Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

sexta-feira, 19 de julho de 2013

PONTUALIDADE, UMA QUESTÃO DE HONRA PARA NÓS ESCOTEIROS.



Pontualidade é a arte de não desperdiçar o tempo alheio.
Anônimo

PONTUALIDADE, UMA QUESTÃO DE HONRA PARA NÓS ESCOTEIROS.
(Este artigo já foi publicado aqui. A pedidos estou fazendo um repeteco).

                Eu não sei por que resolvi escrever sobre pontualidade. Não é um assunto de adestramento, de técnica, de programas, mas acredito ser da formação escoteira e de formação moral. Não sei se será bem recebido pelos meus amigos leitores. Vejamos bem, somos exemplos, somos vistos como perfeitos, muitas vezes pela comunidade, pelos pais, pelos membros juvenis e estamos a toda hora lançando a semente da responsabilidade, da amizade e confraternização e do respeito. Na Lei Escoteira incentivamos as atividades religiosas, escolares e de cidadania. Portanto, somos responsáveis pela formação de nossos jovens nestes aspectos sem sombra de dúvida.

               No entanto a falta de pontualidade é sempre um sinal de desrespeito pelo próximo e pela organização social e está presente em nosso meio. Ela está presente nas rotinas, nas tarefas que desempenhamos, nos desafios e nos objetivos que nos propormos realizar. De todos os recursos a que temos acesso, o tempo é um dos mais relevantes pela sua natureza volátil e, para muitos de nós, perdermos horas à espera de outros, significa desperdiçar um precioso bem.

              Também é importante que devemos perceber e assumir que a forma como lidamos com o relógio, diz muito sobre a nossa educação e temperamento. Numa sociedade tão exigente e complexa como a nossa, é uma questão de procurarmos definir prioridades, sabendo de antemão que nunca iremos ter tempo para fazermos tudo o que precisamos ou gostaríamos de fazer. Ninguém gosta de ficar à espera. Se nos pusermos no lugar do outro poderemos vir a constatar que esta atitude não é um pormenor sem importância, mas constitui de fato uma falta de civismo e respeito. Vejamos algumas situações no dia a dia das reuniões de seções ou acampamentos:

- O horário de inicio da reunião é 14h30min (hipotético) alguns pais trazem os filhos nos horários, outros não. Será que é devido às falhas anteriores por parte dos escotistas responsáveis?
- O tempo de duração da cerimônia de bandeira (hipotético) é de 10 minutos, mas foram gastos mais de 20 minutos. Nestes casos os programas feitos pelas seções não terão a continuidade esperada.
- A inspeção, ou o Grande Uivo era de 10 minutos, mas se gastou 15 ou mais.
- O jogo inicial era de 10 minutos, mas se gastou muito mais.
- O adestramento de base ou de patrulha/matilha era de 15 minutos, mas se gastou muito mais.
- Diversas outras atividades programadas tiveram que ser canceladas ou substituídas por falta de tempo, já que ele foi gasto em outras atividades.
- E finalmente, o encerramento atrasou e os pais que estavam à espera ficaram inconformados, pois muitos deles tinham outros compromissos
.
Agora, vejam bem, foi feito um programa, distribuído tarefas junto aos assistentes, preparou-se material para isto e boa parte foi perdida. Esticar o horário, mudar à hora de encerramento? E os pais? É importante esclarecer que temos praticamente uma atividade por semana, com tempo determinado e muitas vezes perdemos um programa por não sabermos como utilizá-lo. - Eu pergunto como fica a motivação dos assistentes quando sua atividade é cancelada? – Como fica o programa de progressividade nas etapas e provas? – Não seria o caso de quem sabe, perdendo boa parte do programa, com consequente atraso no progresso do jovem este é induzido a sair do movimento? 

                      Eu posso dizer que vivi muito tal situação. Alem das atividades escoteiras nos grupos, também atividades distritais, regionais ou nacionais não começavam no horário. Os jogos e atividades programadas se extrapolaram. Chegamos a tal ponto, que diversos cursos de adestramento que dirigi, tinha alunos que chegavam atrasados. Mandá-los de volta, recusá-los? Como disse acima, é uma falta de respeito para com aqueles que chegaram no horário. Isto não pode fazer parte do dia a dia de nossas atividades escoteiras. Nós adultos somos o exemplo. Temos que manter nossa fleuma de uma pontualidade “britânica” para mostrar que os outros podem contar conosco. Nos Grupos Escoteiros que participei, havia flexibilidade para um pequeno atraso, mas que não extrapolasse o essencial.

                    Tenho certeza que a maioria de vocês que me leem, aconteceu um pequeno ou um grande atraso na chegada de um acampamento, de uma excursão, de um bivaque ou mesmo acantonamento. Coloquem-se no lugar dos pais que estão à espera, sem nenhuma notícia. (hoje com o celular é mais fácil) Acredito inclusive que a decepção pode em alguns casos ser superior à alegria e motivação do jovem no seu retorno. E na saída então, esperamos este, aquele e no final, saímos com total desrespeito com aqueles que chegaram no horário, prejudicando todo o programa que havia sido feito. Conheci um executivo escoteiro profissional, que conseguiu ser recebido por um presidente de uma multinacional e cujo intuito era de conseguir meios e locais para alojar em sede própria um Grupo Escoteiro da comunidade. Ele se prontificou em receber e ouvir e até quem sabe ajudar. Infelizmente ouve um atraso de 30 minutos e a reunião foi cancelada. Que belo exemplo ele deu. Acredito que daí para frente aquele Presidente olharia com desconfiança para o Movimento Escoteiro.


                    Temos diversas situações de escotistas que divergem de tal situação, chegando mesmo a pedir demissão pela falta dos responsáveis do Grupo Escoteiro em não tomar providencias. Como sempre, é mais uma cisão e mais outro grupo sendo organizado e quem sabe pode não haver frutos do que existe e no que está começando. Não é preciso dizer, que muitos de vocês leitores não se coadunam com o que aqui escrevi. Conheço uma centena ou mais de Grupos Escoteiros responsáveis e acredito que todos lutam para que fatos como este não aconteçam.  Infelizmente, pela minha experiência pessoal passei e ainda passo por convites de escotistas que ainda não se espelham com os dizeres sagrados da pontualidade. (e francamente, detesto ficar esperando!).

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Guinevere, uma Guia Escoteira na Corte do Rei Arthur.



Lendas escoteiras.
Guinevere, uma Guia Escoteira na Corte do Rei Arthur.

              Meu nome é Guinevere. Porque meus pais me deram este nome ainda não entendi bem. Eles juraram que não foi baseado na lenda do Rei Arthur onde a rainha Guinevere nutriu uma secreta paixão por Sir Lancelot. Sei que a lealdade e o respeito que nutriam pelo Rei e o respeito pelo misterioso Merlin esta traição quase não foi consumada. Isto que aconteceu com os dois amantes nem se compara ao ódio que a feiticeira Morgana, meia irmã de Arthur sente por eles. Mas não é isto que quero contar. Minha vida era agradável, eu não tinha o que reclamar, pois o meu colégio era um dos melhores, meus pais classe media alta, tinham uma vida razoavelmente boa. No meu colégio tinha muitas amigas e duas em especial. Juntas íamos ao shopping, cinema e ate escondida ia me encontrar com Tony a quem eu dizia nutrir um amor que nunca existiu igual. Hoje quando me lembro acredito que tinha uma vida fútil sem graça e sem sentido na vida.

               Tem dois anos que entrei no Movimento Escoteiro. Liv uma nova amiga que conheci em uma atividade fora da escola foi quem me disse o que era o escotismo. A princípio não me interessei muito. Afinal tinha uma rotina de vida. Colégio, shopping, internet e ficar nos braços do meu amor. Mas ela com seu jeitinho aventureiro me convenceu a conhecer a Patrulha Aconcágua. Eram cinco e em Conselho de Patrulhas resolveram abrir vaga para mais duas, pois Ned o Monitor iria para os pioneiros. Havia muitas meninas interessadas, mas Liv me garantiu que a vaga seria minha se eu fosse com ela na reunião de sábado. Francielli e Ravy minhas duas amigas do colégio deram risadas quando contei para elas o que iria fazer no sábado – Babaquice Guinevere, uma tremenda babaquice. Não desisti. Tinha assumido um compromisso com Liv e não iria desmarcar.

                 Nunca na minha vida tinha visto jovens tão sérios e responsáveis. Muito diferente dos que conhecia. Max, Ned, Liv, Leo, Jan e Junior eram diferentes muito diferentes de todos os meus amigos. Um respeito enorme com todos fazia com que eles se orgulhassem da Patrulha. Diziam que quem estava ali tinha honra, o respeito e a ética acima de tudo. Fiquei com eles até a noitinha quando minha mãe ligou preocupada. Fiquei de encontrá-los novamente na quarta onde iriam fazer uma reunião de Patrulha para decidir uma atividade aventureira. Não deu outra. Aceita entrei para a Patrulha. Nunca me arrependi. Fizemos juntos aventuras incríveis. Eu ria quando eles diziam para todos que eram os “Cinco Magníficos”. Fui a lugares que nunca pensei em ir. Passei a acreditar no impossível e para escrever tudo que passei levaria dias e dias. Mas minha promessa ficou marcada em minha vida. Um ritual que nunca mais esqueci.

       Minha promessa foi feita a noite. Fomos para o alto do morro da Carmana, próximo à cidade. A patrulha toda vestida com uma bata negra e por baixo o uniforme. Eu também usava a bata. Fui apresentada pelo Ned e iniciaram o ritual do Santo Graal como eles chamavam. A frente uma mesinha, forrada com a da Tropa e a do Brasil dobrada. Em cima o cálice sagrado e uma pequena espada de metal. Lembrei-me das Lendas Arturianas, e dos Cavaleiros da Távola Redonda. Tudo aquilo tinha muito a ver comigo. Elas se aproximaram e Ned gritou alto: - Quem vem lá?

        - Apresento Guinevere ela quer ser mais uma dos Aconcágua! – Leo respondeu – Aproxime-se! A patrulha fechou o circulo e todos disseram juntos com as mãos sobre os ombros um do outro o juramento da patrulha – “Que todos saibam, hoje e sempre, que prometo por tudo que é sagrado, amar, aceitar e respeitar os meus amigos da patrulha, honrar sua história, morrer se preciso para que seu nome seja conhecido pela coragem e abnegação. Farei prevalecer à verdade, hoje e sempre! Podem saber que serei forte como os deuses que habitam o lago azul da vida. Que os ventos do Norte, que os ventos do Sul, que os Ventos do Leste e que os ventos do Oeste tragam a chama da liberdade, da honra e da palavra ao meu coração.”.

         Nunca esqueço. Sempre me emociono quando lembro e lá estava emocionada quando dizia essa promessa. Em seguida ajoelhei-me e todos colocaram uma mascara vermelha. O Leo colocou a espada na minha cabeça e nos meus ombros dizendo – Seja bem vinda. Agora pertence à Patrulha Aconcágua. Honre seu nome por toda a vida! “Vamos beber na fonte dos deuses o sonho que nunca vai terminar, vamos juntos jurar fidelidade e amor entre nós, nada e nem nunca irão separar”! – Com o cálice, bebemos essa água sagrada, colhida na fonte dos amigos inseparáveis! Eu chorava de emoção. Incrível. Em seguida Leo e Jan abriram a Bandeira Nacional. Eu já sabia, era a hora da promessa escoteira. Disse em alto e bom som – Prometo fazer o melhor possível para, cumprir o meu dever para com Deus e minha Pátria e obedecer à lei do Escoteiro. Meus amigos, não deu para aguentar. A emoção foi demais.

         Ainda bem que vieram todos me abraçar. Não antes do Chefe Anselmo convidado para a cerimonia me colocar o distintivo de promessa e o Ned Monitor me colocar lenço do grupo. Uma emoção que nunca senti em minha vida. Acho que esta promessa me marcou para sempre em minha vida. Assim começou minha saga na Patrulha Aconcágua. Agora não eram mais os Cinco Magníficos. Éramos agora os Seis Magníficos. As atividades aventureiras se multiplicaram. Eu vibrava com todas elas. Grandes acampamentos, até que um dia Jan nos trouxe um manuscrito. Pediu que todos dessem uma olhada. Deduzi que estava escrito em latim. Entendia pouco. O Max me deu a tradução. – Dizia – “Lá, onde o vento sopra forte, onde a Estrela Negra mora, encontrarão a felicidade nos seus sete desejos”. Todos estavam calados. Mas o que significava isto? Porque ir até a Serra da Estrela negra? Onde descobriram que ela existia? Perguntas. Respondida de pronto pelo Jan, o intelectual, o pesquisador da internet.


           Não vou entrar em detalhes. Seriam páginas e paginas para escrever uma das maiores aventuras que participei. Tudo na Patrulha era assim. Uma ideia, um plano e ação. Ninguem tinha medo. Dois anos com a Patrulha. Disseram-me que no próximo ano terei que passar para o Clã pioneiro. Não gosto da ideia. Não fui lobinha e nem escoteira. Amo a Tropa Sênior e se pudesse nunca sairia dali. Mas a idade vem e não podemos fugir. Que assim seja. Hoje ser Guia para mim é um novo rumo em minha vida. Posso agora dizer a todos que o escotismo está em minha mente, em meu espírito e em meu coração. Se você ainda não é porque não vem conhecer? Procure um grupo Escoteiro e seja mais um. Tenho certeza que não vais arrepender-se. Ah! Esqueci de dizer, Tony o meu amor disse – Ou eu ou o escotismo. Coitado, dançou!  Até uma próxima vez!

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Jogando conversa fora. Como Contar Histórias.

Jogando conversa fora são artigos em série onde quatro chefes discutem temas que no dia a dia vemos em nossas atividades escoteiras. Eles simplesmente levantam o problema que deixa para os leitores chegarem as suas próprias conclusões. Este é o sexto série. Os anteriores já foram publicados aqui. Se ainda não leu e quiser ler, peça pelo meu e-mail. Em PDF. elioso@terra.com.br



Conversa ao pé do fogo. Parte VI.
Jogando conversa fora. Como Contar Histórias.

                - É mesmo uma contradição, para desligar o computador clica-se no menu iniciar – Risos. – Vou lhe dizer francamente, todos os dias o computador me ensina algum. – Ensina a todos nós disse a Akelá. – Matheus já tinha servido os quatro. Desta vez o petisco era um frango a passarinho no ponto! – Digam-me, vocês contam histórias na tropa? – Claro que sim. Mas diferente eu acho de vocês lobinhos – Um Fogo de Conselho não pode ficar sem uma história. - Principalmente as de terror! Disse o Chefe Sênior – Eles adoram. Já soube de muitos que tremeram para voltar as suas barracas – Dizem que existem técnicas para isto é verdade? – Não sei. Já conheci muitos bons contadores de histórias. – Mas e então, como contar? Como atrair a atenção e quanto tempo deve durar a história? – Olhe, acho que tudo isto depende da história, depende do programa que vocês estão desenvolvendo.

                - Algum de vocês sabem onde se origina a palavra Shope? – risos gerais – Eu sei, Chopp vem do Schopp e é uma medida de volume. Equivale a 300 ml. Com o tempo a palavra passou a designar a bebida. – "Dê-me uma mulher que ame a cerveja e eu conquistarei o mundo." Sabe tudo este Chefe. Em breve vai ser um chefão lá nas cortes dos chefões. – A Pizzaria está vazia hoje – Matheus! O que houve? Sábado e vazio? – Não, hoje é carnaval, meus clientes gostam do bloco que fizeram e vão se divertir cantando e pulando – Eu conheci um Chefe que contava historias improvisando – Ele virava para a turma e dizia: - Me deem o tema e lhe darei uma boa história – Outro que conheci fechava os olhos, abria, imaginava onde estava e “pumba” saia outra história espetacular. – Eu sei como é – disse a Akelá – Outro dia contei uma nova parte da História de Mowgly – Eles gostaram? – Nada disto, um gritou – Akelá não tem uma de terror?

                 - Matheus sem fazer nada viu que os copos estavam vazios e logo trouxe outra rodada. Trouxe da cozinha especialmente para eles um bolinho de carne que deixou todos encantados querendo mais. – Um dia eu li que para cada sessão, para cada ocasião existe um tipo de história – Não sei não, mas não deve ser contada por mais de dez ou quinze minutos. – Se vocês notarem alguém abrir a boca ou olhar para o lado é hora de encerrar, insistir é fazer perder o interesse para uma próxima vez. – Eu já vi uma Chefe contar uma história de um criador de gado – tirou assim do ar e contou – A meninada não despregava os olhos dela. Ficou até meia noite contando – Claro se a narrativa, os gestos a impostação da voz estiver no contexto da história todos irão gostar. – Quer saber de uma coisa? – A perfeição não pode ser concebida só por uma boa história. Ela tem que ter alem da personagem uma boa dose de cerveja – E riu a vontade. – Mudando o tema da cerveja, eu nunca esqueço que as minhas historias são memorizadas, pois ainda não tenho o traquejo de criar e inventar na hora.

                    - Me disseram que vivenciar a história é o passo mais importante – Pode até ser e já vi alguns envolverem-se com ela de tal maneira que era como se todos nós ali presentes estivéssemos juntos junto às personagens – Mas já vi outro que se envolveu tanto com seus gestos e traquejos que a historia serviu para virar uma grande piada – Matheus! A saideira! – Já? Falta dez para as onze. – Estou com sono – Hoje vou dormir e contar uma história para mim – Mas esqueci de perguntar, é válido quando existe entre o Contador de História e os participantes dar espaço para duvidas, perguntas ou quem sabe pedir para mudar a história? – Sei lá! – Acho que pode sim. Como chamam hoje nos programas de TV? – Interagir! – Isto mesmo. Muitas vezes a falta de entusiasmo e do teor da história muitos passam a querer interagir e é uma hora perigosa. – Muitos falando e comentando jogam todo o trabalho organizado por terra.


                   - Despesas dividas iam saindo quando um disse – Sabem, existe uma coisa que me afeta profundamente. Os homens que não acreditam em seus lideres e contadores de história e aqueles outros que não gostam de uma boa cerveja! – Gargalhas gerais – Akelá não quer dividir o taxi? Não. O ônibus é barato, minha casa não é longe e tenho o passe livre – Viva a Akelá! E salta uma cerveja estupidamente gelada prú batalhão... E vamos botar água no feijão! 

terça-feira, 16 de julho de 2013

Mortimer, um lobinho amigo do além.


Lendas escoteiras.
Mortimer, um lobinho amigo do além.

Coveiro.
Numerar sepulturas e carneiros,
Reduzir carnes podres a algarismos,
Tal é, sem complicados silogismos,
A aritmética hedionda dos coveiros!

Um, dois, três, quatro, cinco... Esoterismos
Da Morte! E eu vejo, em fúlgidos letreiros,
Na progressão dos números inteiros
A gênese de todos os abismos!
Augusto dos anjos.

                     Mortimer era um infeliz. Era filho de Lomanto da Paz o coveiro do cemitério Flores Singelas. Na escola ninguém se aproximava dele. Tinham medo. Diziam que ele falava com os mortos. Não era verdade, mas que acreditaria nele? Sua casa ficava dentro do cemitério e mesmo linda, pintada de azul e branco com muitos manjericões e rosas brancas que seu pai plantava e cuidava com carinho, ninguém nunca pediu para conhecer onde morava. Sua mãe morrera quando nasceu. Seu pai o adorava e o tratava com carinho e um amor enorme. – Mortimer meu filho, um dia vão reconhecer que seja onde for a nossa casa é sagrada. Mas não adiantava o pai falar - Pai! Nós não recebemos visitas! Por quê? – Lomanto olhava seu filho e mesmo querendo explicar que todo mundo um dia iria morar ali, ninguém gostava de tocar no assunto. A morte sempre assustou os vivos.

                   Uma menina de cabelos loiros foi transferida para sua sala. Ele a olhava e quando ela olhava para ele ficava sem jeito e virava o rosto. No recreio ela o procurou. – Quer brincar? Mortimer assustou. Ele no recreio era um eterno esquecido. Ninguém nunca o chamou para brincar. Ficava sempre em um canto olhando todos correndo e sorrindo. Ela o pegou pela mão e começou a correr – Vamos! Tente me pegar! Foi o recreio mais lindo de sua vida. – Pai! Pai! Ele chegou correndo para contar – Pai eu agora tenho uma amiga! Lomanto riu e abraçou seu filho. Os outros jovens da escola olhavam o par com indiferença. Não diziam nada. O boato que corria é que se mexesse com ele os defuntos viriam à noite em seu quarto para puxar o pé. Um dia Noêmia o convidou para ir visitar sua alcateia. – O que é isto? Perguntou. – Uma escola diferente. Nada de carteira. Nada e quadro negro. A professora lá se chama Akelá. Ela tem ajudantes. Cada um tem um nome de bichos da floresta. É como se nós vivêssemos em uma grande floresta.

                  Noêmia contou muita coisa. Mortimer ficou perplexo com o que ela contava. Havia um herói menino chamado Mowgly. Ele se perdeu na floresta e foi adotado por uma Alcateia de lobos. Todos eram amigos dele. Outros animais o protegiam. O Balu um urso grande e peludo, a Baguera uma pantera negra enorme, Hati o elefante e uma grande cobra píton chamada de Kaa. Mortimer queria saber tudo. Noêmia o convidou para ir com ela sábado ao grupo escoteiro. Seu pai foi junto. Vestiram a melhor roupa que usavam na missa dos domingos. Mortimer ficou com medo quando chegou lá. Centenas de meninos vestidos de azuis e cáqui com chapelão. Ele se assustou. Sabia que todos conheciam o Menino do cemitério. O menino que fala com os mortos. Engano. Ninguem disse nada. Foi recebido com palmas. Mortimer chorou de alegria.

                   Em casa falou para seu pai – Pai! Eu nunca pensei que fizesse tantos amigos em um só dia! – Filho, o mundo é bom, tem aqueles que não te conhecem e te julgam pelo que ouvem ou veem sem olhar o coração das pessoas. Mortimer dormiu feliz. Sonhava com o próximo sábado. Sonhava em ser mais na Roca do Conselho. Disse para si mesmo que em breve estaria de azul e a gritar junto a todos no Grande Uivo. Mortimer passou a sorrir também na sala de aula. Chegava perto de muitos da classe e dizia, eu sou lobinho, lá eles são meus amigos. São felizes como eu. Eles cantam, dançam e sabem que a verdadeira amizade nasce de dentro do coração. Mesmo vocês não sendo meus amigos o Balu meu protetor me disse que não importa o que pensam de você, importa o que você pensa deles. E eu sou amigo de todos! – Toda a classe passou a ver Mortimer como mais um deles. Não era mais o filho do coveiro.

                  Dizem, eu não sei e nem posso afirmar que todos os domingos o Cemitério Flores Singelas enche de meninos que vão lá brincar nos arvoredos, no pequeno regato que nasce atrás das montanhas e eu soube que agora toda a cidade vê com outros olhos o lobinho Mortimer e seu pai Lomanto da Paz. Dizem também e eu não sei se é verdade que aprenderam uma lição com os Escoteiros. Eles e os lobinhos fazem questão da amizade. Dizem na cidade que lá todos que entram passam a ser irmãos. Até contam em rodas por aí que eles tem um pacto e quem entra passam a ser irmão de sangue para sempre. Agora que Mortimer cresceu e se casou com Noêmia disto eu tenho certeza. Que tiveram quatro filhos e Mortimer ainda mora no cemitério e é feliz eu também sei. Escotismo é assim, quem não tem amigos lá encontra um montão.


                  Esqueci-me de dizer que Mortimer hoje é o prefeito da cidade. A prefeitura vive cheia de Escoteiros e na porta tem uma grande placa escrita – Lord Baden Powell, cidadão do mundo, O Escoteiro Chefe Mundial e amigo e irmão de todos. Falar mais o que? Escotismo é coisa que marca que entra em nós para sempre. Dizer que somos aventureiros que somos Escoteiros e vivemos para ajudar o próximo é falar o obvio. Mortimer hoje corre o mundo dando palestras. Tornou-se um professor de história e escreveu muitos livros. Ninguem mais o chama de o amigo dos mortos, mas sim de o amigo do mundo. Graças a Mortimer eu também sou Escoteiro e esteja ele onde estiver receba meu abraço apertado, meu aperto de mão esquerda e meu Sempre Alerta!