Lendas escoteiras.
O simpático macaquinho Quinzinho.
Quando escoteiro tínhamos facilidades
de acampar sempre. Seja com a tropa ou com a patrulha quase sempre passávamos o
fim de semana no campo. Todas as patrulhas tinham suas escolhas. Seus locais. A
nossa, a Raposa sempre que podíamos acampávamos na Fazenda do Chico Flores.
Perto, menos de seis quilômetros. Uma aguada maravilhosa e um grande bambuzal
que poderíamos usar a vontade. Menos de um quilômetro do Rio Doce. Perdi conta
de quantos acampamentos fizemos lá. Tínhamos lá muito animais que se tornaram
amigos. Um lobo Guará que vinha comer em nossas mãos. Um falcão que nos olhava
de longe e um Quati que não saía do acampamento.
Chico Flores e sua esposa dona Alice
Flores eram um casal de velhinhos muito simpáticos. Nem precisávamos avisar e
quando lá chegávamos, ele dava um belo sorriso. Sua casa era simples, ainda com
paredes com bambus cobertos de barro, mas por dentro era um brinco. Dona Alice
com seu eterno sorriso. Fazia um queijo mineiro como ninguém. Sempre pela manhã
ela aparecia no campo. – vim trazer um queijinho para vocês. E ele? Sempre com
um franguinho, ovos, cachos de banana caturra e muitas outras guloseimas. Os
filhos na capital estudando. Dizia ter um “gadinho”. Uns boizinhos como ele
dizia, (eram mais de 2.000 cabeças), uns porquinhos, galinhas e uma centena de
bodes e avestruz.
Estávamos voltando pela segunda vez
aquele mês. Uma investigação se fazia necessária. Na última vez, fomos roubados
em toda nossa alimentação. Quem roubou abriu a porta da barraca de duas lonas
facilmente. Ela estava bem presa e não sobrou nada. Tínhamos naquela época três
tipos de ração. Ração A – Arroz feijão, batata e macarrão e dois pedaços de linguiça.
Óleo, sal e sabão. Tudo dividido por cada patrulheiro. Nossas mães colocavam em
saquinhos e vidrinhos, fácil para levar na mochila. A ração B era mais ou menos
a mesma, mas para dois ou três dias. E por último a ração C – Maior. Comprada
no Armazém do Seu Zé Mutum. Ele fazia um preço especial para nós. Nossos pais
pagavam com a caderneta mensal.
Sempre a sexta feira, nos encontrávamos
na sede do grupo a noite e lá pelas nove já com a carrocinha preparada
partíamos. Menos de duas horas e já estávamos no local. Montamos o campo como
se não soubéssemos de nada. No dia seguinte fizemos um almoço e sabíamos que
era de primeira. Fumanchú nosso cozinheiro tinha fama de ser o melhor cozinheiro
de todas as patrulhas. Após a limpeza do vasilhame e do campo, saímos como se
fossemos fazer uma excursão. Nosso material de sapa e alimentação era guardado
na barraca de intendência. As linguiças penduradas no teto da barraca para
durar mais.
Voltamos e nos escondemos em uma
saliência a menos de oitenta metros do nosso campo. Não demorou. O ladrão
chegou. Olhou para um lado, para o outro e como se fosse treinado abriu a porta
da barraca. Levou o que podia. Voltou logo, levou mais. Romildo o monitor pé-ante-pé
o prendeu dentro da barraca. O danado nem gritou. Punha a mão entre os olhos e
mostrava seus belos dentes como se aquilo fosse uma diversão. O ladrão foi
descoberto. Ele nem aí para nós. Sorrindo sempre e fazendo macaquice.
Ficamos seu amigo, ele ficou nosso
amigo. Quando íamos acampar ele sempre aparecia. Sabia que ia comer de graça.
Claro que não nos esquecíamos de levar suas duas dúzias de banana caturra. Sua
preferida. Quinzinho nunca foi esquecido. Um macaquinho lindo, amável e
educado. Claro, roubava comida, mas para ele não era roubo. Ali era seu
habitat. Ele era o dono. Nascera ali. Tinha o seu direito. Nós éramos os
invasores. Nas outras vezes nem chegávamos e ele saltava em nossas costas com
aquele sorriso brejeiro.
O tempo passou, crescemos outras
plagas, agora mais longe em busca de novas aventuras. Não esquecemos Quinzinho.
Quando podíamos íamos lá de bicicleta sempre levando suas bananas. Mas nem tudo
dura para sempre. Um dia não vimos mais Quinzinho. Para onde foi se morreu, se
o levaram para um circo qualquer. Foram muitas saudades. Muitas. Quinzinho teve
seu lugar de honra no livro da Patrulha Raposa. Acho que está lá até hoje!
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