Lendas de um
Chefe Escoteiro.
A canção que
ela fez para mim!
Naquele sábado fui para a
reunião meio desanimado. Não sei por quê. Muitas reuniões parados na sede,
nenhuma excursão, jornada ou até um acampamento de fim de semana. Para ser
franco eu também não mexi uma palha para animar a patrulha. Na sede ninguém. Por
quê? Sempre nos encontramos ali antes do inicio, falar dos outros, papear,
“causos” não era uma rotina? Fui para o pátio da sede. Então eu a vi. Fiquei
sem fala. Linda! Impossivelmente linda! Uma princesa seria? Desceu das nuvens
direto na sede? Ou quem sabe um anjo que Deus mandou para dar novo ânimo aos
seniores? Olhe meu coração disparou. Minha mente deixava o corpo e se
transportava para os mais lindos locais que já tinha ido. Fui à Cachoeira do
Sonho, fui à Montanha Das Borboletas Douradas, fui até no despenhadeiro da Mil
Mortes. Joguei-me lá de cima. Sabia que não ia morrer.
Foi então que percebi. Lá
estavam os Seniores. Todos eles. Não faltou ninguém. Em pé encostados na parede
da sede, e como eu não tiravam os olhos da linda moça dos cabelos dourados.
Cachos despencando como na Cascata do Sol Nascente. Olhos? Azuis! Incrivelmente
azuis. Uni-me a eles. Não notaram a minha presença. Seus olhos esbugalhados
assim como o meu só tinham uma direção. Cláudia Alvonaro. Seu corpo? Não posso
dizer aqui. Mas parecia ter sido esculpido por Michelangelo, ou melhor, Michelangelo di Lodovico
Buonarroti Simoni. Ah! Una Madonna Escoteira? Quem sabe ali estava sua obra prima
da renascença sua bela escultura a Pietá. Não podia ser. Estávamos em 1958 e
não 1498 quando ela foi esculpida.
A paixão tomou conta de mim. De mim só não de todos os seniores. Doze
rapazes perdidamente apaixonados pela bela Cláudia Alvonaro. Mas de onde ela
veio? Da cidade não era. Conhecíamos todas as beldades. – Ela é de Vitória.
Espírito Santo disse Patachuco um Sênior. Meu Deus! Capixaba e linda assim?
Bendita Vitória. Santino o Chefe Sênior adentrou ao pátio. Jovem ainda. Vinte e
oito anos. Viu-nos e foi até nós cumprimentando. Ninguém olhou para ele.
Inteligente como todo Chefe Sênior descobriu através de um “Kim” imaginário o
motivo de nossa perplexidade e imutabilidade. – Ora, ora, parecem que nunca
viram uma garota! Ele disse. Sem respostas. Continuávamos mudos. Olhos vidrados
na bela Cláudia Alvonaro. A mais bela capixaba que o mundo conheceu. E nós os
bravos seniores da tropa Anhanguera.
Ela estava linda. Uniforme azul, bonezinho de lobo. Saia curtinha (que
pernas meu Deus!). Akelá? Não tinha mais de dezoito anos! Não seus bobos disse
o Chefe Sênior. Ela é Assistente. Tem dezessete. Está fazendo uma visita. Vai
embora hoje no trem noturno das oito. – Vou também, adeus Chefe! Falaram todos
ao mesmo tempo. Chefe Santino riu sonoramente. Que vida. Descobre-se o amor de
nossas vidas, a nossa alma gêmea e ela vai embora assim? E para piorar tudo ela
começou a cantar. Os lobos sentados em círculo e ela cantando uma canção que
não conhecia. Voz? Uma cantora nata! Ninguém na sede tirava os olhos dela.
Maravilhosamente bela e uma voz de harmoniosa, que podia seguramente ser a
maior cantora de todos os tempos.
O céu que me condene! Que me mate! Que acabe comigo. Estava “deverasmente”
apaixonado. Perdidamente apaixonado. E o pior aconteceu! Ela olhou para mim e
deu um sorriso. Senti o corpo tremer. Tive que sentar. Que sorriso! Que voz!
Que rosto! Que corpo! Não podia ser uma mulher Akelá. Era uma deusa trazida do
Olimpo. E eis que como se fosse uma chicotada, como se tivesse caído uma pedra
enorme em minha cabeça, um Chefe novo de uns vinte e cinco anos entrou
acompanhado do Chefe do grupo. – Vamos
embora meu amor! O que? Meu amor? Então olhei melhor, ele estava com a aliança na
esquerda e ela também. Marido e mulher.
Ela se foi. Deu um “xauzinho” e disse um Sempre Alerta que nunca mais,
nunca mais mesmo e eu juro, irei esquecer. A mulher dos meus sonhos, a mulher
que iria ser a minha vida, a minha alma gêmea se foi. Se houve reunião de
seniores eu não sei. Acho que os outros também ficaram como eu no mundo da lua.
Começamos mudos e terminamos calados. Chefe Santino sorria no alto dos seus
vinte e oito anos. Um homem experimentado sabendo o que sentia aqueles garotos
que estavam crescendo e aprendendo com a vida. Cláudia Alvonaro virou a esquina
abraçado com seu amado. A tropa acompanhou com os olhos seu ultimo adeus. E eu?
Fiquei meses sonhando, pensando até que um dia!...
Nenhum comentário:
Postar um comentário