Lendas escoteiras
O passo do elefantinho.
“O circo chegou na
cidade,
É tempo de pensar no que
se viu
Montaram uma tenda bem
grande,
“Uma tenda do tamanho do
Brasil”!
Interessante.
A vida da gente é sempre cheia de surpresas e quando nos lembramos das boas
damos um enorme sorriso. Estava eu absorto e escrevendo quando começou a tocar “O
Passo do Elefantinho” com a orquestra de Henry Mancini (Baby Elephant Walk,
escrito em 1961 por este compositor para o filme Hatari). Adoro esta música
principalmente porque ela me faz lembrar-se de Rafaella, uma lobinha morena,
sete anos, miudinha e sempre de fisionomia séria. Dificilmente sorria para alguém.
Nunca faltou uma reunião e mesmo doente chorava para ir. Uma vez chorou tanto
que seus pais com sua charrete (não tinham carro) a levaram agasalhada e
enrolada em uma manta para a sede. E quem disse que adiantou a Akelá, o Balu ou
a Kaa falar com ela? Necas! Ficou lá sentada em uma cadeira só olhando e sem
sorrir!
O Circo dos
Palhaços Impossíveis estava na cidade. Naquela época onde armavam sua tenda
eles faziam questão do desfile apoteótico. Eles sempre se instalavam as margens
da Estrada do Fim do Mundo. Chamava-se assim porque era esburacada, pontes
caídas, assaltantes enfim, era mesmo um fim de mundo. Não se chegava a lugar
algum. Nem bem o circo chegou e um carro de som saiu às ruas anunciando as
atrações. Depois vinha atrás palhaços, equilibristas, artistas e animais
exóticos. A rua enchia de gente e nas janelas apinhavam-se todos. A meninada
vibrava correndo atrás e muitos davam plantão junto ao circo na sua montagem para
ver o movimento. A maioria dos jovens do Grupo Escoteiro Olavo Bilac estavam
lá. Boquiabertos. Vendo aquela parafernália sendo montada. Os pais sorriam de
contentes, pois pelos menos os filhos tinham aonde ir e os sonhos das
molecagens agora tinham uma pausa.
Rafaella viu
o desfile. Não sorriu, mas quando o elefante passou com a Rainha de Sabá
sentada em seu dorso seus olhos brilharam. Sua mãe e seu pai não notaram seu
súbito interesse. Eles mesmos achavam estranho dela não sorrir. Pessoas
humildes sem posses consultas a médicos especialistas estava fora de cogitação.
Chefe Noravinio em reunião dos chefes do grupo sugeriu que o grupo todo fosse em
um espetáculo. Época de férias poderiam combinar com o dono do Circo e quem
sabe seria mais barato? Dito e feito. O Senhor Wiener Neustadt proprietário do
circo exigiu que fosse chamado de Arquiduque Maximiliano, pois era trineto do
próprio. Discutir para que? – Sexta, às dezesseis horas. O circo vai apresentar
um espetáculo especial para os Escoteiros falou. Uma gentileza de Arquiduque
Maximiliano, lembrem-se disto! Não irão pagar nada!
Uma festa.
Mais de cento e quarenta membros. Grupo grande. Junto outros tantos de
familiares e penetras aproveitando a “boca livre”. Duas horas todos na porta.
Uniformizados é claro. Rafaella rondava o circo. Viu a jaula dos animais e
próximo o elefante. Tentou aproximar. Não deixaram. O espetáculo começou. Uma
bandinha, o apresentador – Respeitável publico! Seguiu os artistas, equilibristas,
mágicos, saltimbancos e os animais. O brilho, a beleza e o colorido dava asas a
imaginação e a fantasia dos escoteiros. Eram levados para um mundo diferente.
Um mundo de sonhos, das alegrias e os palhaços? Incríveis! A escoteirada pulava
de alegria. Mas Rafaella só olhava. Não sorria. Um elefante adentrou na arena.
Junto um menino vestido de indiano com um turbante azul. O elefante o seguia.
Rafaella ficou de pé. Sorriu! Rafaella sorria! Ninguém a viu sorrindo, acho que
só eu.
Ninguém
prestava atenção em ninguém. Naquela hora só a arena e os espetáculos de
sonhos, de azuis, amarelos, vermelhos e de mil cores que estavam sendo visto
pelos escoteiros. Só viram Rafaella na Arena. Susto! Gritaram – Rafaella volte!
Ela não ouvia ninguém. Foi até o elefante. O tocou na tromba. O elefante olhou
para ela. Ajoelhou-se e sentou. A pegou com a tromba e bramindo a jogou no ar
pegando-a novamente. Rafaella dava gargalhadas e a escoteirada acompanhou. Seu
Arquiduque Maximiliano veio correndo. Mas o elefante levantando a colocou em
seu dorso e ficava em pé sempre segurando Rafaella com a trompa.
O
adestrador de animais conseguiu retirar Rafaella de lá, mas ela gritava para não
sair. Na arquibancada ela parou de rir. Ninguém entendeu nada. Rafaella sorrateiramente
pulou por baixo da arquibancada, passou por baixo da lona e quando procuraram
por ela foram encontrar junto ao elefante atrás do circo e dando risadas.
Interessante que o elefante gostava dela. O circo ficou na cidade nove dias.
Embarcaram em um trem da Leopoldina rumo à outra cidade. Rafaella sumiu. Cidade
pasmada! Impossível diziam. Aqui não tem disso. Procuras mil. Rafaella tinha
entrado no vagão do elefante como clandestina. Descobriram quando chegaram a
Nuvem Azul. Seu Arquiduque Maximiliano passou um telegrama para buscá-la. Interessante.
Rafaella voltou a sorrir. Quando voltou a Alcatéia foi recebida como a heroína
de aventuras. Palmas e abraços. Valeu Rafaella. Um dia não há vi mais. Soube
que seus pais foram morar em uma fazenda de um parente que morreu. Quem sabe lá
junto à natureza ela não esteja sorrindo junto a um Lobo Guará cinzento e
brincando pelas campinas verdejantes? Rafaella, um sonho de menina. Uma lobinha
que soube fazer sua própria aventura.
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