Sonhos de um jovem Escoteiro
VOCE SABE O QUE É BOA AÇÃO?
A campainha
tocou e Silvinho sorriu. Passou toda a aula da professora Doralice a sonhar com
a bela mochila e o cantil que vira ontem nas lojas Abil. Não era e nunca foi um
mau aluno. Suas notas eram as melhores da classe. Chefe Marcio sorria sempre
quando ele apresentava seu boletim, pois sabia que isto dava pontos a sua Patrulha.
Os Morcegos eram amigos de fato. E ele os considerava a todos seus irmãos.
Saiu apressado
da escola e logo via as Lojas Abil. Entrou sem correr. Não queria que pensassem
que era um moleque qualquer. Não era. Era um Escoteiro, e dos bons. Foi logo onde
expunham os materiais de camping. Viu alegre a mochila verde acolchoada
pendurada. Seus olhos brilhavam. Lá estava o cantil. Lindo. Dois litros. Todo com
capa impermeável. Ainda não tinham vendido. Já tinha visto o preço. A mochila
duzentos e cinquenta e o cantil sessenta.
Um dia
iria comprar os dois, prometera a si mesmo. Seu pai nunca teria essa quantia,
pois eram pobres muito pobres. Uma pequena Sapataria e pouco a fazer. Mas ele
se orgulhava do pai. O achava o melhor pai do mundo. Que o Chefe Marcio
desculpasse, mas seu pai era seu herói. Não demorou muito na loja. Sua mãe ficaria
preocupada se chegasse tarde. Saiu assoviando. Gostava de assoviar. “Vem
depressa correndo Escoteiro, ajudar o cozinheiro a fazer o jantar!”. Gostava
dessa música.
Desceu a Rua
dos Caracóis e ao atravessar a ponte notou debaixo de uma lata vazia uma
carteira. Foi lá e viu que estava recheada. Achou que tinha mais de oitocentos
reais. Uma fortuna para ele e para o pai dele. Muitos documentos. Chegou a casa
e pensou – Poderia ficar com esse dinheiro e comprar minha mochila e o cantil,
o que sobrar dar para a mamãe fazer a feira. Mas ele no fundo sabia que não
faria isso. Não tinha como explicar e sabia que o Escoteiro é leal, tem caráter
e ética.
Procurou
seu pai. Explicou. Ambos olharam os documentos. Dr. Mario Marcelo, dentista. O
endereço no Bairro Palmeiras, Rua do Lavrador 115. Seu pai só tinha quinze
reais para o ônibus ida e volta. Era para a carne que pretendia comprar para a
janta. Fica para outro dia. Silvinho, vamos lá entregar? Claro papai. E lá
foram eles abraçados, alegres e o pai até cantava com ele uma canção que
aprendeu há muito tempo com seus avós. “A montanha feliz”.
Chegaram ao
endereço indicado. Silvinho foi de uniforme. Era seu dia. Sua boa ação. Fazia
questão de se apresentar assim. Bateram a porta. Uma moça atendeu. – Poderia falar
com o Doutor Mario? – Ele está ocupado respondeu ela. Podem falar comigo. Preferimos
que seja ele. Ela nem respondeu e fechou a porta. Os dois ficaram ali esperando
e sentaram no meio fio da rua.
Uma hora
depois ele gritou na porta do seu consultório – O que querem comigo, falou
bruscamente. Estou muito ocupado! – Silvinho se aproximou – Doutor desculpe.
Achei sua carteira e vim devolver. Por favor, meu pai insistia. Verifique se
não está faltando nada! – O doutor olhou, e falou. Tudo bem não falta nada.
Agora me deixem em paz, estou ocupado com dois clientes me esperando. E fechou
a porta na cara dos dois.
Silvinho
olhou para seu pai e perguntou? Está certo assim pai? Claro filho. Fez o que
devia fazer. Se ele não reconheceu não importa. Importa seu ato de caráter. De dignidade.
Eu tenho o maior orgulho de você e olhe, prometo que um dia vou lhe dar aquela
mochila e o cantil. Quem sabe ganho um dinheiro a mais?
E foram os
dois cantando pela rua afora, sem ao menos guardar o menor rancor do doutor
Mario. Silvinho sentia-se feliz. Ia contar a boa ação para seu Chefe. Sabia que
ele iria gostar. Não iria vangloriar e nem contar que o doutor fora mal
educado. Ele sabia que o importante foi o que fez. O que os outros fazem e se você
não pode ajudar, deixa para Deus resolver.
“Acende o
fogo, põe a panela, e dentro dela, o feijão cozinhar!”
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