Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Uma crônica do cotidiano. Se existem sonhos, a vida continua.


Uma crônica do cotidiano.
Se existem sonhos, a vida continua.

                      Faço uma caminhada todos os dias. Tem alguns que não consigo. Falta o ar o cansaço chega e nestes dias passo a maior parte em minha varanda singela pensando no que fazer. Hoje comecei a divagar e me lembrei de um fato acontecido que gosto de lembrar. Uma manhã de sol... Lá fui eu na minha caminhada. Perto tem um Centro Esportivo muito arborizado. Gosto de lá. Não ando muito, máximo um quilômetro. Mais não aguento. Caminhava com prazer e alegria mesmo com meus passos trôpegos já que a idade não me deixava ir mais rápido. Uma pequena trilha. A percorro todos os dias. Outros também comparecem para correr e passam por mim voando como se tivessem asas. Sorrio... Quem dera pudesse fazer isto também. Corpo de Velho trôpego não ia aguentar mais.

                 Claudicando eu ia cantando, forçando o pulmão para aproveitar o ar da manhã, das árvores copadas que enchiam de perfume minha caminhada. Ah! Que saudades dos meus acampamentos! Já tinha percorrido mais de quinhentos metros. Meu corpo respondia aos passos. Um e dois, um e dois. Notei que emparelhou ao meu lado dois jovens. Ele e Ela. Dois frutos da nova mocidade que percorriam a mesma trilha que eu. Ele alto, forte sem camiseta para mostrar seu tórax e seus músculos fortes. Era um guapo rapaz. Ela nos seus quinze ou dezesseis anos, magrinha e pequena, mas sadia sorria ao lado do seu amado. – Ele virou para mim e disse: - Velho levante o corpo, aprume os ombros, ande feito homem! – Olhei para ele. Sorri. Não ia aceitar a provocação. – Ele continuou – Conheço muitos velhos como você que andam feito homem! – Ora, ora pensei. Será que não era homem? Mesmo assim não disse nada e continuei calado.

                    Sem pressa eu dava minha última volta. Eles ao meu lado. Eles já tinham passado por mim várias vezes enquanto eu em passos de tartaruga forçava para percorrer alguns metros. – Velho ele continuou: – Esqueça suas dores, suas doenças, vamos Velho levante os ombros, dê uma passada mais larga. Velho ande feito gente grande! Quantos iguais a você percorrem caminhos mais longos? Quantos ainda fazem questão de correr feito homem? – Eu olhei de novo para ele. Minha respiração começou a falhar. Diminui meus passos trôpegos. Meu ar tinha de ser dosado. Quando não me sinto bem ele reclama. De novo olhei para ele sem nada dizer Estava cansado. Muito. Para que responder a ele?

                      A jovenzinha o pegou pelo braço. - Vamos meu querido, disse. - Ainda temos mais de dez voltas a percorrer. Deixe o Velho em paz! Olhei para ela e senti que era uma alma boa. É fácil reconhecer onde existe a beleza no coração. – Ele rispidamente respondeu: - Paro quando quiser, corro quando quiser. Ela abaixou a cabeça submissa. Quem sabe o amor a obrigava a aceitar o que não queria. Meditei. Será que o futuro deles seria de amor para sempre? Não sei. Era melhor não comentar o futuro dos dois. Ele olhou para mim com ar de deboche – Velho, neste seu andar vais morrer logo. Parece como o meu pai. Sempre se entregando. Eu nunca serei assim, quando a minha velhice chegar não serei como você e meu pai. E o jovem partiu correndo. Ela correu atrás.

                 Logo desapareceram na curva do caminho. Continuei calado, sabia o que eu era e o que sou e o que serei. Desejei a ambos muitas felicidades. Pedi a Deus que desse vida longa para o casal. Eu sabia que era um Velho. Um dia fui moço, corri mundo com meu chapéu de abas largas, com minha mochila escoteira, arvorei bandeiras por lugares nunca antes imaginado. Também me julgava imune à velhice. Mas ninguém escapa ao seu destino. Senti uma brisa leve e intermitente no rosto. Eu gostava. As brisas das manhãs sempre me bem. Era um santo remédio. Lembrei-me das grandes caminhadas que fiz. Das grandes aventuras que se foram. Acho que era por isto que eu insistia em andar para não me maldizer de tantas nicotinas que aspirei quando jovem.

                  Cheguei ao final da trilha. Tartaruga ambulante pensei comigo. Sorri para mim mesmo ao pensar assim. Sentei em um banco a beira da trilha. Gostava de ficar ali, vez ou outra passarinhos voavam baixo chilreando enviando mensagem de amor. Quantos dias mais eu ainda iria caminhar? Minha amada trilha era agora percorrida por jovem amantes sonhadores que acreditam nunca serão velhos como eu. Ah! Aventureiros que se foram. Gota de orvalho sumindo no meu passado. A vida continua. Será que os verei novamente? Não são escoteiros disto tinha certeza. Não sei e isto não importa.

                         Não desejava nada ruim para eles. Eram hoje guapos jovens. Não sei se gostariam de ouvir alguém dizendo no futuro para empinar os ombros, andar ereto e não ser um velho inútil. – Deixe a vida me levar e a deles também. Que minhas caminhadas pudessem ser realizadas por muito e muito tempo. Sentado no banco em um caminho arborizado, eu não sei se enganava a mim próprio. Procurava manter meu corpo firme mesmo sabendo que o tempo não perdoava a idade. Acredito que sou um velho feliz. Deus está comigo, ela também e mesmo com suas dores me dá o que preciso para continuar. Não quero terminar meus dias em uma cama ou em um Pronto Socorro a quem chamo de Purgatório.


                          Amanhã estarei de volta às trilhas do meu bem querer. Farei quantas caminhadas conseguir. Sorrirei para quantos jovens passar por mim. Devagar me lembrei do lindo versinho que sempre me vem à memória: – “Antes de correr, aprenda a andar. – “Tudo na vida tem sua hora, seu lugar”. Tartarugas também chegam Lá!”. É meus amigos, se existem sonhos nos sabemos e também a certeza que a “vida continua”!

Nota de rodapé:- As coisas têm que passar, os dias têm que mudar, os ares têm de ser novos e a vida continua... Em qualquer lugar! Uma pequena crônica simples, sem muitos trejeitos apenas para meditar!

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