Histórias de
Fogo de Conselho.
A Morada do
Fantasma.
Os monitores escolheram um local próximo a
uma pequena mata, onde existia uma casa abandonada e todos concordaram. Ficava
a uns 400 metros do acampamento. A Patrulha de serviço
não perdeu tempo. Logo que chegaram ela preparou o fogo dentro dos padrões
técnicos para evitar incêndios e tinha que ser ascendida com no máximo dois
palitos de fósforos. Se não conseguissem, outra patrulha assumiria o que
dificilmente acontecia.
Não havia um “Animador de Fogo de
Conselho”. Este iria surgir naturalmente no desenrolar da noite. Qualquer
programa escrito estava fora de cogitação. Não iriam se prender a um roteiro,
pois ali, naquela noite e em todas às outras a participação era completa.
Sabiam o que queriam e iriam fazer conforme a Tradição de Tropa. Se havia uma
coisa que detestavam, era o tal Lampião do Conselho. Dava até vontade de rir do
tal Lampião. Diziam que um bom mateiro ascende o fogo em qualquer tempo e em
qualquer lugar! Eu acreditava, pois o adestramento da tropa sempre foi um dos
melhores. Enquanto isto os demais não se afastavam muito, pois a
escuridão da noite e o lugar davam calafrios. (não havia luar)
Todos foram chamados e se assentaram a bel
prazer, enquanto um Escoteiro ascendia o fogo. Nesta hora, ficaram de pé, e
como tradição antiga invocaram os Espíritos dos Ventos e a viva voz,
cantaram a Canção do Fogo de Conselho. Cantavam com gosto. Às chamas já se
esticavam aos céus quando terminaram. Ouviram alguém bater palmas. Não eram
eles. Se havia alguém escondido para amedrontar não seria com aquela Tropa. Um
dos chefes deu uma busca em volta da casa e dentro dela. Nada.
Continuaram. Logo uma Patrulha imitava
outra quando da enchente (no primeiro dia uma forte chuva encheu as barracas de
lama). Surgiram palmas escoteiras inventadas na hora. Uma parada para conversa,
um chocolate quente, uma mordida num biscoito. Conversas paralelas. Alguém
alimenta o fogo, um dedilha o violão e outro começa a cantar. Alguns acompanham
dois se encaminham para o centro da arena e começam a representar um Chefe e um
Monitor. Risadas, palmas.
Pedem um jogo, um Monitor se oferece para
fazer um novo, aprendido em outra atividade. Um grito. Não muito alto. A tropa
se cala. É brincadeira de alguém. Eles aceitam a participação do “Fantasma”.
Vai quebrar a cara pensam. Não foi a primeira vez. Ouvem outras em outros
acampamentos. Agora não seriam surpreendidos. Continuam às canções,
improvisações, batem papos, jogos e até um pequeno Adestramento de primeiros
socorros. Não faltou o Contador de Histórias, e nessa o monitor mais
antigo se destacava. Era assim o fogo da Tropa.
Às brasas começaram a aparecer. A lenha foi
terminando e todos demonstravam sono. Uma boca abre aqui, outra ali. A noite
avançou sem ninguém perceber. Um Chefe convida a todos para encerrarem com a
Cadeia da Fraternidade. Começam a cantar e param. Todos olham para dentro da
casa e vêem uma luz azul brilhante. Ficam estáticos. Alguns vão até lá e dentro
da casa não há luz! - Já existem tremedeiras. Sem falar voltam para o
acampamento. Ninguém quer ir à frente nem ficar atrás. Dormiram encostados uns
nos outros mesmo com a chefia alegrando e encorajando todos.
No dia seguinte, após o desarme do campo,
na cerimônia da Bandeira, um morador das proximidades estava presente
assistindo de longe. Um Chefe o convidou para participar na ferradura. Ele veio
sem jeito e ali permaneceu até o final. Uma rodinha se formou em redor dele, e
ficaram sabendo a historia da “Morada do Fantasma”:
- A casa foi construída pôr um jovem, -
dizia - filho de um “meeiro” (usa a terra de uma fazenda para plantar, e
paga parte da colheita ao dono) quando se casou. Com menos de quatro meses, ele
matou a mulher porque achou que esta o traia. Não era verdade. Foi preso e
condenado há vários anos de prisão. Ninguém sabe onde está e quando vai sair da
cadeia. O que todos sabem é que o espírito ou “fantasma” da mulher não
abandonou a casa e até hoje e a mantém limpa e arrumada, mesmo sem móveis sem
nada. Um padre já benzeu a casa, mas ela não sai de lá.
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