Uma linda historia escoteira

Uma linda historia escoteira
Era uma vez...

quinta-feira, 12 de março de 2015

E o doce não era salgado.


Conversa ao pé do fogo.
E o doce não era salgado.

                        Corria o ano de mil novecentos e cinquenta e quatro. Voltava de mais uma jornada de muitos quilômetros com a minha patrulha. Foram oito dias no lombo de uma bicicleta. Pela primeira vez estava cansado. Muito. Aconteceram tantas coisas que deixei para anotar outro dia. Passamos pela sede para deixar as tralhas e alguns materiais de sapa devidamente limpos e oleados. Éramos seis. Todos da Patrulha Raposa. Cada um montou na sua bicicleta, disse um sempre alerta sorrindo e partiram para suas casas. Da sede em minha casa não gastaria mais do que quinze minutos. Ao passar pela padaria Bom Pastor vi que o pneu da frente estava furado. Paciência. Isto para nós aventureiros ciclísticos era rotina. Manezinho e sua bicicletaria ficava menos de dois quarteirões.

                    - Osvaldo sua conta aqui está alta. Mais de cento e oitenta reais (em dinheiro de hoje). Vai me desculpar, mas enquanto não me pagar não faço mais nenhum serviço para você. - Eu sabia disto. Nunca aconteceu. Ganhava uns trocados com minha caixa de engraxate. Não tinha mesada. Estava juntando para comprar uma nova mochila. Que ela demorasse mais precisava pagar. Não discuti com Manezinho. Ele tinha razão. Triste fui empurrando minha bicicleta a pé. Reclamei da sorte. Todos meus amigos da patrulha tinham pais que davam alguns trocados. O meu não podia. Era seleiro. Ganhava pouco. Gastei quase quarenta e cinco minutos até ao quarteirão da minha casa. Agora era deixar a bicicleta guardada e tentar ver o que podia fazer para pagar o Manezinho. Nossa oficina portátil da patrulha não tinha nada para me ajudar.

                    No quarteirão da minha residência uma surpresa. Não queria acreditar. Ouvi o Rataplã. Que foi? Nosso hino cantado na rua? Quem? No portão de madeira da minha casa, minha mãe, meu pai e minhas duas irmãs rindo e batendo palmas. O Rataplã terminou e a Arvore da Montanha surgiu esplendidamente. Minha família me abraçou - Meu pai me deu as boas novas – Sua tia da capital mandou um presente. Um LP escoteiro do disco do Trio Irakitan. Todo ele só músicas escoteiras. Chorei de alegria. Era um momento mágico que só quem passou por sabe como é. Nunca soube do disco. Na bicicleta de meu pai voei até as casas dos patrulheiros dando as boas novas. À noite ainda criança, ouvíamos as canções lindas cantadas na vitrola da família. Sentados no quintal mais de trinta escoteiros e seniores. Lá pelas duas da manhã meu pai mandou todos embora. Hora de dormir disse, amanhã ou hoje é outro dia completou. Terminou rindo e dizendo que o disco podia furar! Risos.


                          Considerei-me um “sortudo”. A tristeza acabou. Sabia que iria pagar o Manezinho em breve. Até lá ia rezar e agradecer minha tia por aquele presente que nunca ninguém do Grupo Escoteiro tinha ganhado. A vida é assim, atrás das tempestades vem a bonanza. Aprendi muito e hoje lembro que as dificuldades não passaram de momentos bons e ruins e que ficaram no tempo. Seguir o meu destino foi o que sempre fiz.

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