Uma linda historia escoteira

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Era uma vez...

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

“Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”



Lendas escoteiras.
“Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”

                        Conheci Margarida em uma jornada que eu e mais quatro seniores fazíamos quando resolvemos ir até Malacacheta, a convite do Chefe Mauricio que disse ter um grupo novo lá. Eu, Israel, Laerte, Romildo e Chiquinho éramos inseparáveis. A distância de nossa cidade e a dele não era grande. Acredito que uns duzentos e cinquenta quilômetros. Como saímos em uma sexta quase as três da tarde, resolvemos pernoitar próximo ao Riacho das Vertentes. Uma lua linda não montamos barraca. Íamos dormir sob as estrelas. Nossa sopinha Estava quase no ponto. Escurecia quando ele chegou. A pé. Magro, barbudo, uma fileira de dente todos cariados. Usava perneiras, pois era uma região espinhosa. Chapéu de couro. No ombro seu fuzil inseparável que ele chamava de Loló. Amarrado na barriga um enorme colt 45. Depois fiquei sabendo que em cada perna tinha um punhal escondido.

                      Posso me adentrá? Falou baixinho. Olhamos espantados. Ele sério. – Me chamo Margarida, dá para comer com vocês? – Claro eu disse. Ficamos de olho e atento no que ele ia fazer. Coragem? Nada disto, mas dizem que ficar alerta faz bem em toda e qualquer ocasião. Sentou tirou um prato sujo do seu bornal e Israel encheu. Comeu feito um danado. Não pediu mais. Só água. Tínhamos café no bule esquentando no canto do fogão tropeiro. Bebeu com gosto. – Falou pouco. Meu nome é Margarida, meu pai me deu. Nunca mudei. Por causa dele matei muita gente. Se me chamam sem rir, tudo bem se derem um risinho esquento o bucho dele. – Olhei para Israel e ele piscou. Queria rir. Meu Deus! Não deixe ele rir!

                     - Não precisam ficar com medo. Me trataram bem. Vou embora lá pelas três da manhã. Podem dormir tranquilos. Enrosquei em minha capa preta em volta do fogo. – Você nasceu onde? Perguntei. – Em Barra Dourada. Próximo a nascente do Paraopeba. Lembrei-me do rio. Cascalho imundo. Pobre do rio. Estragaram ele tentando achar um ouro que não tinha. Até hoje as máquinas estão lá sujando o rio. Chiquinho queria saber mais. – Matou quantos Senhor Margarida? – Não me chame de Senhor. Senhor é o Senhor seu pai! – Putz grila! Mas se quer saber matei mais de trinta. Muitos porque riram do meu nome. Maldita hora que meu pai me batizou. Queria uma menina e nasci macho. Agora não tenho onde ficar. A policia de captura sempre está atrás de mim.

                       Fiquei calado. Israel me olhava e piscava os olhos. Margarida desconfiou. - Porque esta piscação? Nada Margarida. Israel tem um defeito na pálpebra. – E que merda é esta de pálpebra? Danou-se! Custei para explicar. Já estava tremendo. Margarida passou boa parte da noite sentado. Eu não consegui dormir. Fingia que dormia. Às três da manhã juntou suas coisas, um bornal que devia levar suas balas, seu fuzil e já ia partir quando dei ele um farnel de biscoito de polvilho. Agradeceu, ficou em posição de sentido, gritou Sempre Alerta e partiu sem sorrir. Consegui cochilar até as seis. Ouvi um tropel de cavalos. Cinco soldados e um Capitão. Deviam ser da tal policia de captura.

                       Ninguém apeou. O Capitão perguntou – Viram um jagunço magro, barbudo, armado até os dentes por estas bandas? E agora José? O Escoteiro tem uma só palavra falar o que? – Não Senhor. Chegamos aqui às duas da manhã. Só deu para fazer uma sopinha um café e já íamos partir. – Vão para onde? Malacacheta Senhor Capitão. Fazer o que lá? Um Chefe Escoteiro nos convidou. Nos olhou como quem não acredita. Deu até logo e partiu. Pegamos as bicicletas, arrumamos tudo e quando íamos partir um barulho no bosque e surgiu Margarida. – Ainda bem que não disseram nada, falou. Estava com a Loló (fuzil) armada e se dissesse que me viram iam levar uns tiros no rabo!

                     Foi embora cantando. “Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”. Resolvemos voltar para nossa cidade. O Chefe Mauricio que nos desculpasse. Para dizer a verdade estava com as calças toda molhada e outros com elas borradas. Não dava mais para prosseguir. Nunca mais ouvimos falar de Margarida. Do capitão não. Era famoso. Quando a cadeia estava cheia, pegava uns ladrõezinhos de fancaria colocava em fila e saiam pela cidade e fazendo eles gritarem – Roubei galinha! Roubei o porquinho da dona Noêmia. Depois soltava. Pois é. Meu escotismo tem muitas histórias. Diferente de hoje, mas sei que tem muitos que ainda fazem belas aventuras. E viva o Margarida se já não morreu!    

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