Quinto Fascículo
A maior ameaça a uma democracia é o homem que não quer pensar
pôr si mesmo e não quer aprender a pensar logicamente em linha reta, tal como
aprendeu a andar em linha reta. A democracia pode salvar o mundo,
Porém jamais será salva enquanto os preguiçosos mentais não
forem salvos de si mesmos.
Eles não querem pensar, desejam apenas ir para frente, seguindo
a ponta do nariz através da vida. E geralmente, estes, alguém os guia
puxando-os pelo nariz!
- Saia da sua estreita rotina se quer alargar sua mente.
Baden Powell (BP)
Métodos e Programas do Escotismo
Da varanda da casa do “Velho” e através da
cerca de madeira "caiada" de branco, podíamos avistar a rua sem
nenhum movimento. Aqui e ali, os vizinhos também procuravam às áreas frescas,
pois fizera um calor insuportável naquela tarde de março. Agora, o sol estava
se pondo no horizonte e uma brisa leve e fresca vinda do leste, soprava em
nossa direção. A criançada aproveitara às benesses dos pais com seus olhos
havidos ali presentes, para brincarem seus folguedos nos passeios e jardins,
dando um colorido todo especial em nossa conversa que já se arrastara há horas.
Era domingo e domingo era o dia em que
passava minhas tardes com o “Velho”. Minha esposa quase nunca participava, mas não
me criticava pela presença. Ela também gostava do “Velho” e da Vovó. De vez em
quando aparecia um ou outro amigo ou membro do Grupo, mas naquele dia estávamos
somente os três. - O “Velho” como não podia deixar de ser, parava a conversa de
vez em quando, para ouvir com maior atenção não só a algazarra dos jovens como
o som de uma ópera clássica ou mesmo às velhas musica escoteiras dos seus
discos já gastos com o tempo cujos sons vinham através da janela, de uma vitrola
antiga, mas que funcionava divinamente.
Vovó num esforço concentrado estava lendo
um livro e transportada para as páginas de sonhos não perguntei pôr educação
qual livro era. Eu e o “Velho” naquele bate papo informal, também nos
esquecíamos de tudo e de todos. De um a outro tema a mudança era rápida. Eu não
tinha nenhum especial e o “Velho" também. Seu cachimbo estava apagado e
dentro do cinzeiro que ganhou ha muito anos de um amigo do exterior, trazia no
bojo a foto de BP. Com a luta que se trava hoje contra o fumo, era até um
paradoxo ter BP como fundo de cinzas e brasas envenenadas. Mas não era eu que
iria falar para o “Velho”.
- Nosso Movimento dentre outras
necessidades pretende a formação e adestramento de Lideres. - falou o “Velho”.
Isso é claro procurando fornecer aos jovens a boa cidadania, iniciativa e
desenvolvendo suas potencialidades físicas, mentais e espirituais. Em síntese
seria isto que pretendemos, mas como fazer com Escotistas-não formados e
atuando como amadores?
Não entendi o que o “Velho” queria dizer.
Não tínhamos falado nada a este respeito - Fiquei calado. Aguardava o momento
para intervir. Com o “Velho” era assim. Claro que ele apreciava uma boa
discussão. Mas não era nada disso. Era a maneira dele e eu aceitava. Até gostava
de ouvi-lo. Caso contraria não viria visitá-lo sempre.
- Se o nosso Movimento é uma fraternidade
livremente aceita, - continuava o “Velho” - e não tem caráter de obrigação, o
adulto só atua com supervisão. Ele (o Escotismo) pretende fazer com que o jovem
participe de uma sequência de atividades, adaptadas a sua idade, exercitadas
principalmente ao ar livre, ajudando uns aos outros, confiando-lhes
responsabilidade e assim acreditando que seu caráter se afirme. Só assim é
possível que ele se torne também capaz de cooperar e liderar.
- Vejo que você não está entendendo onde
quero chegar. É parte de nossa conversa anterior quando falávamos que hoje
seriam necessários termos profissionais atuando como Escotistas. Não acredito
nisso. Temos um programa simples e que está se complicando pelas alterações
feitas através dos tempos.
- “Velho”, - falei - Se entendi bem,
lembro-me de que a rápida expansão do Movimento Escoteiro durante os primeiros
anos foi devido ao método novo de educação, que se apresentava de uma maneira
simples e que atraia os jovens pela sua própria simplicidade. Recorria a uma
linguagem fácil, muito afastada dos termos técnicos utilizados no mundo
pedagógico e sociológico de hoje. Posso até completar que talvez este seja um
dos motivos para não citarem Baden Powell ou o Escotismo como a fonte
originária dessas ideias e técnicas. Nosso Movimento tem uma finalidade tão
séria, que exige uma abordagem de qualidade profissional.
- O “Velho” gostou da minha intervenção.
Tinha na ponta da língua a resposta, mas suspirou , relaxou, pegou o seu
cachimbo e começou a encher o fornilho, até que soltando belos rolos de fumaça
pelo ar, atraiu os olhares dos vizinhos, que sorriram ao ver o olhar de alegria
e satisfação daquela tragada infernal. Durante segundos, minutos, não sei
quanto, ficou calado como a pensar no que eu dissera.
- Nos países avançados, - quem falava era o
“Velho”. A prática da demonstração e a da descoberta, às atividades ao ar livre
e a aprendizagem em pequenos grupos de fazer para aprender, são técnicas
escoteiras que conhecemos de outra maneira. Aqui, talvez pela repetição pura e
simples dessas técnicas, dos jogos e até a completa ausência do método nas
atividades práticas da tropa, trouxe aos olhos do publico um desinteresse e em
alguns casos alguns educadores nos consideram um Movimento excessivamente
infantil e nos domínios da educação somos vistos como atrasados e ineficazes.
- Mas não seria interessante rever o papel
do Escotista? - falei - Se é esta a situação, se às autoridades educativas não
tem levado a sério o Escotismo e não o considera como importante meio para
completar a educação não teria que concentrar nossos esforços na seleção e
formação dos dirigentes?
Claro! - falou o “Velho”. Não se nasce
líder. Mas é possível formar e adestrar um líder. Isto leva mais do que algumas
semanas para ingerir informações e conhecimentos. Meses para desenvolver a
competência e anos para que esta competência se torne um hábito de
comportamento. É evidente que o homem tem necessidade de direção e orientação,
mas não é porque tem nos faltados recursos e sim imaginação.
- Quando BP reuniu em 1907 na ilha de
Brownsea na Inglaterra 20 jovens de diferentes meios socioeconômicos e
educativos, ele trouxe uma enorme contribuição educacional que, na época estava
estagnado. Assim o Escotismo veio dar uma visão mais abrangente às escolas e
estas é que estão tirando partido das técnicas escoteiras de demonstração,
observação e dedução, aplicando-as às suas classes. Às técnicas de aprender fazendo
e tentar fazer sem saber, até descobrir o certo através do erro, sempre foram
partes do método Escoteiro. Confiar no rapaz para que ele próprio seja
responsável pela sua autoeducação e disciplina sempre fez parte do Escotismo.
Tudo é muito simples. Não é preciso ser um
Super Homem para ser um Chefe Escoteiro. É só dar liberdade ao jovem para que
ele próprio seja responsável pela sua autoeducação e disciplina. Dar liberdade
ao espirito de competição e da aventura, através de jogos, acampamentos e excursões.
Este é o Programa Escoteiro e que bem realizado se mantém na liderança das
técnicas até hoje empregadas.
- Poderia completar - continuava o “Velho” -
Que temos uma base excelente e sem similar para realizar isto: - A Patrulha! -
Ali os jovens podem viver trabalhar e jogar em seu próprio grupo. É simples.
Muito simples. Não precisamos de profissionais nesta área, veja bem.
- Também não precisamos de professores,
pedagogos e outros para fazerem experiências sem conhecimento de causa, mas que
são bem-vindos para participarem desde que de maneira simples e direta. Se conseguirmos fazer com que o jovem
permaneça pelo menos dois anos em atividade, vencemos a batalha. Sejam bem
vindos todos, mas cada um deve se manter dentro do método e programa do Escotismo.
Não venham com aquele blábláblá que conheço de longa data.
- Estamos falhando e falhando feio. Durante
todos estes anos falaram em mudanças, mas a melhor mudança é visitar Grupos
Escoteiros. Nada mudou a não ser nomenclaturas e formas que não trouxeram nada
de proveitoso ao movimento. Lembre-se, os profissionais devem existir, mas em
áreas especificas. Nestas sim, eles são de grande valia.
- Tinha minha duvidas. Ainda me debatia
entre o Chefe profissional e o voluntário. Mas não falei para o “Velho”. - Veja
você - continuou o “Velho” - Qual a diferença desta ária da outra que ouvimos
antes? - Veja a perfeição da orquestra! - Tudo nela flui harmoniosamente. Um
pouco de silêncio agora para podermos sentir dentro de nós a suave melodia.
Musica é a arte de nos expressar pôr meio de sons de uma maneira agradável aos
ouvidos. Agora silêncio pôr favor.
Era assim o “Velho”. De um tema, pulava
para outro. Mas concordava com ele e da melodia que vinha de mansinho entrar em
mim, e fazer esquecer-se de tudo para flutuar no ar com os olhos semicerrados
de uma tarde quente e bolorenta.