Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

sábado, 6 de julho de 2013

Jericó – Uma cidade sem lei.



Lendas escoteiras.
Jericó – Uma cidade sem lei.

(Jericó era uma importante cidade dos tempos bíblicos, descrita no Antigo Testamento como a “Cidade das Palmeiras” ou “Cidade das Palmas”, pela abundância desse tipo de árvore na região. Ainda hoje, conserva o apelido. A passagem bíblica mais famosa sobre o lugar é a que mostra os hebreus, recém-chegados à Terra Prometida, derrubando as imponentes muralhas da cidade ao som de trombetas e gritos, conquistando-a, liderados por Josué).

               Billy e Any não eram um casal perfeito, mas viviam felizes em Porto Feliz uma cidade no interior de Santa Catarina. Tinham uma bela casinha, um lindo filho de 8 anos, e Ralph era o encanto dos dois. Billy trabalhava na Secretaria da Fazenda. No CAGE estava lotado na Divisão de Controle de Administração Direta. Era um “pau” de toda obra, mas na função de Controlador Contábil. Não podia reclamar do seu salário, mas como todo ser vivente ambicionava mais. Any antes de se casar se formou como Assistente Social e atualmente era só uma dona de casa. Ela tinha por Ralph um amor grandioso. Ficava ao lado dele o tempo todo e só deixou de ser sua sombra quando entrou para o escotismo como lobinho. A própria Akelá explicou que ele precisava crescer. A mãe junto prejudica e sufoca o aparecimento de liderança. Ela entendeu. De vez em quando olhava as atividades e via que Ralph era um grande lobinho. Em casa não tinha outro assunto.

                Um dia Billy disse a ela que precisavam conversar – Seu Chefe o Doutor Getúlio o convidou para organizar e dirigir o novo escritório da Secretaria da Fazenda em uma cidade no interior do Mato Grosso quase divisa com o Pará. Longe à beça. Mas seu salário seria duplicado, havia possibilidade de Any trabalhar com ele também por um ótimo salário. Seria por cinco anos. Se conseguissem formar pessoal com nativos estariam liberados para voltar a Porto Feliz com as mesmas regalias. Anny gostou da ideia. Valia o sacrifício. Não venderiam a casa somente os móveis. Na volta comprariam outros. Billy vendeu seu Simca Chambord do ano e comprou uma Rural Williys seminova. Seria uma viagem de mais de três mil quilômetros. Tudo preparado se despediram dos parentes dos amigos prometendo que não seria adeus e sim um até logo.

               Apesar da mudança, da viagem e em conhecer outros lugares Ralph chorou muito ao deixar a Alcateia. Fizeram uma reunião de despedida de partir o coração. Todos lhe deram abraços e muitos presentes. Um deles foi de Tininha, uma morena de olhos verdes da sua Matilha. Entregou uma cartinha perfumada. Ralph guardou para ler na viagem. Pararam em Três Marias em um restaurante a beira do lago da represa para almoçar. Ralph abriu a cartinha de Tininha e lá estava escrito – Te amo muito. Vou te amar por toda minha vida. Qualquer adulto daria boas gargalhadas. Os pais não. Sabiam que os jovens que ainda nem despontaram para vida também tinham sonhos. Anny e Billy ficaram com os olhos cheios de lágrimas. Foram três dias de poeira, sol chuva estrada esburacada e enfim chegaram a Jericó.

              Não era uma cidade feia. Tinha uma bela praça bem arborizada, mas quase ninguém a passear ou descansar. Uma Igreja linda que disseram depois ser do ano de 1910. Devia ter uns vinte e cinco mil habitantes. Poucos na rua e o comercio quase vazio. Billy tinha o endereço onde iriam abrir o escritório e também serviria como casa nos primeiros meses. Depois se quisessem poderiam alugar outra. Não ficava longe do centro. Quase ninguém para perguntar. A maioria nas janelas abertas quando passavam elas se fechavam. Estranho isto pensaram. Há primeira semana se foi. Contrataram uma moça e um rapaz para ajudá-los. Aos poucos eles foram se abrindo e falando da cidade. Contaram coisas que assustaram Billy e Anny. Em pleno ano de 1950 bandidos dominando uma cidade? Pois é doutor. (eles o chamavam assim). Cicatriz vive nas montanhas. A cada mês desce a cidade e lá está seu Astholpo o prefeito abrindo seu armazém para eles se servirem. Um dia antes ele só deixava o combinado que seria rateado por toda a cidade. O restante dos mais de cinco mil itens ele esconde em um porão ali perto.

                 Billy e Anny não acreditaram muito. Mas se fosse verdade iriam agir na base de viver e deixar viver. Não iriam viver ali para sempre. Ralph voltou da escola animado. Soube que na cidade tinha um grupo Escoteiro. Um amigo da sua sala contou. Deu o endereço. Billy o levou lá no sábado. Tomou o maior susto. Eles marchavam para todo lado. Tinham uma banda enorme. Os que não eram da banda usavam uma espécie de fuzil de madeira. O que era aquilo? Mas Ralph queria participar. Conversou com o Chefe. Foi admitido e enviado a Alcateia que também marchava. – Porque só marcham? Perguntou. Só na sede. Uma vez por mês acampamos. Uma vez por mês fazemos jornadas. Lá tudo que pensar em técnica mateira nós fazemos. O senhor já sabe do Cicatriz. Precisamos preparar os jovens para um enfrentamento no futuro.

                 O trabalho para organizar o escritório da Secretaria da Fazenda foi cansativo. Já tinham admitido seis funcionários. Bob Masterson seria o indicado para o futuro como Chefe do escritório. Formado em Direito e o melhor, Chefe da Tropa Sênior. O mês terminou. Billy e Anny resolveram dar uma folga no fim de semana. Souberam de um lago muito bonito e porque não fazer um pic nic? Bob Masterson desaconselhou. Cicatriz deve aparecer por aqui domingo. Neste dia ninguém sai à rua. Todos ficam trancados. Conselho dado, conselho guardado. Domingo amanheceu cinzento. A cidade deserta. Nem os passarinhos cantavam nesta manhã radiosa. Meio dia. Mais de quarenta cavaleiros entraram na cidade vindo das montanhas. Cicatriz à frente. Ele era imponente. Devia ter quase um e noventa de altura. Mãos enorme. Podia torcer um pescoço de alguém com facilidade. Um fuzil a tiracolo. Sorria meio debochado. Parou em frente à igreja e sentou em um banco que ali existia.    

                  Interessante. Cicatriz era loiro. Deveria andar na casa de seus quarenta anos. Uma enorme cicatriz iniciava pela sua orelha direita e terminava na esquerda. Não diria que era horrenda, pois até dava um aspecto sobrenatural e excitante. Seu Astholpo apareceu. O levou até o armazém. Seus capangas encheram duas carroças de víveres. – Astholpo! Disse Cicatriz. Na próxima vamos precisar de dinheiro. Dez reais por habitante. Quem se recusar sobe a montanha comigo. Billy e Anny viam e ouviam tudo da janela da sua casa. Estavam hipnotizados pelo que acontecia. Fato inédito. Nunca tinham visto nada igual. Só no cinema. Sentiram uma lufada de vento e a porta se abriu. Correram até lá. Ralph saiu correndo em direção a Cicatriz. Levava seu fuzil de madeira. Billy e Anny tremeram. Correram atrás dele. Mesmo gritando para parar ele não parou. Ficou bem em frente à Cicatriz apontando aquela arma de brinquedo. – Você está preso! Disse Ralph.

                 Uma onda de pavor correu de porta em porta, de janela em janela. Todos se trancaram mais em suas casas. Billy e Anny desesperados. Pare Ralph, pare! Disseram. Cicatriz levou um susto. Sacou seu colt 45 com incrível rapidez e mirou bem na testa de Ralph. Seus dedos coçaram o gatilho. Para ele não importa se era menino ou não. Se alguém queria matá-lo ele matava primeiro. Anny desesperada gritava – Não mate meu filho! Pelo amor de Deus! Ele só tem sete anos! – Um tiro se ouviu. Um ribombar por todas as ruas da cidade. Cicatriz olhava com olhos esbugalhados. Levou sua mão direita até o peito. Sentiu um furo em seu gibão de couro. O sangue escorria em filetes pequenos. Cicatriz não acreditava. Nunca pensou em morrer assim. Morte estupida só porque ia mandar um menino para o inferno.

                 Ninguém até hoje ficou sabendo de onde partira o tiro abençoado. A bandidada ameaçou uma reação. Não se sabe como, apareceram todos os Escoteiros da cidade. Formados em linha com seus fuzis de madeira. Atrás a banda fazendo um enorme barulho. A poucos metros dos bandidos o Chefe Bob Masterson gritou – Escoteiros! – Preparar! Todos se ajoelharam. – Apontar! - Apontaram seus fuzis de brinquedos para os bandidos. Não ficou ninguém. Eles montaram em seus cavalos e partiram a galope. A cidade saiu rua. Uma algazarra tremenda. – Livres! Gritaram. Estamos livres pela primeira vez na vida. Cicatriz dava seus últimos suspiros. Olhou o povo gritando. Sentiu uma dor tremenda e viu ao seu lado um demônio enorme. Um grande chifre, dentes soltando fumaça. Ficou em paz. Agora ele sabia que estava em casa.

                O tempo passou. A felicidade voltou. Jericó cantava aleluia. Não era e nem nunca fora a cidade antiga bíblica situada na Palestina. O rio que cortava a cidade também se chamava rio Jordão. Muitos diziam que Jericó significava perfumado e a deriva da palavra Cananeia. O Bispo mandou um novo pároco para a cidade. Agora em paz. Billy e Anny começaram a amar a cidade de Jericó. Saudades só dos pais e dos amigos. Fizeram uma bela casa na Rua dos Hebreus. Anny resolveu ser escoteira. Foi bem recebida e na promessa recebeu seu fuzil de madeira. Billy ajudava na parte burocrática. O Prefeito seu Astholpo mandou fazer um belo pórtico na entrada da cidade. Em uma linda placa de acrílico escreveu – É fácil as pessoas mandarem você se calar, quando a dor é só sua, mas seja como o cego de Jericó – Grite, grite até Jesus parar tudo para te ajudar!


E em todos os lugares, em todas as missas, em todos os cultos religiosos, o povo dizia que a mão de Deus foi quem deu o tiro certeiro em Cicatriz. Bendito seja. – E cantaram aleluia para sempre. “Vem com Josué lutar em Jericó, Jericó. Vem com Josué lutar em Jericó e as muralhas ruirão. As trombetas soarão, abalando céu e chão. Cerquem os muros para mim, pois Jericó chegou ao fim”!

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Conversa ao pé do fogo. A última Estação de trem. Tempos são passados. Só as lembranças ficaram. Tempos bons que não voltam mais. Ainda fazia minhas jornadas e meus acampamentos a “escoteira”, para quem não sabe significa aquele que anda só. Era um apaixonado por ficar só, sem dividir o vento no rosto, a sombra de uma pitangueira, ou o remanso frio de um riacho. Egoísta? Não. Junto aos meus amigos fizemos belos acampamentos, belas excursões que também tem seu lugarzinho em um cantinho da minha memória. Meus problemas eu resolvia assim. Uma mochila, um bornal, uma forquilha, ração B, uma rota e pé na estrada. Adorava. Muitas vezes sem barracas. Montar uma cabana, um banquinho, um fogo estrela, um local privilegiado onde a vista pudesse deslumbrar o inatingível. Quantas vezes? Muitas. Paradas longínquas, picos saudosos, vales queridos, uma jangada a descer o rio desconhecido. Muitas histórias. Várias que um dia quem sabe irei contando uma a uma. Desta não esqueço. Aconteceu no início da década de sessenta. Bandeiras ao vento e lá ia eu. Diziam ser uma floresta virgem onde poucos entraram. Meu habitat. Um trem, uma trilha, e a floresta linda a convidar para conhecê-la. Dois dias. Animais enormes, pássaros floridos e cantantes aos milhares, corujas buraqueiras espantadas com meu cantar noturno a beira de um pequeno fogo naquela clareira amiga. Os ruídos da noite a estalar na audição de um Velho mateiro. Vida sublime. Sonhos refeitos, alegre pela mente fértil hora da meia volta. Um retorno sem faltar um banho em um riacho que jorrava cascatas com suas águas nas pedras brancas criando espumas gostosas para afundar e levantar sentindo o sabor daquelas águas que nunca foram tocadas. Tudo que é bom não dura para sempre. Já me disseram que nada é para sempre. O retorno sempre é tristonho. Uma pequena estação. Não era uma cidade, quem sabe um arraial. Meia dúzia de casas. Só o trem expresso não para. Os outros ficam ali a soltar fumaça na chaminé de uma Baldwin que nunca se cansava. Cheguei cedo. Gostava de ver o andar do Chefe da Estação. Educado. - Boa tarde! E tirava o quepe como a me saudar sem me conhecer. Ao lado uma mesa com a parafernália eletromagnética que Morse um dia inventou, as mensagens enviadas pelo telegrafista percorriam como correio eletrônico os milhares de quilômetros daquela ferrovia sem fim. Diziam eu não sei que chegava até o fim do mundo! Eu podia ouvir os sinais curtos e longos, pois um dia quando criança enfrentei a batalha de ser um Sinaleiro. Sentado em um banco na plataforma da estação eu esperava. Não tinha pressa. Nunca tive. Muitas vezes um olhar corre mais rápido que um raio no céu. A vista fora o rio caudaloso era comum após as diversas linhas de ida e volta. A plataforma vazia. O trem que subia o rio chegou mansamente. Não era o meu. Eu iria descer o rio. O Chefe da Estação com seu arco a dar suas instruções ao maquinista que treinado não teve duvidas para enlaçar. O barulho quieto da fornalha soltando fumaça e ar quente. Eu adorava aquilo. Estava ali sentado como hipnotizado com a beleza de uma trem de ferro que sumiu para sempre nas esquinas da vida. Foi então que avistei um casal. Jovens. Parados em frente à entrada do vagão de primeira classe. Um olhando para o outro. Não diziam nada. Ela só tinha olhos para ele. Encharcados de lágrimas de amor. Ele tristonho também não tirava os olhos dela. – Eu volto para te buscar ele disse. Ela chorava baixinho. – Nunca vou esquecer-me de você meu amor. O último apito, um beijo simples, um roçar de lábios sedentos que não queriam se separar. O trem deslizando sobre os trilhos se despedia da estação sorrindo ao pensar que outra lá ao longe estava à espera dele. Um último adeus. Ele correu e subiu nos degraus de seu vagão. Ficou ali de mãos estendidas como a dizer um adeus para sempre. Ela sabia disto. Sabia que ele não iria voltar. Em pé olhava o trem apitando até sumir de vista na curva do rio. Um silêncio tomou conta da plataforma. Eu só ouvia o tic tac do telegrafo e os soluços da bela moça que havia perdido seu amor. Eu nada dizia. Não tinha nada para dizer. Ela estática não saia do lugar. Perdidos em uma estação de trem o mundo dela desmoronava. O meu chorava com ela. Ela se virou e me viu. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Eu de calças curtas com meu chapelão fiquei em pé. Queria me solidarizar. Não sabia como fazer. Ela deu um pequeno sorriso levantando o braço dizendo baixinho “Sempre Alerta”. Respondi do mesmo modo em posição de sentido. Lentamente ela se foi para seu destino. De novo a estação vazia. O sol do outro lado do rio teimava em se esconder na montanha. Não havia vento, nem uma leve brisa para trazer alguma notícia do meu trem. Sentei novamente e deixei minha mente viajar por este mundo de Deus. O Chefe do Trem se aproximou. – Um atraso de quatro horas. O Trem que subia desencarrilhou. Muitos feridos. O Trem que iria descer não tinha como passar. Não disse nada. Não tinha pressa. Minha mente corria sobre os trilhos a procurar o trem que se foi. - Será que ele sobreviveu? Sem resposta. E ela? Como avisar que seu amor poderia ter ido para o outro lado da vida? – Não tem como dizer. Ela se foi para sua morada sonhando com seu amor e sabendo que ele nunca mais iria voltar. Quem sabe é melhor assim. Dormitei no banco da estação. A noite chegou. A plataforma escura deu para ver alguns trovões no céu. A chuva chegou de mansinho. Não havia mais trovões e nem raios no céu. Eu gosto do som da chuva. Ela me trás uma paz e tranquilidade que revigora. Ao longe um apito do trem. Era o meu que chegava. Como um pássaro gigante sobre trilhos adentrou na estação perdida de um trecho qualquer. Um retorno sem consequências. Na minha morada meu amor dormia. Entrei de mansinho. Fui olhar meus filhos que adormecidos sonhavam com anjos do céu. Abracei minha amada de muitas vidas que estava ali ao meu lado. Ela sorriu. Pensei no amor da outra que tinha ido para sempre. Sina marcada. Destino escrito no livro da vida. Nada do que tem de ser muda. Sonhos que não foram vividos. Estrelas piscantes que se mantém no universo através dos tempos. Esperanças que nunca se acabam. Ainda deitado com as mãos entrelaçadas no peito eu lembrei-me de um verso de um lindo poema de JG de Araújo Jorge – “Gota d’água brilhante, ainda suspenso num fio... Quando o sol quente a encontrou, partida que não teve o adeus de um lenço, história antiga que não tem mais senso, livro que o vento sem querer fechou”! Nota – J.G de Araújo Jorge escreveu centenas de poemas. A estrofe escrita no final do conto é de seu poema Carta Inútil. Por sinal um dos mais bonitos que escreveu.



Conversa ao pé do fogo.
Conversa ao pé do fogo.
A última Estação de trem.

                   Tempos são passados. Só as lembranças ficaram. Tempos bons que não voltam mais. Ainda fazia minhas jornadas e meus acampamentos a “escoteira”, para quem não sabe significa aquele que anda só. Era um apaixonado por ficar só, sem dividir o vento no rosto, a sombra de uma pitangueira, ou o remanso frio de um riacho. Egoísta? Não. Junto aos meus amigos fizemos belos acampamentos, belas excursões que também tem seu lugarzinho em um cantinho da minha memória. Meus problemas eu resolvia assim. Uma mochila, um bornal, uma forquilha, ração B, uma rota e pé na estrada. Adorava. Muitas vezes sem barracas. Montar uma cabana, um banquinho, um fogo estrela, um local privilegiado onde a vista pudesse deslumbrar o inatingível. Quantas vezes? Muitas. Paradas longínquas, picos saudosos, vales queridos, uma jangada a descer o rio desconhecido.

                  Muitas histórias. Várias que um dia quem sabe irei contando uma a uma. Desta não esqueço. Aconteceu no início da década de sessenta. Bandeiras ao vento e lá ia eu. Diziam ser uma floresta virgem onde poucos entraram. Meu habitat. Um trem, uma trilha, e a floresta linda a convidar para conhecê-la. Dois dias. Animais enormes, pássaros floridos e cantantes aos milhares, corujas buraqueiras espantadas com meu cantar noturno a beira de um pequeno fogo naquela clareira amiga. Os ruídos da noite a estalar na audição de um Velho mateiro. Vida sublime. Sonhos refeitos, alegre pela mente fértil hora da meia volta. Um retorno sem faltar um banho em um riacho que jorrava cascatas com suas águas nas pedras brancas criando espumas gostosas para afundar e levantar sentindo o sabor daquelas águas que nunca foram tocadas.

                  Tudo que é bom não dura para sempre. Já me disseram que nada é para sempre. O retorno sempre é tristonho. Uma pequena estação. Não era uma cidade, quem sabe um arraial. Meia dúzia de casas. Só o trem expresso não para. Os outros ficam ali a soltar fumaça na chaminé de uma Baldwin que nunca se cansava. Cheguei cedo. Gostava de ver o andar do Chefe da Estação. Educado. - Boa tarde! E tirava o quepe como a me saudar sem me conhecer. Ao lado uma mesa com a parafernália eletromagnética que Morse um dia inventou, as mensagens enviadas pelo telegrafista percorriam como correio eletrônico os milhares de quilômetros daquela ferrovia sem fim. Diziam eu não sei que chegava até o fim do mundo! Eu podia ouvir os sinais curtos e longos, pois um dia quando criança enfrentei a batalha de ser um Sinaleiro. Sentado em um banco na plataforma da estação eu esperava. Não tinha pressa. Nunca tive. Muitas vezes um olhar corre mais rápido que um raio no céu.  A vista fora o rio caudaloso era comum após as diversas linhas de ida e volta.

                A plataforma vazia. O trem que subia o rio chegou mansamente. Não era o meu. Eu iria descer o rio. O Chefe da Estação com seu arco a dar suas instruções ao maquinista que treinado não teve duvidas para enlaçar. O barulho quieto da fornalha soltando fumaça e ar quente. Eu adorava aquilo. Estava ali sentado como hipnotizado com a beleza de uma trem de ferro que sumiu para sempre nas esquinas da vida. Foi então que avistei um casal. Jovens. Parados em frente à entrada do vagão de primeira classe. Um olhando para o outro. Não diziam nada. Ela só tinha olhos para ele. Encharcados de lágrimas de amor. Ele tristonho também não tirava os olhos dela. – Eu volto para te buscar ele disse. Ela chorava baixinho. – Nunca vou esquecer-me de você meu amor. O último apito, um beijo simples, um roçar de lábios sedentos que não queriam se separar.

              O trem deslizando sobre os trilhos se despedia da estação sorrindo ao pensar que outra lá ao longe estava à espera dele.  Um último adeus. Ele correu e subiu nos degraus de seu vagão. Ficou ali de mãos estendidas como a dizer um adeus para sempre. Ela sabia disto. Sabia que ele não iria voltar. Em pé olhava o trem apitando até sumir de vista na curva do rio. Um silêncio tomou conta da plataforma. Eu só ouvia o tic tac do telegrafo e os soluços da bela moça que havia perdido seu amor. Eu nada dizia. Não tinha nada para dizer. Ela estática não saia do lugar. Perdidos em uma estação de trem o mundo dela desmoronava. O meu chorava com ela. Ela se virou e me viu. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Eu de calças curtas com meu chapelão fiquei em pé. Queria me solidarizar. Não sabia como fazer. Ela deu um pequeno sorriso levantando o braço dizendo baixinho “Sempre Alerta”. Respondi do mesmo modo em posição de sentido. Lentamente ela se foi para seu destino.

               De novo a estação vazia. O sol do outro lado do rio teimava em se esconder na montanha. Não havia vento, nem uma leve brisa para trazer alguma notícia do meu trem. Sentei novamente e deixei minha mente viajar por este mundo de Deus. O Chefe do Trem se aproximou. – Um atraso de quatro horas. O Trem que subia desencarrilhou. Muitos feridos. O Trem que iria descer não tinha como passar. Não disse nada. Não tinha pressa. Minha mente corria sobre os trilhos a procurar o trem que se foi. - Será que ele sobreviveu? Sem resposta. E ela? Como avisar que seu amor poderia ter ido para o outro lado da vida? – Não tem como dizer. Ela se foi para sua morada sonhando com seu amor e sabendo que ele nunca mais iria voltar. Quem sabe é melhor assim. Dormitei no banco da estação. A noite chegou. A plataforma escura deu para ver alguns trovões no céu.

             A chuva chegou de mansinho. Não havia mais trovões e nem raios no céu. Eu gosto do som da chuva. Ela me trás uma paz e tranquilidade que revigora. Ao longe um apito do trem. Era o meu que chegava. Como um pássaro gigante sobre trilhos adentrou na estação perdida de um trecho qualquer. Um retorno sem consequências. Na minha morada meu amor dormia. Entrei de mansinho. Fui olhar meus filhos que adormecidos sonhavam com anjos do céu. Abracei minha amada de muitas vidas que estava ali ao meu lado. Ela sorriu. Pensei no amor da outra que tinha ido para sempre. Sina marcada. Destino escrito no livro da vida. Nada do que tem de ser muda. Sonhos que não foram vividos. Estrelas piscantes que se mantém no universo através dos tempos. Esperanças que nunca se acabam. Ainda deitado com as mãos entrelaçadas no peito eu lembrei-me de um verso de um lindo poema de JG de Araújo Jorge – “Gota d’água brilhante, ainda suspenso num fio... Quando o sol quente a encontrou, partida que não teve o adeus de um lenço, história antiga que não tem mais senso, livro que o vento sem querer fechou”!

Nota – J.G de Araújo Jorge escreveu centenas de poemas. A estrofe escrita no final do conto é de seu poema Carta Inútil. Por sinal um dos mais bonitos que escreveu.

                   Tempos são passados. Só as lembranças ficaram. Tempos bons que não voltam mais. Ainda fazia minhas jornadas e meus acampamentos a “escoteira”, para quem não sabe significa aquele que anda só. Era um apaixonado por ficar só, sem dividir o vento no rosto, a sombra de uma pitangueira, ou o remanso frio de um riacho. Egoísta? Não. Junto aos meus amigos fizemos belos acampamentos, belas excursões que também tem seu lugarzinho em um cantinho da minha memória. Meus problemas eu resolvia assim. Uma mochila, um bornal, uma forquilha, ração B, uma rota e pé na estrada. Adorava. Muitas vezes sem barracas. Montar uma cabana, um banquinho, um fogo estrela, um local privilegiado onde a vista pudesse deslumbrar o inatingível. Quantas vezes? Muitas. Paradas longínquas, picos saudosos, vales queridos, uma jangada a descer o rio desconhecido.

                  Muitas histórias. Várias que um dia quem sabe irei contando uma a uma. Desta não esqueço. Aconteceu no início da década de sessenta. Bandeiras ao vento e lá ia eu. Diziam ser uma floresta virgem onde poucos entraram. Meu habitat. Um trem, uma trilha, e a floresta linda a convidar para conhecê-la. Dois dias. Animais enormes, pássaros floridos e cantantes aos milhares, corujas buraqueiras espantadas com meu cantar noturno a beira de um pequeno fogo naquela clareira amiga. Os ruídos da noite a estalar na audição de um Velho mateiro. Vida sublime. Sonhos refeitos, alegre pela mente fértil hora da meia volta. Um retorno sem faltar um banho em um riacho que jorrava cascatas com suas águas nas pedras brancas criando espumas gostosas para afundar e levantar sentindo o sabor daquelas águas que nunca foram tocadas.

                  Tudo que é bom não dura para sempre. Já me disseram que nada é para sempre. O retorno sempre é tristonho. Uma pequena estação. Não era uma cidade, quem sabe um arraial. Meia dúzia de casas. Só o trem expresso não para. Os outros ficam ali a soltar fumaça na chaminé de uma Baldwin que nunca se cansava. Cheguei cedo. Gostava de ver o andar do Chefe da Estação. Educado. - Boa tarde! E tirava o quepe como a me saudar sem me conhecer. Ao lado uma mesa com a parafernália eletromagnética que Morse um dia inventou, as mensagens enviadas pelo telegrafista percorriam como correio eletrônico os milhares de quilômetros daquela ferrovia sem fim. Diziam eu não sei que chegava até o fim do mundo! Eu podia ouvir os sinais curtos e longos, pois um dia quando criança enfrentei a batalha de ser um Sinaleiro. Sentado em um banco na plataforma da estação eu esperava. Não tinha pressa. Nunca tive. Muitas vezes um olhar corre mais rápido que um raio no céu.  A vista fora o rio caudaloso era comum após as diversas linhas de ida e volta.

                A plataforma vazia. O trem que subia o rio chegou mansamente. Não era o meu. Eu iria descer o rio. O Chefe da Estação com seu arco a dar suas instruções ao maquinista que treinado não teve duvidas para enlaçar. O barulho quieto da fornalha soltando fumaça e ar quente. Eu adorava aquilo. Estava ali sentado como hipnotizado com a beleza de uma trem de ferro que sumiu para sempre nas esquinas da vida. Foi então que avistei um casal. Jovens. Parados em frente à entrada do vagão de primeira classe. Um olhando para o outro. Não diziam nada. Ela só tinha olhos para ele. Encharcados de lágrimas de amor. Ele tristonho também não tirava os olhos dela. – Eu volto para te buscar ele disse. Ela chorava baixinho. – Nunca vou esquecer-me de você meu amor. O último apito, um beijo simples, um roçar de lábios sedentos que não queriam se separar.

              O trem deslizando sobre os trilhos se despedia da estação sorrindo ao pensar que outra lá ao longe estava à espera dele.  Um último adeus. Ele correu e subiu nos degraus de seu vagão. Ficou ali de mãos estendidas como a dizer um adeus para sempre. Ela sabia disto. Sabia que ele não iria voltar. Em pé olhava o trem apitando até sumir de vista na curva do rio. Um silêncio tomou conta da plataforma. Eu só ouvia o tic tac do telegrafo e os soluços da bela moça que havia perdido seu amor. Eu nada dizia. Não tinha nada para dizer. Ela estática não saia do lugar. Perdidos em uma estação de trem o mundo dela desmoronava. O meu chorava com ela. Ela se virou e me viu. Seus olhos estavam marejados de lágrimas. Eu de calças curtas com meu chapelão fiquei em pé. Queria me solidarizar. Não sabia como fazer. Ela deu um pequeno sorriso levantando o braço dizendo baixinho “Sempre Alerta”. Respondi do mesmo modo em posição de sentido. Lentamente ela se foi para seu destino.

               De novo a estação vazia. O sol do outro lado do rio teimava em se esconder na montanha. Não havia vento, nem uma leve brisa para trazer alguma notícia do meu trem. Sentei novamente e deixei minha mente viajar por este mundo de Deus. O Chefe do Trem se aproximou. – Um atraso de quatro horas. O Trem que subia desencarrilhou. Muitos feridos. O Trem que iria descer não tinha como passar. Não disse nada. Não tinha pressa. Minha mente corria sobre os trilhos a procurar o trem que se foi. - Será que ele sobreviveu? Sem resposta. E ela? Como avisar que seu amor poderia ter ido para o outro lado da vida? – Não tem como dizer. Ela se foi para sua morada sonhando com seu amor e sabendo que ele nunca mais iria voltar. Quem sabe é melhor assim. Dormitei no banco da estação. A noite chegou. A plataforma escura deu para ver alguns trovões no céu.

             A chuva chegou de mansinho. Não havia mais trovões e nem raios no céu. Eu gosto do som da chuva. Ela me trás uma paz e tranquilidade que revigora. Ao longe um apito do trem. Era o meu que chegava. Como um pássaro gigante sobre trilhos adentrou na estação perdida de um trecho qualquer. Um retorno sem consequências. Na minha morada meu amor dormia. Entrei de mansinho. Fui olhar meus filhos que adormecidos sonhavam com anjos do céu. Abracei minha amada de muitas vidas que estava ali ao meu lado. Ela sorriu. Pensei no amor da outra que tinha ido para sempre. Sina marcada. Destino escrito no livro da vida. Nada do que tem de ser muda. Sonhos que não foram vividos. Estrelas piscantes que se mantém no universo através dos tempos. Esperanças que nunca se acabam. Ainda deitado com as mãos entrelaçadas no peito eu lembrei-me de um verso de um lindo poema de JG de Araújo Jorge – “Gota d’água brilhante, ainda suspenso num fio... Quando o sol quente a encontrou, partida que não teve o adeus de um lenço, história antiga que não tem mais senso, livro que o vento sem querer fechou”!


Nota – J.G de Araújo Jorge escreveu centenas de poemas. A estrofe escrita no final do conto é de seu poema Carta Inútil. Por sinal um dos mais bonitos que escreveu.

O Recado



Hoje como sempre faço, folheando paginas da internet deparei com esta preciosidade. A Chefe Itamar que não tive a honra de conhecer escreveu lindas palavras sobre o nosso movimento. Um artigo longo. Escolhi o final. Vale a pena ler para reconhecer uma grande Escotista.

O Recado

Escoteiro: Qual o recado que você daria aos chefes que estão começando agora a lidar com estes jovens?
Ch. Itamar: O recado é para qualquer pessoal, não somente no escotismo;

1 - Precisamos estudar e colocar em prática as coisas que estudamos.
2 - Precisamos olhar o mundo da forma que queremos que ele seja. Assim trabalharemos para que ele chegue até o nosso objetivo. Quando compramos um terreno, e queremos construir uma casa, antes de mais nada precisamos saber que tipo de construção iremos fazer. Caso contrário estaremos perdendo tempo e dinheiro.
O mesmo acontece com a nossa vida, nosso grupo, nossa tropa.
Se não tivermos um objetivo, dificilmente conseguiremos alcançar alguma coisa.
Em resumo devemos estar SEMPRE ALERTA, fazendo o MELHOR POSSÍVEL para SERVIR.

Lembrar que não adianta SERVIR, sem saber a quem, esquecendo de olhar o resultado que pretendemos. Tudo que fazemos nesta vida tem uma razão. Mesmo quando fazemos besteira, temos que ter certeza que esta será cobrada mais cedo ou mais tarde. Quando estamos lidando com jovens, devemos estar com eles, viver com eles. Mas devemos lembrar que nós temos a responsabilidade e o dever de proteger nosso jovem.

Só mais um recadinho:

Tudo que fazemos na vida, precisamos fazer com TESÃO, com VONTADE, com PRAZER, com PAIXÃO. Mesmo que a coisa não seja o que queremos, o importante é que façamos o que precisamos que seja feito. Fazer o que quer é muito simples. Fazer o que é necessário, só os grandes podem fazer. 
O verdadeiro escotista é um educador. A diferença de um educador para um professor, segundo Rubem Alves, em seu livro "entre jequitibás e eucaliptos" está exatamente na diferença entre essas duas árvores. Um professor sai às fornadas, todo ano são muitos os formados.
Um educador leva a vida toda para se formar.
Um eucalipto é plantado em pouco tempo já está pronto para ser cortado.
Um jequitibá leva uma vida inteira para se formar.
Um escotista leva uma vida para se formar. Ele demonstra que é um discípulo de B.P. através de gestos. Não importando se está com um lenço escoteiro ou com um mouse na mão.
Boa sorte!

quarta-feira, 3 de julho de 2013

O simpático macaquinho Quinzinho.



Lendas escoteiras.
O simpático macaquinho Quinzinho.

Quando escoteiro tínhamos facilidades de acampar sempre. Seja com a tropa ou com a patrulha quase sempre passávamos o fim de semana no campo. Todas as patrulhas tinham suas escolhas. Seus locais. A nossa, a Raposa sempre que podíamos acampávamos na Fazenda do Chico Flores. Perto, menos de seis quilômetros. Uma aguada maravilhosa e um grande bambuzal que poderíamos usar a vontade. Menos de um quilômetro do Rio Doce. Perdi conta de quantos acampamentos fizemos lá. Tínhamos lá muito animais que se tornaram amigos. Um lobo Guará que vinha comer em nossas mãos. Um falcão que nos olhava de longe e um Quati que não saía do acampamento.  

Chico Flores e sua esposa dona Alice Flores eram um casal de velhinhos muito simpáticos. Nem precisávamos avisar e quando lá chegávamos, ele dava um belo sorriso. Sua casa era simples, ainda com paredes com bambus cobertos de barro, mas por dentro era um brinco. Dona Alice com seu eterno sorriso. Fazia um queijo mineiro como ninguém. Sempre pela manhã ela aparecia no campo. – vim trazer um queijinho para vocês. E ele? Sempre com um franguinho, ovos, cachos de banana caturra e muitas outras guloseimas. Os filhos na capital estudando. Dizia ter um “gadinho”. Uns boizinhos como ele dizia, (eram mais de 2.000 cabeças), uns porquinhos, galinhas e uma centena de bodes e avestruz.

Estávamos voltando pela segunda vez aquele mês. Uma investigação se fazia necessária. Na última vez, fomos roubados em toda nossa alimentação. Quem roubou abriu a porta da barraca de duas lonas facilmente. Ela estava bem presa e não sobrou nada. Tínhamos naquela época três tipos de ração. Ração A – Arroz feijão, batata e macarrão e dois pedaços de linguiça. Óleo, sal e sabão. Tudo dividido por cada patrulheiro. Nossas mães colocavam em saquinhos e vidrinhos, fácil para levar na mochila. A ração B era mais ou menos a mesma, mas para dois ou três dias. E por último a ração C – Maior. Comprada no Armazém do Seu Zé Mutum. Ele fazia um preço especial para nós. Nossos pais pagavam com a caderneta mensal.

Sempre a sexta feira, nos encontrávamos na sede do grupo a noite e lá pelas nove já com a carrocinha preparada partíamos. Menos de duas horas e já estávamos no local. Montamos o campo como se não soubéssemos de nada. No dia seguinte fizemos um almoço e sabíamos que era de primeira. Fumanchú nosso cozinheiro tinha fama de ser o melhor cozinheiro de todas as patrulhas. Após a limpeza do vasilhame e do campo, saímos como se fossemos fazer uma excursão. Nosso material de sapa e alimentação era guardado na barraca de intendência. As linguiças penduradas no teto da barraca para durar mais.

Voltamos e nos escondemos em uma saliência a menos de oitenta metros do nosso campo. Não demorou. O ladrão chegou. Olhou para um lado, para o outro e como se fosse treinado abriu a porta da barraca. Levou o que podia. Voltou logo, levou mais. Romildo o monitor pé-ante-pé o prendeu dentro da barraca. O danado nem gritou. Punha a mão entre os olhos e mostrava seus belos dentes como se aquilo fosse uma diversão. O ladrão foi descoberto. Ele nem aí para nós. Sorrindo sempre e fazendo macaquice.

Ficamos seu amigo, ele ficou nosso amigo. Quando íamos acampar ele sempre aparecia. Sabia que ia comer de graça. Claro que não nos esquecíamos de levar suas duas dúzias de banana caturra. Sua preferida. Quinzinho nunca foi esquecido. Um macaquinho lindo, amável e educado. Claro, roubava comida, mas para ele não era roubo. Ali era seu habitat. Ele era o dono. Nascera ali. Tinha o seu direito. Nós éramos os invasores. Nas outras vezes nem chegávamos e ele saltava em nossas costas com aquele sorriso brejeiro.

O tempo passou, crescemos outras plagas, agora mais longe em busca de novas aventuras. Não esquecemos Quinzinho. Quando podíamos íamos lá de bicicleta sempre levando suas bananas. Mas nem tudo dura para sempre. Um dia não vimos mais Quinzinho. Para onde foi se morreu, se o levaram para um circo qualquer. Foram muitas saudades. Muitas. Quinzinho teve seu lugar de honra no livro da Patrulha Raposa. Acho que está lá até hoje!