Uma linda historia escoteira

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Era uma vez...

domingo, 27 de agosto de 2017

Putz! Minha perna não me obedece mais!


Putz! Minha perna não me obedece mais!

            Pois é, fiz de tudo, mas ela se encrespou. Chamei-a no cantão e rezei um sermão. Ela caladona como se estive nem aí! Fui até meigo, agradeci a ela pelo que fez por mim, por ter me levado a lugares lindos, por ter me ajudado a atravessar planícies, vales e subir montanhas escorregadias. Até fui piegas quando disse a ela que era hora dela me ajudar. Mocinha, você vai me deixar na mão? Ela ficou calada e calada ficou. Argumentei que precisa dela para fazer caminhadas, ir à padaria, comprar na vendinha do Abreu alguma verdura prá cozinhar.

            Ela já vinha definhando há tempos. Vivia se queixando que era melhor eu parar e partir para outra. Outra? Dona perna, que outra? Já não se vendem pernas como antigamente. Onde vou conseguir uma? Ela calou e desde aquele dia calada ficou. Hoje ao levantar vi que meu corpo estava pesado demais mesmo assim tateei pelas paredes e rodei a casa de canto a canto. Ela gemendo. Pensei que ela estava fingindo e fui até a varanda. Ela me obrigou a sentar. – Vado, não dá mais ela disse. Dá sim, deixa de frescura e vamos continuar pisando no chão brasileiro, afinal sou ou não sou o Vado escoteiro?

              Ameacei, rodei a baiana, disse a ela que ia chamar a Corte de Honra, meus monitores não teriam piedade. Ela deu gargalhada! – Fui mais além, vou levar você a Comissão de Ética da UEB ou será EB. Putz me confundo muito até hoje não entendi porque deixaram de lado a União, era tão bonito! – Ela naquele sorriso enigmático não me deu bola. Cheguei à conclusão que é melhor deixá-la fazer pirraça. Tudo bem que estou chegando aos setenta e sete anos e ela já trabalhou demais. Mas parar assim sem mais nem menos?

               Queria aposentar a bengala, mas não deu. Lá vou eu por caminhos conhecidos na minha barraca de plantão. Toc, toc, o som da bengala não é lá uma melodia de Puccini e me tira do sério. Passei o dia sentado e bengalando. Já que é assim que ela se dane, fui para meu computador. Escrevi adoidado. Dois contos e um artigo e ela lá esticada sem ao menos agradecer o que fiz por ela. Amanhã é outro dia, vamos ver se minha perna colabora. Preciso andar espraiar ir por aí sem rumo e sem violão debaixo do braço.

                 Tenho que ser compreensivo. Perna não dura à vida toda disso eu sei. Mas precisava tanto dela e vou dar um descanso. Falei baixinho em seu ouvido: Perna querida faça igual ao meu pulmão, ele não reclama vez ou outra falta o ar, mas mesmo assim vai me dando tempo para pescar na vida que eu levo. Que seja se ela quer assim. Sei que isto faz parte da vida, nem tudo dura para sempre. O corpo nasce, cresce fica dodói e se vai. Vira poeira cósmica no chão da terra que sempre amei.


                 Mesmo assim, agradeço a ela meu pulmão e parte dos meus órgãos que ainda não me deixaram na mão. Mas sinto que estão acabando. Ainda bem que meu espírito, minha vontade não desiste e mesmo sem meu corpo que amo, vou andando no pedaço e dizendo, enquanto houver vida, enquanto houver pensamento, não desisto. Que seja, vamos aguardar o amanhã, quem sabe eles que fazem o meu corpo não resolvem me ajudar?

Nota de rodapé: -  Hoje acordei cansado, de que? Perguntei-me. Não sei. Minha perna não queria carregar meu corpo e insisti com ela para não desistir. Escrevi sentado e isto deu para ela pensar no erro que cometia. Mas cá prá nós, nem tudo dura para sempre e eu só tenho a agradecer a ela e partes do meu corpo por me darem a vida que sempre amei.

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