vejam que a rápida expansão do Movimento Escoteiro durante os primeiros anos, foi devido ao método novo de educação, que se apresentava de uma maneira simples e que atraia os jovens pela sua simplicidade. Recorria a uma linguagem fácil, muito afastada dos termos técnicos utilizados no mundo pedagógico e sociológico de hoje. Dizem alguns e eu confirmo que talvez seja esse um dos motivos para não citarem Baden Powell ou o Escotismo como fonte originária dessas ideias e técnicas. Nosso movimento tem uma finalidade tão séria que exige em alguns casos uma abordagem de qualidade profissional.

Acredito que vocês sabem que nos países avançados, a prática da demonstração e a da descoberta, às atividades ao ar livre, a aprendizagem em pequenos grupos de fazer para aprender, são técnicas escoteiras que conhecemos de outra maneira. Por nossa culpa e pela repetição pura e simples destas técnicas, dos jogos e até a ausência do método nas atividades praticas da tropa, trouxe aos olhos do público um desinteresse e em alguns casos alguns educadores nos consideram um Movimento excessivamente infantil e nos domínios da educação somos vistos como atrasados e ineficaz.

 Como isto acontece e as autoridades educativas não tem levado a sério o Escotismo e não nos considera como um importante meio para completar a educação. Precisamos com urgência concentrar nossos esforços não só na seleção e formação dos chefes. Não se nasce líder, mas é possível formar e adestrar um líder. Isto leva mais que algumas semanas para ingerir informações e conhecimentos. Meses para desenvolver a competência e anos para que esta competência se torne um hábito de comportamento. Acredito e sei que é evidente que o homem tem necessidade de direção e orientação, mas não é porque tem nos faltados recursos e sim imaginação. 
  
     - Quando BP reuniu em 1907 na ilha de Brownsea na Inglaterra 20 jovens de diferentes meios socioeconômicos e educativos, ele trouxe uma enorme contribuição educacional que, na época estava estagnado. Assim o Escotismo veio dar uma visão mais abrangente às escolas e estas é que estão tirando partido das técnicas escoteiras de demonstração, observação e dedução, aplicando-as às suas classes. Às técnicas de aprender fazendo e tentar fazer sem saber, até descobrir o certo através do erro, sempre foram partes do método Escoteiro. Confiar no rapaz para que ele próprio seja responsável pela sua auto-educação e disciplina sempre fez parte do Escotismo. Dar liberdade ao espírito de competição e da aventura, através de jogos, acampamentos e excursões. Este é o Programa Escoteiro e que bem realizado se mantém na liderança das técnicas até hoje empregadas.

Tudo isto se resume em aprender, se adestrar, conhecer e claro, fazer um escotismo gostoso, divertido e com simplicidade. Se cada um se conscientizar de sua responsabilidade e tentando aprender nestes cursos técnicos, procurando junto aos seus monitores aprenderem mais mutuamente, dando  eles liberdade de ação então é claro que nossos objetivos poderão ser alcançados. Vamos então aprender e deixar que os jovens remem sua própria canoa. Nosso papel é de orientação e mais nada. Pensem sobre isto! 

segunda-feira, 18 de março de 2013

Carta prego para lobos existem?



Conversa ao pé do fogo.
Carta prego para lobos existem?

               Claro que sim. Afinal a Carta Prego não é um meio de atingir a formação do jovem no seu livro arbítrio? Tomadas de decisões? Não deseja ela colaborar na formação e desenvolvimento da liderança? E claro, ela não colabora no desejo de participar em equipe, respeitar e ser mais um? Portanto a carta prego tem grande validade para atingir os objetivos a que se propõe. Enquanto na tropa ou nos seniores a confiança é maior, com liberdade irrestrita de ação, nos lobos deve ter outros critérios principalmente no local onde seria desenvolvida a carta prego. Vamos antes discutir um pouco o tema.

             - Uma Carta Prego com lobos poderia ser realizado em um bosque, um sitio parque ou uma praça. Ou mesmo nas proximidades da sede. Sem a presença dos chefes se não a validade deixa de existir. Temos  que mostrar confiança na Matilha. Sem isto ela a carta não teria valor. Mas como a idade ainda não tem a maturidade necessária é preciso se cercar dos cuidados necessários. Pensemos que as matilhas já foram suficientemente alertadas, treinadas e aconselhadas quando a atuação em equipe e disciplina. Obedecer ordens, manter a Matilha unida, obedecer ao primo, e claro, que as etapas a serem desenvolvidas na Carta Prego tenham sido treinadas (gosto muito de dizer adestradas, mas é um termo agora tabu no escotismo). Lembramos que antes da execução um ou dois conselhos de primos foram realizados. Ops! Nada de tentar realizar ali um sistema de patrulhas, mas acho e insisto que os lobos devem se preparar para isto. Afinal um dia serão escoteiros e irão viver em patrulhas. Matilhas seguem suas pegadas e se assim o for facilita sobejamente o trabalho dos dirigentes da alcateia.

                    - Pensemos em uma Carta Prego com duração de pelo menos cinco ou seis horas. É possível? Claro que sim. Se todos os cuidados forem tomados o sucesso é garantido. Meu exemplo aqui descrito pode e deve ser modificado se assim a chefia da alcateia quiser. Antes faça uma pequena Carta Prego, em volta da sede, com instruções simples tais como – Abrir as xs horas, encontrar alguém que já foi Escoteiro, qual o nome da loja ou bar mais próximo da sede, quais os ônibus que passam próximo e seu destino etc. Cada Matilha recebe a sua carta, abrir em determinado local e cumprir as instruções. Devem estar na porta da sede às tantas horas. A chefia espalhada observando sem se intrometer. Uma vez combinei um sinal de alerta. Significava que quem precisasse do Chefe, bastava tirar o lenço e girar em cima da cabeça. Claro, se fosse uma chamada inútil a Matilha perdia ponto. (lembramos que sempre haverá um adulto responsável por perto, mas mantendo-se invisível).

        - Agora os lobos estão prontos. A confiança foi criada. Escolher o local próximo à sede ou de fácil transporte. Matilhas em ônibus sós? Risos. Claro, porque não? Tem uma mãe ou um pai no ponto que vai embarcar também sem eles saberem. Na porta do local escolhido a cada cem ou duzentos metros mais um pai e mãe observando. Pelo amor de Deus! Sem interferir a não ser em grande sinal de perigo. (cuidado com mães que querem fazer tudo pelos filhos) As matilhas tem instruções expressas para abrir a Carta Prego em horário determinado no envelope. As instruções são simples e diretas. Primeiro, a Matilha tem de andar sempre junta, caso contrário perde pontos (quem sabe uma caixa de bombons como premio?) agora o que fazer? A) próximo a casa x, tem uma senhora ou Senhor de roupa verde, vão até lá, quando chegarem perto, parem. Ela vai jogar para cima vários objetos. Prestem atenção. Quando ela terminar, sentem em uma sombra e tentem lembrar os objetos.

E assim as instruções vão sendo dadas. É fácil criar conhecendo o local. Sede? Cada um pode levar na sacola ou mochila um cantil ou similar de plástico. Lanche? (Na Carta Prego tem o horário que a Matilha deve procurar um lugar e lanchar (chefes fiquem distantes, deixe eles se refestelarem sozinhos)). È Difícil dizer aqui quais as instruções a serem colocadas na Carta. Pelos menos umas seis. Lembrem-se cada Matilha começa no local diferente da outra para não ficarem juntas. Perdem ponto aquela que se aproximar mais. Se fosse eu, treinaria um pouco de bussola. (ensinar na sede antes) É preciso ter uma para cada Matilha. Quem sabe os cardeais e colaterais somente? – Sigam 50 passos a norte. Depois 80 passos a nordeste e assim sucessivamente. Escrevam o que vão avistando na jornada. Seria bom que todas as instruções fossem mateiras. Outras já devem fazer sempre nas reuniões de sede e os lobos não acharão graça. 

A última instrução é achar os chefes em local determinado. Claro que os chefes, as mães, pais auxiliares estarão sempre em volta. Não esqueçam de pensar no material que eles irão precisar para desenvolver as tarefas. Por exemplo, caderno, lápis, bússola, cabo, seis pedaços de sisal para nós, (se tiver uma tarefa assim) e outros necessários para desenvolver as provas que julgarem necessárias colocar.  Mas lembrem-se, é uma diversão. Um primeiro passo, fazer fazendo. Aprender errando e repetir até fazer o certo. Chefes? Pais? Ótimo. Distantes de olhos bem abertos. Ah! Esqueci! Não esqueçam da lei do lobinho. E claro os chefes também. Abrir os olhos e os ouvidos. Estar sempre alegre. Que bom é um sorriso né?

Agora mãos a obra. Chamem os chefes da Alcateia. Conversem, troquem ideias, e façam o programa. A escrita na carta deve ser a mão. Nada de PC/Word. Legível. E lembrem-se, se os lobos comprarem a ideia seria bom que as matilhas em separado dessem sugestões para uma boa Carta Prego. Uma vez eu discuti com todos eles em uma Roca ou Pedra do Conselho. Todos aprenderam a ouvir e sugerir. A Carta tem de ser interessante. Não mais que cinco ou seis horas se não perde o interesse. Isto também deve ser observado durante a realização da Carta Prego.

Chega. Agora é com vocês. Claro os que acharam validas estas sugestões. Os contrários estarão desculpados. Não levarei suas almas comigo para o campo santo. Risos. Boa e excelente CARTA PREGO!

Obs. Duvidas ou maiores esclarecimentos – Chefe Osvaldo – elioso@terra.com.br

domingo, 17 de março de 2013

Gloria feita de sangue. A última Luta de Manuelito.



Atenção! Se você tem coração fraco, não leia esta história. Pode se emocionar demais.

As mais lindas histórias escoteiras.
Gloria feita de sangue. A última Luta de Manuelito.

                      Não dá para esquecer, foi no último verão de sessenta e um. As chuvas de Santo Inácio que todos esperavam não aconteceram como o previsto e ali, a beira da Lagoa do Lagarto, o fogo de conselho já havia terminado. A escoteirada já se recolhera. Aqui e ali a fogueira ainda se esforçava para mandar aos céus uma ou outra fagulha brilhante. Todos já haviam se recolhido e eu resolvi ficar. Panchito me fazia companhia. Bom amigo. Conhecemos-nos em Aguascalientes no sul do México em cinquenta e oito. Ele já morava no Brasil há vinte anos, mas seus pais residiam nesta cidade e ele a cada cinco anos voltava para fazer uma visita. O motivo porque estava em Aguascalientes fica para outra história. Deitamos a beira da lagoa sobre uma lona leve e admirávamos o vai e vem dos cometas e satélites que giravam em torno da terra a grandes velocidades. Já sentia o orvalho da madrugada se aproximando quando vi que Panchito chorava baixinho. – O que foi? Perguntei. Olhe Chefe, sempre quando me lembro de Manuelito meu coração bate forte.

                      Deixei que ele se acalmasse e foi assim que ele me contou toda a história de Manuelito. – Era um jovem de seus doze anos. Magro, raquítico, tamanho normal para sua idade. Cabelos loiros, olhos negros fundos, nariz afilado estava na tropa havia oito meses. Falava pouco e ficamos amigos. Assim como ele eu também era da Corvo. O Gentil era o Monitor. Ótima pessoa. Tudo começou quando Gentil comentou que na Corte de Honra foi discutido a data do próximo Grande Desafio. Nos últimos três anos sempre foram realizados. Nunca fiquei sabendo como tudo começou. Toda a tropa só comentava a vinda de mais três tropas de cidades vizinhas. Ia ser um espetáculo a parte as disputas naquele ano. Seriam realizadas no Estádio do Azulão Futebol clube, pois no ano anterior houve grande aglomeração de pessoas no campinho de pelada em frente à sede prejudicando em parte a visão de todos. – Não estava entendendo, mas deixei que Panchito continuasse sua narrativa. – Chefe, precisava ver o olhar de Manuelito quando disse que o primeiro lugar ganharia uma Faca Suíça e um Cantil do Exército. Nunca o vi sorrir daquele jeito. – Fiquei com pena. Manuelito não tinha a mínima condição de chegar as finais.

                  - Sabe Chefe quando conto esta história para alguém, dão risadas. – Uma simples briga de galo? – Mas isto se faz em todas as tropas a século! Mas Chefe, conosco era diferente. Havia uma técnica própria. Cheguei a ver em um ano dois contendores ficarem uma hora e meia lutando. Vi tantas lutas que eu mesmo desisti, pois nunca cheguei além do nono lugar. Manuelito não. Perguntou-me a data, como ia ser a seleção e se todos podiam se inscrever. – Disse a ele tudo que perguntou e mais alem, disse também que ele nunca tinha lutado. Pediu-me que mostrasse como se luta. Ficamos uma hora lutando. Ele mal se matinha em pé. Caia sempre. Desistir? Jamais. Manuelito sonhava com a Faca Suíça. Só falava nela. Queria ter uma e sabia que nunca poderia comprar. Uma semana antes da seleção, que seria feita com todas as patrulhas por duplas Manuelito disse que estava preparado.

                     - Chefe, Manuelito estudou tudo. Desenhou. Treinou horas e horas em sua casa a ficar parado ou pulando em um só pé. Suas mãos as costas pareciam aço. Não se soltavam. Sabia fazer com perfeição uma Asa Direita ou esquerda (cotovelos em forma de V). O Joelho do Papagaio aprendeu rápido. Mas era magro, respirava com dificuldade e mesmo assim se mostrou um valente. O primeiro, segundo e terceiro lugar já tinham dono. Neco, Lastimer e Juventino eram os melhores. O quarto lugar foi disputado com galhardia. Manuelito a muito custo conseguiu o quarto lugar. O Chefe Wantuil não acreditava no que via. Ele ficou preocupado. O corpo de Manuelito não foi feito para aquele tipo de luta. Tentou falar com seus pais que sempre arredios não iam à sede. Desistiu e deixou que Manuelito participasse. Arrependeu-se muito depois. O grande dia chegou. Centenas de pessoas já estavam alojadas nas arquibancadas. Poderia jurar que ali no inicio do Grande Desafio tinha mais de três mil pessoas. Os parentes e vizinhos das outras três cidades compareceram em peso.

                       Chico Nonato o comissário distrital abriu a competição. Chamou um a um os dezesseis finalistas gritando alto seus nomes e conquistas escoteiras. Quatro por tropa. Formaram em linha. Todos parrudos, fortões e Manuelito se destacava pela sua magreza. Nas arquibancadas gritavam – Tira o magrelo! Tira o minhoca! Ele de cabeça baixa não se incomodava. Sonhava com a Faca Suíça. Ele sabia que não poderia ficar lutando por muito tempo. Sabia o que tinha internamente e se ele brotasse em seu estomago iria ser levado à boca e aí não ia ser fácil. Seria desqualificado na hora. Isto não poderia acontecer! – Não foi difícil para Manuelito chegar as quartas de finais. Aprendeu e treinou dias e dias a rodopiar com seu Joelho do Papagaio e deixava que os outros pulassem sobre ele. A Joelhada era fatal. Ninguém acreditava no que via. Ficaram quatro competidores finais. Ele ia lutar com um dos campeões do passado. Matusalém era famoso. Quando ele olhou para Manuelito sorriu. – Este está no papo. - Não quer desistir? Perguntou. Uma hora de luta. Sempre Manuelito se esquivando. Manuelito o sentiu no estomago. Deus! Deus meu! Não deixe que suba! Ajude-me. Eu preciso desta Faca Suíça! E meu sonho meu Deus!

                       Ganhou para espanto de todos. Sentiu que suas pernas e suas entranhas não aguentariam a final. Botelho Papa Léguas era o finalista da Tropa de Jaguatiruna. As apostas perdiam a graça. Ninguém apostava em Manuelito. Eram trinta por um e à medida que ele vencia caia. Agora estava em dez por um. Um silêncio enorme e a luta de morte começou. Ambos se estudando. Botelho Papas Léguas não subestimou Manuelito. Se ele chegou até ali é porque era bom. Viu uma brecha, viu os olhos de Manuelito piscando e se fechando. Deu oito saldo longos e pegou Manuelito de jeito com a asa direita. Manuelito conseguiu se esquivar, mas a esquerda roçou com força seu olho direito. Uma dor incrível! Manuelito quase perdeu o equilíbrio. Não iria aguentar outra. O sangue agora estava enchendo sua boca. A hemorragia que seu pai sempre falava estava chegando. Sabia que uma ou duas veias tinham partido. Se não parasse iria morrer.

                        Não podia, não podia parar! Meu Deus me ajude! Dê-me mais uns minutos, daria minha vida para ter esta Faca Escoteira!  Botelho Papa Léguas não sentiu piedade. Ele também queria ser o campeão do torneio. Nunca tinha ganhado. Entrara para o escotismo pelo premio e claro pela fama. Afinal perder para aquele escoteirinho de nada? Raquítico, pequeno, e agora chorando? Sim Manuelito tinha os olhos cheios d’água. A asa esquerda o pegou de jeito entre os olhos. O sangue quente na boca. Firmou os lábios. Tentou engolir. Não deu. Não iria soltar o sangue na grama verde. Seria desqualificado! Pulou uma duas vezes. Fez um sinal para Botelho Papa Léguas como a dizer – Venha moleza! Botelho Papa Léguas não se fez de rogado. Pulando com uma rapidez incrível preparo sua asa direita para liquidar logo esta contenda. Infelizmente ele sabia que Manuelito ia se estatelar no chão. Mas não podia ter pena nem dó e nem piedade. Como dizia sua Avó, jogo é jogado e lambari é pescado.

                        Manuelito viu num relance o que Botelho Papa Léguas ia fazer. Sabia que não podia desviar muito. Se pulasse o sangue ia jorrar de sua boca. Ele sentia mais e mais a pressão do sangue subindo goela acima. Uma dor incrível no cérebro, o corpo tremendo. Esperou. Faca Suíça! Não vou perder você. Deus vai me dar forças! Manuelito esperou até que Botelho Papa Léguas se virasse e novamente usasse a lateral esquerda para lhe bater a toda no seu ombro com a Asa Direita. Quando sentiu o hálito quente da respiração de Botelho Papa Léguas, Manuelito abaixou e levantou de uma vez. Pegou Botelho Papa Léguas desprevenido. Ninguém esperava que ele usasse este truque. Velho conhecido de todos. O vai e vem do corpo subindo e descendo. Botelho Papa Léguas perdeu o equilíbrio. Nas arquibancadas um murmúrio alto. Todos ficaram em pé. Não acreditavam no que viam. Todos só viram Botelho Papa Léguas se esparramar pelo chão. Os apostadores não acreditavam na cena estática que se apresentava. Eram dez por um. Impossível diziam.

                  Manuelito se equilibrou ainda na perna direita por alguns segundos. Suas mãos se soltaram e foram forçadas no ventre como a querer interromper o sangue que agora saia aos borbotões dos seus lábios. Não dava para segurar mais. Rodopiou em si mesmo e caiu esparramado no chão gemendo alto e querendo sorrir. Afinal ele ganhou a luta. A Faca Suíça era sua! O sangue vermelho se misturou ao verde da grama. Um colorido sem graça. Vários chefes acorreram. Viram Manuelito com enorme hemorragia interna. Desmaiado. A morte parecia que ia chegar. Um carro apareceu no campo. Ele foi transportado para o hospital da cidade. Uma semana depois souberam que ainda estava na UTI. Perdera muito sangue. Precisava ir para a Capital. Seus pais choravam, mas não condenaram o filho. Se ele morrer foi porque sabia que seu sonho seria maior que a morte!

                   Seis meses depois em uma tarde de agosto bolorenta, um sol preguiçoso no céu Manuelito apareceu na sede em uma cadeira de rodas uniformizado. A tropa parou espantada. Ele sorria, um sorriso tênue como se o sol ali como ele estivesse esperando para levá-lo. Seu pai estava junto. Disse que ele insistiu em vir. Queria receber a Faca Suíça dos seus sonhos. O Chefe Wantuil foi até sua casa e voltou com ela. Todo o grupo se formou. Honra ao mérito ao escoteirinho herói. Como bons escoteiros todos prestaram continência em posição de sentido a Manuelito. Pediu que eu entregasse a ele a faca e colocasse no seu cinto do lado direito. Uma honra para mim Chefe! Um Anrê foi dado. Uma explosão de alegria em todos os presentes. Um exemplo para ser lembrado por toda a vida.

                  Manuelito ainda viveu mais um ano. Morreu com treze anos. Só então ficamos sabendo que ele era tuberculoso. Sua família também. Uma época em que a medicina não tinha cura nestes casos.  Seu pai sabia, mas como tantos outros escondiam, pois ele tinha exemplos de pessoas portadoras de tuberculose que foram defenestrados pela sociedade. Eram párias abandonados à própria sorte.  Uma semana antes de morrer, Manuelito me pediu que quando fosse para o Campo Santo, que a Faca Suíça estivesse no cinto, pois queria estar uniformizado. Chefe, meu Deus! Quanta tristeza. Milhares de gente ali em volta da sua ultima morada chorando. Eu Chefe, era o que mais chorava. Não sabia como enfrentar tudo daí para frente. Ate hoje ainda vou lá visitá-lo. Falo com ele sempre. Sei que ele não está ali, mas isto alivia minha dor e me conforta.

                 Panchito se levantou. Chorava copiosamente. Desculpe Chefe. Desculpe. Melhor é ir para minha barraca. E lá foi ele me deixando ali a beira daquela lagoa cinzenta, ao lado de uma fogueira apagada, só cinzas e um orvalho caindo e molhando minhas faces. Vi que as minhas lágrimas também se misturavam ao doce orvalho do amanhecer. Uma bruma cinzenta pairava sobre a lagoa. Pensei em ir dormir e ir para minha barraca. Não fui. Sentei a moda índia e fiquei ali até o amanhecer de olhar fixo no horizonte, acima da Lagoa do Lagarto. Não houve sol aquele dia. Uma chuva leve e intermitente começou a cair. Um peixinho pulou sobre as águas cinzentas da lagoa. Minha mente voltava ao passado. Manuelito, um sonho realizado. Uma morte honrosa. Um menino que foi homem para aceitar o seu maior desafio. Uma luta sem gloria. Ou melhor, Gloria feita de Sangue!