Recordações de uma época.
O Pistoleiro do Rio das Velhas.
Nota – Reminiscências de minha passagem como Gerente de uma
Fazenda no Norte de Minas na década de cinquenta onde escoteirei como nunca.
- Não titubeei nenhuma vez. Proposta feita, proposta aceita.
Afinal vivia a vida bela de um escoteiro, me considerava um campista nota dez.
Conhecia pássaros, conhecia animais, sabia a água boa e a má, era bamba em
previsão do tempo, tinha conhecimentos de orientação, faca, machadinha,
pioneirías, porque não aceitar? Amigos disseram que era loucura, outros
disseram me invejar. Telefonei para a Célia que passava férias em Vitória ES
com os filhos na casa da sogra: - Osvaldo, se você acha que vai ser bom para
nós não tenho nada a contradizer!
Admirador nato dos filmes de western de Hollywood, o sonho de
ser um vaqueiro, vaquejar, campear, viver ao ar livre seria um desafio que não
poderia recusar. Meus antigos chefes de Usina Siderúrgica desaconselharam,
disseram que ali eu teria mais futuro. Trabalhava de parede e meia onde
lingotes de aço de toneladas e toneladas passavam para serem produzidos os
futuros tubos sem costura da famosa Mannesmann Alemã. Um calor intenso, um ar
impregnado de minério de ferro e meu sonho de outras terras onde iria respirar
a vida na natureza ao lado de dois rios famosos, (rio das Velhas e São
Francisco) lá vou eu de mala e cuia para minha nova experiência de vida.
Ainda existia o trem noturno de Belo Horizonte para Pirapora. No
trem me sentia um desbravador, um novo pioneiro a desbravar as lindas terras
montanhosas de Minas Gerais. Ninguém a me esperar, um Taxi me levou até parte
da entrada da fazenda fechada a cadeado. Avisado o antigo Gerente veio me
receber. Um sorriso debochado daquela figura sem eira nem beira sem um chapéu
de boiadeiro, sem perneiras, sem capota sem bota sem nada.
Dez mil cabeças de gado! Vai ter gado assim na China! Sabe
diferenciar uma vaca de um boi? Eu ria... Quem não sabe? E a coisa começou.
Cinco largas onde se manejava o gado, aprender a arriar a montar, a campear
parecia coisa de Pata Tenra. Uma hora duas e a pobre “nádegas” pedindo para
parar e sentar em uma bacia de água com sal. Mas tudo se aprende, tudo passa
tudo se vive e tudo se torna história.
Quantas? Dezenas, cada uma mais interessante. Não vou contar que
insisti com o Mané Chefe de um piquete dos vaqueiros que cuidavam da bezerrada
recém-parida. Cinco dias para conhecer a divisa das terras da fazenda a cavalo.
Foi de doer. Uma das histórias que não esqueço aconteceu numa junta de gado
para cumprir o calendário de vacinação contra aftosa. Sentado na cerca de
madeira da curralama dois (eram seis) Olhava a vaqueirada manusear uma vacada
nelore que eram nascidos por inseminação artificial.
Eis que notei na estrada de entrada, alguém a cavalo. Eram dois.
Um moreno forte e outro nada mais nada menos que um vaqueiro da região no seu
colete e na sua pose simples de matuto mineiro. O moreno fazia questão de se
apresentar como um perfeito vaqueiro, treinado e desconfiado dos donos da
Fazenda São Vicente do qual eu era o Gerente. – Parou na entrada do curral. Não
desceu. Disse em voz baixa e arrastada: Quem é o gerente?
- Olhei para ele que cuspiu de lado e respondi: - Sou eu! – Se
apresentou: - Maneco da Fazenda das Flores do outro lado do Rio das Velhas.
Soube que algumas de nossas reses saltaram o rio e vieram para cá! – Olhei para
Totonho e ele só disse não balançando a cabeça. – Amigo, aqui não tem gado seu!
– Ele me olhou como se me fuzilasse com os olhos. Foi então que notei o Colt 45
amarrado na perna direita. Ele na melhor pose desapeou do cavalo, calmamente,
devagar sem tirar os olhos de mim que coitado só tinha um canivete no bolso.
Sua pose me lembrou de Jack Palance no filme Shane. (Os Brutos
também amam). Quando ele (Jack Wilson) apeia do seu cavalo, de olho em Shane e ambos
só têm vista para um e outro sem interferir nas demais personagens do filme.
Shane é para mim um misto de sonho escoteiro e sonho de explorador. O filme Inspirado no romance de Jack Schaefer, foi rodado nas
montanhas do Wyoming, como uma alegoria entre o Bem e o Mal: o “mocinho” é
louro e veste roupas claras; o bandido é moreno e se veste de preto. O ator
Alan Ladd teve, aqui, o melhor papel de sua carreira.
- Posso dar uma olhada na vacada? – Senti um
desafio em sua voz. Com a mão direita em cima do cabo da 45 ele subiu a cerca,
olhou nada viu nem agradeceu e partiu. Mané Vaqueiro chegou correndo na sua
égua Chouriço. O que Topeira queria? Topeira? O Vaqueiro cheio de balangandãs!
Dizem que tem muitas mortes nas costas. Sempre é contratado para recuperar gado
roubado! Sorri. Então aqui ainda impera o faroeste? Olhei para minhas vestes,
não parecia um perigoso gerente de fazenda. Resolvi mudar a indumentária.
Em Pirapora procurei seu Laerte um Seleiro
famoso. – Encomendei: - Um par de perneiras, colete, chapéu de couro preto,
cinto com fivela grande, um par de botas cano longo. Se ele era considerado um
pistoleiro, se ele se achava ser Jack Wilson, porque eu não poderia ser Shane?
Mas diversamente dos filmes, minha vida na fazenda teve lindas aventuras, mas
nunca precisei de uma arma para me defender... Salvo... Risos comprei um 32
gastei 50 balas e não acertei a latinha nem uma vez!