Crônicas de
um Velho Chefe Escoteiro.
Conversa ao
pé do fogo. Já participou?
De vez em quando esquecemos que
nós os chamados dinossauros do escotismo realizamos tantas coisas que os novos
ainda não têm ideia do que se trata. Outro dia um jovem me perguntou o que é
uma Conversa ao pé do fogo. Outro Chefe mais antigo confirma que hoje poucas tropas
ou patrulhas ainda mantém sua rotina de nas noites escuras ou enluaradas
sentarem em frente suas barracas e papear, cantar, sorrir, e claro um
cafezinho, um biscoito uma batata assando, ou até mesmo um chimarrão. Diferente
do Fogo de Conselho. Sem programas, sem horário para começar e terminar.
Gostoso demais. Eu perdi a conta de quantas participei. Centenas e centenas.
Cada uma mais deliciosa que a outra. A primeira vez dizem que a gente nunca
esquece e eu nunca esqueci. Entrando nos meus doze anos, acampado, vi após um
jogo noturno que alguns jovens se reuniam em frente à Barraca do Chefe
Vagalume. Não era do nosso grupo e morava em uma cidade próxima.
Lá não havia grupo e ele
tentava organizar um, mas era difícil achar patrocínio, mesmo que fosse só a
sede. Assim amigo do nosso Chefe Jessé ele sempre filava uma boa atividade
escoteira conosco. Aproximei-me de mansinho e vi mais de vinte jovens em volta
de um pequeno fogo em frente à barraca de chefia e senti que ali havia algum
mais que desconhecia. Todos alegres, dando risadas, cantando, outros servindo
bananas assadas, um bule de café fumegante que sempre estava sobre as brasas e
ele o Chefe Vagalume parecia estar em todos os lugares. Para dizer a verdade eu
já tinha feito algum parecido quando acampei pela primeira vez. Acho que o
mesmo espirito de união e claro tudo improvisado. As canções brotavam sem a
gente perceber, e as histórias? Cada uma mais linda que a outra. O Chefe
Vagalume e o Escoteiro Lomanto eram bambas em uma história. Imaginava como
conseguiam guardar tudo na cabeça.
Esqueçam o Fogo de Conselho, pode até ser
parecido, mas o Fogo de Conselho é único, tem seu estilo próprio e dependendo
da tropa ou Alcateia ele marca para sempre. A Conversa ao pé do fogo é
diferente. Nada é programado, você fica o tempo que quiser. Sai e volta e as
conversas entre amigos são normais. Ninguém dirige ninguém. Não existe programa
e quando alguém faz algum interessante todos param e prestam atenção. E quando alguém
leva um violão? Ou uma harmônica? Não me esqueço de Flavinho sem ninguém esperar
sacou de uma flauta e tocou canções lindas que emocionou a todos que estavam
lá. Tem algumas conversas ao pé do fogo que demoram horas e outras pouco tempo.
Eu já vi Conversas ao pé do fogo em patrulhas onde sem perceber as demais
patrulhas ali acampadas acorriam. Nada de fogo enorme e sim achas grossas para
durarem mais tempo. Conheci monitores que sabiam conquistar a todos pelo
sorriso e pelas histórias. Claro que a gente morria de rir com os pata tenras
que vendo tudo aquilo se arriscavam a contar uma história e nela se
embananavam. Mas ninguém criticava e havia até palmas para estes com suas
piadas, seus jograis, suas histórias e suas canções.
Nas patrulhas havia a
obrigação de dormir antes das onze da noite quando o Chifre do Kudu anunciava a
hora de dormir. Com chefes somente era diferente. Eu mesmo perdi a conta quando
íamos dormir lá pelas tantas, madrugada adentro, mas sabendo que no outro dia
tínhamos responsabilidades e não podíamos fugir delas. Um boa Conversa ao pé do fogo
deve ter seu código de conduta não escrito para que não fuja do nosso ideal
Escoteiro, da nossa promessa e do nosso desejo fraterno para que não ofender
quem quer que seja. O espirito ali era o de ser puro nos pensamentos nas
palavras e ações. Quando acampamos devemos deixar nossa marca e ela acontece em
uma Conversa ao pé do fogo. Aqueles que um dia desejarem fazer um, fica meu
conselho. Nada obrigatório e participa quem quiser. Nada de avisos, de lembranças
do programa do dia seguinte. Isto é da Corte de Honra. Na primeira vez se
perguntarem o que é não diga nada, só diga que está aberto a todos e não tem
hora de começar e nem de terminar e que ninguém é obrigado a participar. O
resto é com eles. Não faça propaganda para não haver decepção depois. Aos
poucos os jovens vão aprendendo e no futuro farão a sua própria conversa ao pé
do fogo no seu próprio campo de patrulha, e claro aberto a todos que quiserem
participar.
É bom ter um bom bule de café
cheio, para a gauchada um chimarrão, bananas ou batata doce para assar. Tudo
fica ali na brasa, pois o fogo não deve ser alto e achas grossas para durar e
evitar sempre alguém ter de alimentar o fogo. Aprendi e costumava fazer em
frente minha barraca e as banquetas são a grama do local. O final da Conversa
ao pé do fogo é simples. Muitos já se foram para suas barracas e os poucos que
ficaram agora deitados olhando para o céu vão contando pedaços de sua vida, de
seus amores, do escotismo e dos sonhos que um dia acham que vão realizar. Se
passar um cometa cintilante, grite bem alto para todos ouvirem: “Estrela
cadente, não caia na minha mão, Estrela brilhante, traga seu brilho no meu
chão. Estrela cadente, por favor, atenda ao meu pedido”. E faça um pedido logo,
pois dizem que ele atende a todos que sabem pedir sorrindo.
Eu sei que muitos de vocês já
fazem normalmente uma conversa ao pé do fogo. Escrevi pensando naquele que já
viu e os que e não tem ideia do que seja. É inesquecível em noite escura ou com
luar, em um belo acampamento participara de uma gostosa conversa ao pé do fogo.
Cantem baixo, cantem com amor. Não leve nada escrito e deixe a improvisação
chegar de mansinho e pense que a vida é bela para quem um dia teve a sorte de
participar, de uma bela, simples e gostosa... Uma conversa ao pé do fogo!
Obrigada por compartilhar seus conhecimentos, ficou bem esclarecido o que é uma conversa ao pe do fogo. Fiquei responsáveis por essa tarefa em meu próximo acampamento com a tropa. Seguirei suas orientações e espero que meus jovens gostem.
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