Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

sábado, 22 de dezembro de 2012

Meus lindos netos, e uma noite maravilhosa de natal.



Lendas e sonhos de uma Noite de Natal. 
Meus lindos netos, e uma noite maravilhosa de natal.

                   Tudo que contei aconteceu em uma noite em um dia vinte e quatro de dezembro. O ano deixa prá lá. Todos os anos a mesma coisa. Família toda reunida. Na sala os netos faziam a maior algazarra. As mães de cabelo em pé. Celia querendo terminar a ceia e a “netaiada” não deixava. Chamei-os todos e sentados em circulo no tapete da sala disse que ia contar uma história. Eles nunca gostaram. Eu tentei algumas vezes, mas só a netinha de quatro e seis anos se interessava e isto poucas vezes. Como tusso muito ninguém gosta.

                    - Olhe, esta história aconteceu a muitos e muitos anos atrás. Uma época que eu gostava de acampar sozinho. Pegava minha mochila, meu bornal, meu farnel e minha bolsa de intendência e lá ia eu para algum lugar – Sozinho Vovó? Sim. Lembro que fui acampar na Floresta do Ouro Negro. Peguei o trem de ferro na Estação às oito da noite. Conhecia o caminho com a palma de minha mão. Pulava do trem em movimento na subida do Gato Preto próximo ao Túnel do Machado Cego. Isto por volta de meia noite. Mais duas horas de subida e eu chegava à Clareira do Chefe Osvaldo conforme eu a batizei. Dei uma parada. Olhei nos rostinhos de cada um para ver se estavam gostando. A netinha de dois meses não. Dormia a sono solto no colo de sua mãe. Os demais ainda prestavam atenção.

                     - Naquela noite não armei a minha lona. Não precisava. O céu estrelado e o orvalho que caia eram prenuncio de um lindo dia. Fiz um café, ascendi o meu cachimbo devagar e com calma. Naquela época fazia isto. Eu adorava o som noturno da floresta. Ainda não eram duas da manhã. Estava começando a cochilar quando fui acordado pela ave com o canto mais lindo que já tinha ouvido. O Uirapuru. Poucos têm este privilegio. Ele se esconde na parte mais fechada da mata. Muitos sonham em encontrá-lo. Diz a lenda, que quando o Uirapuru canta, até as outras aves se calam. Ele é pequeno, mas quando solta a voz meu Deus! Vi que ele se calou. Agora ouvia o som de uma viola. O que? Alí na floresta? Duas da manhã? Só podia ser caçadores. Lá fui eu pé ante pé e o que vi não acreditei.

                     - Ao som da viola o Uirapuru cantava e ao lado um macaco compenetrado. Em cima de um galho um falcão desconhecido sorria. Pensei que ali na floresta só eu era o admirador de tão belo espetáculo. A viola era magnificamente tocada pelo Urubu Rei. Ele não cantava. Só crocitava. Era enorme, na sua mão a viola tomava vida. Notei que alem de mim outros animais chegavam para aquele “Sarau” maravilhoso em plena Floresta do Ouro Negro. Vi um casal de quatis que se aninharam perto. Duas Onças enormes também sentaram na grama. Lobos de todos os tipos. Ciriemas, Emas, jacarés. Centenas de pássaros chegavam e em poucos instantes os melhores lugares tinham sido tomados. Dez capivaras, vinte tatus, dezena de cobras de todos os tipos – Nesta hora um neto me perguntou: Vovó tinha cobra? Tinha mas elas ali eram mansas.

                     - O “Sarau” ia de vento em popa. A Coruja Buraqueira se revezava com o Uirapuru. Até um Macaco Prego resolveu fazer graça. A floresta em peso compareceu. Nesta hora no melhor da festa uma Ema gigantesca veio gritando: Caçadores! Caçadores! Fujam todos! Gritei alto: Não, deixem comigo, eu dou uma lição neles e com a ajuda de vocês eles nunca mais vão voltar para a Floresta do Ouro Negro. Expliquei meu plano. Tudo combinado fui ao encontro dos caçadores. Os encontrei na Pedra do Menino Malvado. Gritei para eles – Saiam da minha floresta! Aqui não vão matar nenhum bicho! Eles deram risadas. Gargalhavam alto. Eram dois com duas espingardas velhas. – E quem vai nos impedir? Você? Um velhote que mal fica em pé? – Nesta hora eles foram cercados.

                        Centenas de animais. Contei oito onças pardas. Cinco Lobos cinzentos. Dezenas de Gaviões do Bico Vermelho. Quatis, cobras cascavéis, urutu, jararaca. Eles levaram o maior susto. Os bichos começaram a gritar ao seu modo – Hu, hu, hu! Nunca vi gente correr tanto. Sumiram nadando no Lago do Homem Devorado. Vi dezenas de jacarés nadando atrás deles. Risos. Voltamos ao ponto de reunião. O sarau continuou. Fiquei ali acampado por quatro dias. No meu campo sempre tinha meus amigos em minha volta. A Onça Parda da montanha não me abandonou um só instante. Voltei triste prometendo voltar um dia. A bicharada veio despedir.

                        O Gavião Vermelho me disse que preparasse minha manta. Fizesse dela como se fosse um paraquedas. Amarrei muito cipó. Mandaram-me sentar. Centenas de pássaros com seus bicos agarraram nos cipós e me levaram aos céus. Uma visão fantástica. Espetacular. Só quem viveu sabe como é. Deixaram-me próximo ao Túnel do Machado Cego e ali esperei o trem. Eles ficaram comigo até quando o trem apareceu em movimento. Despedi-me deles e com um salto me joguei no vagão de passageiros. Pela janela do trem vi que eles me acompanhavam. Uma pequena lagrima de saudades rolou pelo rosto.  Gritei alto prometendo que voltaria. Seu Delgado o condutor já me conhecia. Parei de contar. Vi que só tinha dois netos. Os demais estavam brincando de esconde, esconde. Risos. Eles não sei por que não gostam de minhas histórias. - Vovô isto é verdade ou mentira? Eu sorrindo disse para eles, olhem, é como nas histórias de Sherazade. As mil e uma noite de um sonho, assim acreditem se quiserem, pois boi não é vaca e feijão não é arroz! E quem quiser acreditar que conte dois! E ri a vontade.

                          E fomos todos para a mesa deglutir aquela ceia de natal maravilhosa que a Celia preparou. Saudades dos meus tempos de acampamentos. Saudades de quantas e quantas vezes acampei só. Saudades do Uirapuru e sua voz maravilhosa, saudades do grande violeiro o Urubu Rei da Floresta do Ouro Negro. Nem sempre as coisas boas duram para sempre. Ufa! Lembranças e lembranças de um tempo maravilhoso que não volta mais. Não acreditam em minhas histórias? Risos. Palavra de Escoteiro! Ora, Ora, sou Chefe, dizem que o Chefe pode tudo não? Risos.  

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O grande amor da Escoteira Nataly.



Lendas escoteiras.
O grande amor da Escoteira Nataly.

                       Nataly não estava acreditando. Nunca pensou em passar por aquela situação. Namorar alguém na tropa? Nunca! O grupo escoteiro Tesouro do Mar já teve experiências que não deram certo. Os chefes se reuniram e fizeram uma norma. Pequena, sem muitos artigos. Aconselhava a não ter namorados entre escoteiros e guias. Na sede e na saída era proibido. Se os pais concordassem desde que dessem testemunho pessoal ao Chefe, o namoro em casa ou em locais devidamente autorizados poderiam acontecer, no grupo não. Ela riu quando viu estas normas. Era Escoteira. Dedicava de corpo e alma a sua Patrulha, suas atividades e em tempo algum pensou em namorar alguém. Quando a norma foi entregue a todos ela mesmo comentou com Norberto da sua Patrulha – Estamos aqui para fazer escotismo e não namorar. Era firme nas suas palavras.

                      Nataly naquele setembro fez sua passagem para a Tropa Sênior. Eram dezesseis. Seis rapazes e dez moças. Escolheu a Patrulha Pico da Neblina e ali encontrou grandes amigos. Não esquecia sua Patrulha Quati. Sempre que podia fazia uma visita e as amigas que lá ficaram.  O disse me disse de quem gosta de quem havia entre os seniores e guias. Ela nunca deu ouvido para isto. Não era o que queria. Sonhava em ser Escoteira da Pátria e este era seu objetivo maior. Gostava da tropa. Animada, com mais liberdade de ação e de ideias. No Conselho de Tropa Sênior podia-se opinar e sugerir. Junto com eles fora em vários acampamentos regionais e até em um Jamboree. Mas sua preferencia mesmo era os acampamentos da tropa. Se possível longe da cidade, terreno desconhecido e sem casas perto. Nada que pudesse trazer a lembrança de civilização.

                        Tudo aconteceu no Acampamento em Agua Doce. Lindo local bem arborizado, um riacho gostoso para banho, muitos bambus para pioneirias. Seriam quatro dias e poderia ter sido o melhor acampamento de sua vida. Poderia mas não foi. No segundo dia à tarde o Chefe Landinho comentava sobre orientação, percurso de Giwell, leitura de mapa tema já discutido com o Monitor Robson da Patrulha e ele nos dava conhecimento da jornada do outro dia. Sem querer ela olhou para Paulo Roberto. Era um “bonitão” da tropa. Viu que ele olhava para ela e não tirava os olhos de sua direção. Ficou sem ação. Já o conhecia, não tinham muitas amizades fora do grupo e até na ultima “balada” na casa da Guia Marly pouco dançou com ele.

                        A noite ele se aproximou dela durante o jogo dos Feiticeiros da Morte. Perguntou se precisava de ajuda. Obrigada disse. Foi dormir impressionada. Sonhou com ele. Pela manhã acordou pensando nele. O amor chegava. A paixão adolescente florescia. Nataly estava ficando apaixonada. Tentou tirar ele da sua mente e não conseguia. Todo o acampamento para ela deixou de existir. O amor das atividades passou a ser o amor por ele. No terceiro dia só suspirava. Seu coração batia descompassadamente. Sua respiração quando olhava para ele acelerava. Sintomas de uma paixão? Ou de um grande amor chegando? Nunca em sua vida pensou que isto pudesse acontecer com ela. Afinal foram três dias de campo e tudo isso aconteceu tão rápido assim?

                       Na noite de sábado após o Fogo de Conselho as amigas se reuniram com os seniores para um “sarau” (cantigas de roça, desafios, poesias) e sob a supervisão de Chefe Vera ficaram até meia noite se divertindo. Paulo Roberto sentou ao seu lado. Ele a atraia. Irresistível. Seu coração como sempre deu pulos e pulos e sentiu sua mão suada quando ele a pegou. Era uma emoção forte demais. Ficaram rindo, brincando e se divertindo quando foi dada a ordem de recolher. Nataly achou que naquela noite não tinha dormido bem. Esqueceu por completo o acampamento. Esqueceu que ia tirar a especialidade de pioneiria. Esqueceu-se de tudo. Só pensava nele e já em plena madrugada dormiu. Sentiu um calor enorme no corpo e acordou assustada. Rezou. Pedia a Deus para que não se entregasse tanto aqueles devaneios.

                       No último dia após a inspeção e bandeira ele lhe fez um sinal. Ela não entendeu e ele repetiu. Subir o morro e encontrar com ele. E agora? Não sabia o que fazer e seu coração pediu que ela fosse. Atrás do bambuzal lá estava ele. Olhar lindo. Ele era o homem mais lindo que ela conhecera. Ele a tomou nos braços, a beijou e ela quase desmaiou. Ouviu vários jovens rindo e batendo palmas. – Ganhou a aposta Paulo Roberto. Disse que a beijaria e beijou. Nataly ficou vermelha. Aposta? Maldito! E ela acreditou? Saiu correndo e chorou. E como chorou. Sua monitora ficou preocupada. O acontecido logo, logo tomou conta da tropa. Nataly queria morrer. Ali mesmo a Chefe Vera fez um Conselho de Tropa. Pediu a cada um sua opinião do que tinha acontecido. Foi correto? Foi Escoteiro? Leal? Votou-se pela suspensão de Paulo Roberto por dois meses.

                          Ele não voltou mais a tropa. Dizem que sua família mudou para um bairro distante. Nataly aprendeu a lição. Por vários meses detestou todos os homens. Mas depois sentiu que na tropa o apoio moral foi grande. Os que apostaram e fizeram chacota pediram perdão. Eu não gosto de julgar. Sempre não fui a favor de tropas mistas. Mas aceito que tem muitas dando bons resultados. Se esta história serviu de lição para mim não sei. Para Nataly tenho certeza. Ela só foi namorar firme com dezoito anos. Casou aos vinte e dois. Tem dois lindos filhinhos gêmeos. A males que vem para o bem. As coisas ruins que acontecem hoje conosco, podem nos ajudar e muito no futuro. Nada como ter exemplos e experiências para achar a trilha certa. A trilha que conduz ao Caminho para o Sucesso! 

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Só escoteiros ainda podem viver e sentir a natureza.



Crônicas de um Chefe escoteiro.
Só escoteiros ainda podem viver e sentir a natureza.
                      
                            Eu sei que tem muitos de nós escoteiros que tem uma queda por lugares lindos, onde podemos sentar e ficar horas e horas sem piscar, só a observar a paisagem, sentindo o cheiro da terra, o perfume das flores silvestres, criar histórias, lembrar-se do seu passado tudo no mais completo silêncio. Dizem que assim fazem os poetas, os que tiveram grandes amores, os amantes da natureza e claro, aqueles escoteiros especiais que vivem e sonham com as campinas verdejantes e floridas, os vales e bosques, as montanhas, as gargantas enormes, os despenhadeiros longínquos e os picos mais distantes onde um dia assentaram acampamento.
                           
                           Eu sempre amei fazer fotos onde as paisagens se destacavam. Quem sabe foi porque vivi ao vivo e a cores a beleza de um Escoteiro sonhador que aprecia a vida selvagem e a natureza intacta em uma floresta qualquer. Elas as paisagens são para mim uma maneira de me aproximar mais do criador. Sou um Escoteiro privilegiado. Consegui viajar por este mundo de Deus e ver com meus próprios olhos as belas paisagens que ficaram na memória para sempre.

                          Na serra da Piedade, consegui um momento inesquecível. Uma vista de tirar o folego. Estava sentado em uma pedra enorme, bem no seu cume e olhando um infinito horizonte, e uma pequena nuvem deixou cair pequenos pingos de chuva. Misturavam-se com o sol e o vento fazendo enormes arcos íris bem próximo a mim. Difícil esquecer. Que espetáculo. Na floresta do Papagaio levantei cedo, abri a porta da barraca e outro espetáculo maravilhoso. Milhares de borboletas de todas as cores bem próximos faziam seus bailados no ar. Fiquei hipnotizado. No Itatiaia também sentado em uma pedra olhando o horizonte vi ao longe uma águia, enorme, os raios de sol sobre ela e parecia ser dourada e sendo levada pelo vento. Aos poucos ela ia se aproximado e quase próximo fez um bailado impossível e pegou no ar um pequeno tiziu, que esqueceu os perigos que poderia correr ali.

          Uma tarde em um acampamento. Sentado a beira de um lago, vi uma pequena sucuri se aproximar nadando em curva sem fazer barulho e engolir de uma vez só um pequeno sapinho que tomava sol em cima de uma folha qualquer. Mas espetáculo mesmo foi na Cachoeira dos Sonhos. Época da Piracema. Maravilhoso. A tentativa dos milhares de peixes, de todos os tamanhos, os saltos ornamentais sem desistir nunca tentando subir a cachoeira procurando um local onde pudessem cumprir seu destino e eu sabia que muitos não iam conseguir. Fiquei ali por horas e horas. Eu gostava muito de acampar sozinho. Uma ou duas vezes lá ia eu em busca dos meus sonhos. Não existe nada mais belo. Sem vozes humanas, sem barulho, sem telefone, sem televisão e só você a sentir a natureza assumindo e encobrindo você da cabeça aos pés. É nesta hora que se adquire a percepção da visão, do olfato, do tato e do paladar e a audição é perfeita. Ninguém mais para dizer sim ou não. À noite, sem falar, sem se mexer a ver o balet dos vagalumes, os grilos saltitantes no meio deles, as formigas serviçais, um tatu que é iluminado nos seus olhos pela chama da fogueira. É incrivelmente belo.

          Sempre tirei lindas fotos. Tinha 150 slides inesquecíveis. Em 1979, um jovem respondia sobre Baden Powell no SBT. A escoteirada vibrando e torcendo. Alguém me pediu as fotos para o SBT passar durante as perguntas. – Chefe vamos mostrar o escotismo para o Brasil! Fiz minha boa ação. Não me devolveram as fotos. Fui até lá inúmeras vezes. Já nem existem mais. As mais lindas fotos que eu tirei por este mundão onde fui. Gosto de fotos lindas, de paisagens lindas, vistas ao vivo e a cores. Não posso mais ver isto. Não posso. Mas sou feliz, pois tive a oportunidade de ver, de sentir o vento no rosto, de ver o nascer e o por do sol em terras distantes muito alem daqui. Onde fui avistei eu vi o mais lindo por do sol de um monte próximo ao mar. Gaivotas dançando no ar. Coisas fantásticas deste mundo que os escoteiros vivem e sabem apreciar.

           Bem aventurados os que ainda podem fazer tudo isto. Bem aventurados o que militam no escotismo, pois mesmo não sendo anjo e nem profeta eu digo: É deles, só deles esta esplêndida natureza que Deus no deu.          

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O solitário Eddy. O leão Branco da Montanha dos Sete Cavalos.


Lendas escoteiras
O solitário Eddy. O leão Branco da Montanha dos Sete Cavalos.

                    “Azanka, Malenka, Lelenka - Lita, kalita Zazá – Rá, rá, rá, Raposa”! Ninguém esquece. O grito de quem já foi um patrulheiro fica marcado para sempre. Eu era um deles, da Raposa. Um ano e meio na tropa. Era meu mundo naquela época. Não havia outro. O escotismo para mim estava no meu sangue, na minha alma e no meu coração. Naquela quinta do mês de julho, lá pelos idos de 1952 combinamos com o Seu Leôncio de pegar uma carona em seu Carro de Boi até o seu sítio, nas proximidades da Colina dos Sete Cavalos. O Chefe Jessé amigo dele aprovou um acampamento nosso em suas terras de seis dias. Prometeu passar por lá pelo menos duas vezes e Seu Leôncio disse que tomaria conta de nós.

                   Quem um dia teve a felicidade de viajar num carro de boi, Jamais esqueceu. Aquele zumbido infernal com o tempo é como se fosse uma suave melodia de uma recordação sem igual. Foram duas horas e meia de sorrisos, e a gente ficava cantando, gritando, dando vivas e olhando a Canga, o Canzil, os Arreios, o Cabeçalho, e tentando descobrir o cantar das rodas no Cocão, na Cheda, no Recavem e tantas coisas lindas que compõe o carro de boi. Seu Leôncio era bom carreiro. Usava com maestria a vara do ferrão com dois guizos sem machucar os bois. Chegamos à subida das Colinas dos Sete Cavalos lá pelas onze da manhã. Trabalho duro. Armar campo. Mesa, toldos, fogão suspenso, lenheiro, aguadeiro e o Jairinho era muito bom na construção de um pórtico.

                   Eu gostava daquela Patrulha. Éramos amigos de verdade. Depois do jantar ainda à tardinha, sentados no chão e tomando um cafezinho próxima a mesa (faltavam os bancos) levamos o maior susto. Susto tal que nem correr deu ânimo. Minhas pernas tremiam como se fossem varas verdes. Bem no centro do pórtico um enorme Leão Branco! Isso mesmo! Um Leão Branco. Parado a nos olhar. Eu comecei a molhar as calças e acho que os demais também. Lembramos quando o Chefe Jessé nos instruir quando víssemos uma onça. – Não correr Jamais. Todos olham nos olhos dela. Um de nós passo a passo para trás tenta dar a volta. Sobe em uma árvore e lá grita, Faz barulho para chamar a atenção do animal. Quando conseguisse todos corriam e subiam na primeira árvore que encontrassem. Eu era o que estava mais atrás. Não fiz nada disto. Um medo terrível. Meu corpo parecia um tronco fincado no chão. Diabos! Não sei o que deu em Marino. Como se estivesse hipnotizado foi devagarinho até o leão. Ele afagou sua juba. O Leão Lambeu os pés de Marino. Ninguém acreditava no que via.

                     Assim começou a fantástica amizade de sete escoteiros e um Leão Branco. Marino o chamou de Eddy. O dia inteiro ele brincava conosco em nosso campo de Patrulha. Chegou até a nadar junto a nós no córrego da Canoa Quebrada. A noite ele sumia para bem de manhãzinha voltar. Muitas vezes ainda dormindo ele abria as portas das barracas e nos lambia fazendo cocegas. Amei aquele Leão. Ninguém pensou o que ele estaria fazendo ali. Ninguém lembrou como ele se alimentava. No sábado Seu Leôncio viu. Assustou. Pegamos na mão dele e o levamos até o Eddy. Ele não acreditava. Manso como um potrinho recém-nascido. Conversou com nosso Monitor. Natanael nos contou depois. Eddy estava matando para comer bezerros e pequenas ovelhas dos fazendeiros da redondeza. Queriam matá-lo. Sabiam que ele havia fugido do circo Garcia há cinco meses atrás. Tentaram capturá-lo e até alguns homens armados percorreram os montes, vales, campinas e tantos outros lugares tentando encontrá-lo e matá-lo e não conseguiram.

                   Eu não podia acreditar. Matar o Eddy? Nunca. Preferia morrer com ele. No domingo pela manhã vimos mais de vinte homens armados junto com Seu Leôncio. Eddy estava conosco brincando. Gritaram para sairmos de perto. Eu não sai. Agarrei o pescoço de Eddy. Ele me deu um puxão e foi correndo em cima dos homens armados. Um verdadeiro tiroteio. Nós gritávamos para não matá-lo. Eddy gemeu forte, virou para nós e como se fosse um último adeus abanou seu rabo e mexeu com sua enorme juba. Caiu morto no chão crivado de balas. Tinha sangue em todo seu corpo. Eu corri e fiquei abraçado com Eddy. Eu gritava e chorava. Chamava os homens de assassinos. – Mataram meu amigo! Malditos! Vão para o inferno! Não sabia o que pensar, coisas de meninos coisa de escoteiros que amam os animais.

               Durante vários meses nossa Patrulha não sabia o que falar. Nas reuniões ficávamos por muito tempo em nosso canto de patrulha, calados sem nada dizer a não ser ter os olhos vermelhos e cheio de lágrimas. De vez em quando um olhava para o outro e soluçava forte. Papai e Mamãe tentaram me consolar. Tentaram explicar que um leão tem um alto custo para alimentar. Come mais de oito quilos de carne por dia. Ele estava matando os animais dos fazendeiros. Nada. Isto para mim nada adiantava. Eu amei o Eddy enquanto vivo e o amava agora também.

           “Azanka, Malenka, Lelenka - Lita, kalita Zazá – Rá rá rá, Raposa”! O tempo passou. Mas sempre me lembrava do Eddy. Um dia encontramos toda a Patrulha no Bar do Elias. Já adultos. Eu com mais de vinte e cinco anos. Tomamos varias cervejas e comemos linguicinhas picadinha com cebolas fritas, famosas na cidade.  E quem se lembra do Eddy? Perguntou Afonsinho. Pronto. Marmanjos chorando. Quem nos visse naquela mesa iria ver sete marmanjos chorando. Ficamos no bar por mais de cinco horas, sempre a lembrar dos belos dias que passamos com o Eddy. E triste ter belas histórias para contar como esta sem um final feliz. Um Leão Branco que vivia na Montanha dos Sete Cavalos. Nunca mais voltamos lá. Para que? Para chorar? Para lembrar-nos de um Leão que amamos e que nos tiraram assim? Hoje sei que foi a melhor decisão. Mas lá no fundo do meu coração eu não aceito isto. Como conviver com o Eddy para sempre eu não tinha explicação. Mas sua morte foi dura demais para enfrentar.

          “Azanka, Malenka, Lelenka - Lita, kalita Zazá – Rá, rá, rá, Raposa”! Minha Patrulha. Patrulha que amei por muitos anos. Patrulha com belas histórias que nos marcaram para sempre. Marquito, Marino, Natanael, Jovelino, Afonsinho, Jairinho e eu. Onde andam vocês? Saudades de todos. Imensas Saudades também do Eddy. O Leão Branco da Montanha dos Sete Cavalos que amei e ficou para sempre no meu coração.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Nem Sigmund Freud explica.



Crônicas de um Chefe Escoteiro.
Nem Sigmund Freud explica.
                       Está tudo complicado. Charles Mingus comentou que tornar o simples em complicado é fácil, tornar o complicado em simples é criatividade. Verdade? Freud se fosse me analisar diria ao final da seção: Seu caso transcende o inconsciente e seu mecanismo de repressão só pode ser curado através da psicopatologia. Risos. O pior que nem eu entendo o que é isto. Ontem e hoje de madrugada eu estava me analisando. Diabos! Não cheguei a uma conclusão concreta. Minha vida pessoal só me deu alegrias, mas tive momentos péssimos. A de Escoteiro não reclamo das atividades que fiz e sim dos homens que nos dirigem. Errado? Claro que sim. Não vejo as coisas boas e devem ter muitas. Vejamos algumas dentre as centenas que poderia escrever:

- Todos sabem que escrevo muito, as histórias vem com facilidade, mas os artigos? Estes tenho que ficar pensando, pensando e pensado e quando termino não gosto do que leio. Por causa deles muitos me viraram as costas. Paciência. Não dá para servir a Deus e ao “Diabo” ao mesmo tempo. Aqui mesmo no face muitos se afastaram. Principalmente os Insígnias. Sobraram poucos. No nosso movimento temos uma disciplina tão grande que basta um dirigente comentar sobre isto ou aquilo que se for contra eles fogem como o Diabo na cruz. (estou falando muito no Diabo hoje, desculpem). Claro muito do que escrevo não passa na mente de alguns que eu poderia estar certo. Nunca. Que disciplina eim? E então quando estamos procurando subir os degraus da fama, fazendo tudo que o Chefe mandar, aí que o “bicho pega”. A posição de dirigente, de IM, de Formador de Diretor de... Agradam. Os faz sentir superiores e olhe, a maioria jura que não. Jura que ainda é o mesmo, jura que é amigo e seu sorriso não nega. Risos. Que sorriso!

- Nunca fui bem quisto pelos dirigentes. Fui um deles por um golpe do destino. Viva Darcy Malta. Este sim. Um verdadeiro dirigente. Outra história para o futuro. Também não sou um sortudo Escoteiro. Não sou. Lembro-me dos meus cursos, muitos adoraram, mas teve alguns que santa paciência! Estava eu em um Estado Brasileiro na casa de um amigo, esperando o inicio de um curso que ia dar. Na última hora surgiu um imprevisto e ele não podia me levar ao local do curso. Disse que chamaria um taxi. Perguntei se podia usar a moto – Claro! Disse. Choveu muito na madrugada. Na estradinha que levava ao campo muita lama. Cai. A moto caiu sobre minha perna. Não consegui tirar. Só quando veio um cursante e me ajudou. Meu uniforme de campo ficou em pandarecos. Ainda bem que tinha um social. Começou o curso. A turma das compras não havia chegado. Eram dois pioneiros e dois seniores. Eles mesmos eram encarregados de tudo. Como era um curso de Lobos eles eram os cozinheiros. Onze, doze, uma e nada. A turma varada de fome. Almoço? Quatro da tarde. Sempre tirei a foto oficial no primeiro dia. Uniforme ainda mais apresentável. Todos formados, mão esquerda estendida sobre o braço direito. Onde estava o tronco? Custaram a achar um. E o machado? Cego! Completamente cego. Não entrava na acha. Quando conseguimos abelhas africanas apareceram e foi um verdadeiro pandemônio. Um Deus nos acuda!

- Uma vez convidei uma turma de notáveis chefes escoteiros de outro estado. Vamos sugerir a UEB mudanças na estrutura dela. Do RI, dos Estatutos. Nada de mudar o método e o programa. O programa discutiremos depois. Sempre me bati pela democracia. Muitos vieram. Em uma reunião mais de quarenta. Depois foi diminuindo, diminuindo até que só ficamos em seis. “Caramba”, o que ouve? Um membro da Equipe de Formação me disse que estavam sendo pressionados pelos dirigentes. Disseram a ele que eu era “persona non grata”. Fiquei como sempre fico pensativo e querendo dar o troco. Vamos fazer uma chapa e concorrer. Perdemos. Recebi uma cartinha pedindo de volta meu lenço de IM, o anel de Giwell, o certificado e o colar. Por quê? Perguntei. Foi exonerado da Equipe. Devolver eu? Faz parte das normas da UEB. Não era meu? E o duro que dei nos cursos, e a mão de obra dos cadernos? Não valeram, pertence a UEB. E agora? Venham buscar em minha casa, mas venham armados. Estou doido para dar uns sopapos em uns dirigentes. Risos. Brincadeira. Sou de paz. Só soquei uns cinco por que me encheram o “saco”.  Nunca falaram mais nada.

                   Porque tudo isto? Fiz um artigo polêmico sobre os processos que a UEB está abrindo com as outras associações escoteiras. Motivo? A UEB alega milhares. Acha que tem seus direitos. Eu não acho. Os outros? Estão se defendendo e ganhando todas. Onde está a razão? Na casa onde falta pão todo mundo grita e ninguém tem razão. Na minha mente não existem santos de ambos os lados, mas e a meninada? Merece ser crucificada? – Ainda não publiquei o artigo. Comparei estes atos com a Inquisição da Idade Media. Mandei para vinte amigos.  Muitos não gostaram. Os do outro lado bateram palmas os do lado da UEB foram mais comedidos, mas foram contra meus dizeres. Ainda estou pensando se publico ou não. Vai dar o que falar. Na minha varanda Freudiana, nada na mente. Mas que Diabos! (de novo?) não brigo pela democracia? Não brigo pelos direitos e deveres? Um tentou me ensinar os direitos de um lado. Os conheço de cor. Escrevi lá que para os amigos tudo, para os inimigos a lei. Estamos virando uma oligarquia e muitos ainda batem continência. Fazer o que?

                    Interessante que acho estar malhando em ferro frio. Poucos pensam como eu. Por acaso já viram alguém do CAN, da DEN, da Equipe de Formação postar artigos aqui ou em outros sites similares? Alguém deles criaram um grupo para ajudar os escotistas nas suas labutas que enfrentam em suas sessões? Ou pelo menos alguns deles discordaram do que escrevi aqui? Não. Eles acham que os cursos são para isto. E ainda tem o Assessor Pessoal. Somente aqueles que por um motivo ou outro e que eu chamo de “Politicamente Corretos” se manifestam. Quer beber agua? Procure-os. Quer saber o que decidiram? Procure-os. Não pense que um deles um dia vai procurá-lo em seu grupo, ou vai fazer uma visita em sua casa. Isto nunca vai acontecer a não ser que sejam vizinhos ou ele ainda aparece no grupo de origem.    

                   Sempre lutei do lado errado. Devia ter continuado a bajular os dirigentes. A defendê-los com unhas e dentes. Se o fizesse teria hoje todas as medalhas do mundo. Quem sabe seria ainda um figurão com quatro tacos? Quem sabe seria consultado em tudo que fazem, pois não costumam consultar ninguém? Bah! E caramba, que disciplina. Todos fazem continência. Um respeito tal que se houvesse salário para estes dirigentes seria o fim do mundo. Acho que muitos ao se dirigirem a eles deveriam ajoelhar e dizer: - Louvado seja nossos dirigentes! Mas amigos (se é que tenho mesmo muitos) tem gente boa lá. Nos estados também. Pena que formaram uma pequena “casta”, uma panela que para entrar tem que ter muita vontade ou “saco”. Desculpem-me meu palavreado hoje. Prometo não repetir. Não é para qualquer um. Alguns estados só entram ou são eleitos quem os donos do poder decide. E ainda dizem que podemos tudo. Existe abertura nos Estatutos e no RI. Dá vontade de rir. E devia, pois não dizem que rir é o melhor remédio? E ainda dizem que o riso não é uma homenagem que os idiotas prestam ao gênio? Essa não! (brincadeira!)