Conversa ao pé do fogo.
O Pernilongo, a Muriçoca, o
carrapato e outros bichos.
Prólogo: - Falando em muriçoca, pernilongo, maruim,
carrapatos e etc. sempre é bom lembrar que Escoteiro não anda voa! Escoteiro
não ri, dá gargalhadas! Escoteiro não chora, dá pernadas na dificuldade!
Escoteiro não tem medo, luta até a morte! Escoteiro não corre dos insetos ou
animais peçonhentos, enfrenta-os com seus caratês e golpes mortais. Eu
eim?
Isto é coisa do demônio, dizia a Chefe Mercedes. Chefe “gente boa” a Chefe
Mercedes. Entrou com idade avançada e logo conseguiu sua Insígnia de Madeira. Nos
acampamentos detestava os insetos que ela chamava coisas do Demônio. No
primeiro acampamento os pernilongos se deliciaram. Ela jura que ouviu eles
dizendo: - “tem carne nova no pedaço”! - Em outro uma “tropa de carrapatos fez dela
seu ninho"! Risos. Eu dizia que para tudo tem jeito, mas ela não
acreditava. Vado Escoteiro eles são escolados e cada um tem sua maneira própria
de morder e chupar o sangue dos pobres dos escoteiros e dos pobres chefes. Coitada
da Chefe Mercedes seu braço ficou todo mordido e suas pernas também, pois adorava
uma calça curta. Risos. Eu sabia que eles são danados. Chupam o sangue e adoram
sangue novo no pedaço. Dizem que os jovens ficam tão encantados com o campo que
se esquecem de tudo e os pernilongos e carrapatos se deliciam.
Acampei muito em minha vida. Sem falsa modéstia mais de 700 noites de
acampamento. Nunca gostei muito destes “bichos”. Insetos chupa sangue não é o
meu forte. Mas fazer o que? Dizem que tem Chefe que gosta. Cacilda! - Nunca
esqueci um morcego próximo à gruta de Maquiné que se deliciou com meu sangue. Pudera,
eu estava morto de cansado e dormi feito uma pedra. Bebeu pouco menos de um
litro! Eu sei que hoje a modernidade trouxe o repelente, na minha época não
tinha. Dava cinco e meia da tarde e era ver onde soprava o vento para fazer um
foguinho com folhas verdes, estrumes de boi e cavalo. Um bom fogo cheio de
folhas verdes, e ficávamos livres deles por algum tempo. Enfrentar a fumaceira
nos olhos e chorar era melhor que ser mordido. Uma vez descobri que o
pernilongo do acampamento e o da cidade são diferentes. O do acampamento atacam,
mordem e você sente logo. Dizem que os piores são os maruins. Com um raminho na
mão a gente os espanta, mas tem de ficar abanando sem parar. Os da cidade são
covardões vivem escondidos em baixo da cama ou de um móvel qualquer.
Primeiro zumbem no seu ouvido e somem. Você acorda com uma coceira
danada. Você sabe, ele encheu a pança do seu sangue e vai se refastelar na
parece do quarto sem se incomodar com você.
Lembro-me de um acampamento com a tropa sênior próximo ao Rio São Francisco em
uma mata beirando o Rio das Velhas. Lugar maravilhoso. Lago piscoso e lindos
pássaros migratórios a fazerem acrobacias fantásticas no rio e nas lagoas próximas.
Era uma fazenda enorme e com uma bela
floresta nas suas margens. Perfeito para um grande acampamento. O capataz
da fazenda nos preveniu. Olhe Chefe, lá a noite é um inferno. Das cinco e meia
as sete ninguém aguenta, as muriçocas são sedentas de sangue. Rimos dele. Não
sabia que éramos uma tropa dos valentes e intrépidos seniores aqueles que
cantam dizendo que matam e arrebentam. Primeiro dia, barraca, algumas
pioneirias, uma mesa e deixamos do lado centenas de boas folhas verdes. Que
venham estes malditos demônios, dissemos. Vão enfrentar uma tropa que não tem
medo de nada! Quem vier morre!
Seis horas o inferno desceu do céu e ficou entre nós. Não era um, não eram dois
e sim milhões deles. Você olhava e via aquela nuvem cinzenta e preta e não
havia onde correr. Mas corremos. Primeiro pulamos no rio e não dava para cobrir
o corpo todo, então corremos até a sede da fazenda, mais de quatro quilômetros.
O capataz riu a valer. Voltamos ao campo lá pelas nove da noite. A paz desceu a
terra! Mas desistimos de dormir ali. Procuramos uma área próxima à fazenda e lá
ficamos. Mas querem saber de uma coisa? Pernilongo e muriçocas avisam quando
vão atacar e quando não avisam pelo menos a gente só coça. Risos. Mas e o
danado do carrapato? Este sim é o satã em pessoa. Não grita, não canta, não
fala e procura o pior lugar no seu corpo para se esconder. Fica lá dias e dias
sem dar bandeira. O danado sabe como chupar o sangue. A principio uma coceira
gostosa. Você coça e para. Até o dia que descobre o bicho gordo, cheio de
sangue como a dizer a você – Seu Escoteiro idiota chupei seu sangue e você nem
viu! Agora posso morrer feliz! Risos. E morre mesmo. Você tira o bicho
gorducho, mete unha com unha o sangue espirra e o danado morreu. Você é sênior,
não perdoa, mata!
Para dizer a verdade nunca
levei repelente. Achava que se os heróis da floresta, os índios os bravos
sertanejos e os mateiros não usavam eu também não o faria. Mas dizem e não sei
quem disse que isto não é coisa de escoteiros. Quem ainda não enfrentou
saudáveis pernilongos, alegres muriçocas, carrapatinhos gentis, e aranhas
negras e lindas nas suas teias nas florestas à noite no rosto, dançando ou
rindo de você? Se isto não aconteceu desculpe. Você ainda não foi batizado de herói
da floresta. Meus amigos, quantas coisas contamos para nossos escoteiros para
reafirmar aquilo que ele é. – Escoteiro não anda voa! Escoteiro não ri, dá
gargalhadas! Escoteiro não chora, dá pernadas na dificuldade! Escoteiro não tem
medo, luta até a morte! Escoteiro não corre dos insetos ou animais peçonhentos,
enfrenta-os com seus caratês e golpes mortais. Eu eim? Sei não. Coitado do
Escoteiro quando dizem isto para ele. Ele vai ficar assustado. Sabe que nem
seus super heróis são assim. Sabe que ele é humano como os outros. Eu prefiro
dizer calmamente que ele não se preocupe com as dificuldades, elas passam.
Costumo dizer que se tem amor no coração, sabe ser fraterno, se você sabe
sorrir com o zumbido da noite, sabe apreciar o orvalho de madrugada, você é um
Escoteiro. E quem venham os malditos carrapatos e pernilongos filhos de Satã!
- Quanto a Chefe Mercedes hoje mora no céu. Nunca
desistiu e a gente se divertia a noite com ela de tantos tapas que dava na
perna, nos braços e no pescoço. A gente oferecia um raminho e ela dizia que
aquilo não era coisa de escoteiro. Então tá! E viva os pernilongos! Viva as
muriçocas! Bem vindos os carrapatinhos espertos! No fundo no fundo sou
Escoteiro e adoro-os! Bichinhos do Senhor. E quem vive sem eles? Um dia me disseram que quem tem medo
de pernilongos, muriçocas, carrapatos, aranhas negras e lindos morcegos negros
não é Escoteiro. Sei não. Se for verdade acho que não sou, pois detesto estes
insetos. Mas se Deus os criou deve ter um motivo e só pode ser pagar nossos
pecados aqui na terra. E viva os insetos da floresta, sem eles a vida lá não
tem sentido!
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